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Folha de S.Paulo

Casarões da Bela Vista recebem espetáculos

13.8.2006  |  por Valmir Santos

São Paulo, domingo, 13 de agosto de 2006

TEATRO 

Peças são apresentadas em prédios do final do século 19 e começo do 20
 

Espectadores aprovam união de arquitetura e dramaturgia na região central e divulgam pequeno circuito com boca-a-boca

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Bairro de edifícios teatrais históricos (TBC, Oficina, Sérgio Cardoso), a Bela Vista tem alguns casarões transformados em palcos alternativos.

Só na rua Major Diogo, endereço do Teatro Brasileiro de Comédia (1948), há dois deles: a Casa da Dona Yayá, no número 353, e o Casarão da Escola Paulista de Restauro, no 91. A quarteirões dali, no 267 da r. Pedroso, fica o Casarão do Belvedere.

Dos anos 90 para cá, o espectador já se habituou às produções levadas a espaços não-convencionais, o que permite conciliar obras cênicas e arquitetônicas. A Bela Vista converte-se em capítulo à parte dado o perfil popular e a convergência de casarões tombados.

Diretor e atores do Redimunho de Investigação Teatral retornavam de ensaio, em janeiro, quando deram com o espaço perfeito para “A Casa”, inspirada em Guimarães Rosa. Descobriram que ali funcionava a Escola Paulista de Restauro, projeto de formação destinado a profissionais e à comunidade, parceria da Companhia de Restauro e do Museu a Céu Aberto.

O sobrado foi erguido em terreno de 750 m2 no final da década de 1910. Pertence à família do jurista José Luiz de Almeida Nogueira (1851-1914). Possui 13 janelas com varandas de ferro. A escola de restauro obteve da família concessão de uso por dez anos e decidiu abrir “janelas” para o teatro.

“A Casa”, assinada por Rudifran Pompeu, utiliza tanto os cômodos quanto o quintal pleno em árvores frutíferas. “No início, encontramos muitos sacos de lixo jogados por vizinhos. Agora que viram o movimento das pessoas, não jogam mais”, diz o diretor.

“O espetáculo faz a gente esquecer que está no centro”, diz a cineasta Vera Senise, 50, que assistiu à peça no último fim de semana. O artista Henry Vitor, 67, ficou impressionado na primeira cena. “Numa sala cheia de fotos e livros antigos, de repente entra o personagem vestido de cangaceiro, armado e à vontade, como se o seu mundo fosse ali.”

Segundo a atriz Fernanda Chicolet, 25, que ocupa o Casarão da Dona Yayá, o boca-a-boca “funciona bastante” nesse pequeno circuito dos casarões (de 20 a 40 pessoas por sessão), cujas fachadas não dão pinta de que se está diante de um teatro.

O imóvel foi construído no final do século 19 e serviu como morada de Sebastiana de Mello Freire, a dona Yayá (1887-1961), uma rica senhora da sociedade paulista confinada entre aquelas paredes como louca durante décadas. Tombado, o casarão é mantido pela USP, que o usa como espaço cultural. Seu primeiro inquilino teatral foi “5PSA o Filho” (2005).

Em “Quase de Verdade”, a itinerância se dá no plano imaginário. A saber: o público não se movimenta. Senta-se numa das grandes salas ao redor de uma mesa e ali acompanha a história. “As passagens de tempo e espaço são indicadas pelo texto”, diz Chicolet.

No Casarão do Belvedere, construído em 1927 e abrigo de teatro desde o ano passado, a cena da feira livre em “A Mais-Valia Vai Acabar, Seu Edgar” acontece entre escombros no quintal. “Boa parte do espetáculo se passa numa espécie de corredor entre a porta de entrada e a porta de fundos. Os personagens surgem e desaparecem entre os quartos”, diz o diretor Tin Urbinatti, 57.

 

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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