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Entrevista

Moira Buffini justapõe consumismo e vazio

19.5.2014  |  por Gabriela Mellão

Foto de capa: S. Butler/Bafta

Cultuada como um dos novos talentos da dramaturgia inglesa, Moira Buffini alcançou notoriedade com Jantar. A peça, em cartaz em São Paulo sob direção de Mauro Baptista Vedia, introduz a obra desta autora no país. A trama apresenta um ritual de morte na qual uma mulher burguesa faz de seu último suspiro uma festa de comida, bebida e sarcasmo excessivos.

Faz um retrato da elite contemporânea que evoca o de Luis Buñuel em O discreto charme da burguesia, e, mais recentemente, o de Paolo Sorrentino em A grande beleza.

No mundo de luxo apresentado por Moira, humanidade e utopia perderam espaço para vazio espiritual e consumo desenfreado. “Os personagens são inteligentes, educados e liberais, mas miseravelmente egoístas, vazios espiritualmente e amorais”, diz a autora, que afirma usar o humor para retratar fragilidades da humanidade.

Jantar mistura comédia e tragédia. A peça faz um duro retrato da perda da humanidade da elite contemporânea, sem abdicar do riso. Recebeu indicação de melhor comédia do ano em 2003 na Inglaterra. “Howard Barker disse que a melhor maneira de explorar desespero é através do humor. A risada permite que se penetre mundos obscuros”, acredita a autora. Confira a entrevista.

Teatrojornal – Alan Ayckbourn acredita que toda peça deve ser ao mesmo tempo séria e engraçada. Você concorda?
Moira Buffini –
Concordo. Um outro autor inglês, Howard Barker, disse que a melhor maneira de explorar desespero é através do humor. A risada permite que se penetre mundos obscuros.

Você declarou ter intenção de escrever um drama quando criou Jantar. Como o texto tornou-se uma comédia?
Acho que Baker explica isso. Jantar é uma das minhas peças mais engraçadas. Mas é também assustadora.

11 de setembro foi uma inspiração para Jantar. Pode explicar o paralelo que você faz entre a obra e a tragédia?
A relação entre pobres e ricos tem sido um dos temas centrais do meu trabalho desde 11 de setembro. Falta equilíbrio ao mundo em que vivemos. Jantar enfoca o universo dos ricos. Fala sobre a ganância por dinheiro, por comida, e para onde isso nos leva.

Você escreveu Jantar em 2002. Se escrevesse a peça hoje, o jantar retratado em cena teria mudado, de alguma fora?
Infelizmente acho que seria exatamente igual.

Quem são os convidados de Jantar?
Os personagens são inteligentes, educados e liberais, mas miseravelmente egoístas, vazios espiritualmente e amorais. Peças sobre jantares festivos têm seus estereótipos. Tem sempre a anfitriã bêbada, o anfitrião infeliz (que costuma ser talentoso), a mulher bonita, um filósofo cientista, alguém que não foi convidado. Eu quis pegar estes estereótipos e chacoalhá-los, virá-los do avesso. Também adicionei um garçom silencioso.

Helio Cicero e Michelle Boesche em ‘Jantar’

De que forma a dramaturgia inglesa inspira você?
Adoro peças. Acho que os ingleses são muito afortunados por terem uma herança dramática tão rica. Acredito que minhas maiores influências são Shakespeare, Oscar Wilde, Joe Orton, Howard Barker e Caryl Churchill. São todos autores que trabalham com linguagem e experimentam com forma. Também se servem da comédia e seus textos possuem algo de subversivo.

Por que você escreveu dois finais para Jantar?
Escrevi um final, que me assustou. Resolvi mudá-lo. Aí percebi que agi por medo, então mudei novamente para o final original.

Suas peças costumam ser protagonizadas por mulheres. Acredita que o universo feminino é mais interessante do que o masculino?
Precisamos de equilíbrio. Sou fascinada pela dinâmica homem mulher, pelo amor que os une, a raiva, a necessidade, o rancor, e pela maneira como usam o poder. Tenho dúvidas sobre a separação dos universos femininos e masculino. Vivemos no mesmo mundo. Precisamos de igualdade no universo.

O que te move a criar?
Esta é uma questão adorável, que é sempre difícil de responder. Sou uma escritora compulsiva. Escrevi minha primeira peça quando tinha 14 anos e desde então escrevo praticamente todos os dias. Quando começo uma peça, tenho a sensação de estar queimando, de estar em chamas. E isso não me dá paz até a peça terminar.

Serviço:
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil – CCBB SP (Rua Alvares Penteado, 112, Centro, São Paulo, tel. 11 3113-3651).
Quando: Quarta, quinta e sexta-feira, às 20h. Até 11/7.
Quanto: R$ 10.

Ficha técnica:
Texto: Moira Buffini
Direção: Mauro Baptista Vedia
Tradução: André Carvalho
Com: Michelle Boesche (Paige), Helio Cicero (Lars), Erika Puga (Wynne), Mauro Schames (Hal), Juliana Vedovato (Sian), Marco Barretho (Mike) e Victor de Seixas (o Garçom)
Cenografia: Cassio Brasil
Iluminação: Aline Santini
Figurino: Cassio Brasil
Trilha sonora: Jonatan Harold
Design gráfico: Maura Hayas
Fotografia: Helô Bortz
Realização: Brancalyone Produções Artísticas, Kashmir Produções e Al Dente Produções
Correalização: Cia. Teatro Direto
Direção de produção: Edinho Rodrigues
Produção executiva: Fabricio Sindice
Idealização do projeto: Mauro Baptista Vedia e Juliana Vedovato
Assessoria de imprensa: Editor – Edison Paes de Melo

Autora, diretora e jornalista teatral. Pós-graduada em Jornalismo Cultural na PUC-SP, estudou Cultura e Civilização Francesa na Sorbonne, em Paris, e Dramaturgia e História do Teatro Moderno em Harvard, Boston. Escreve para Folha de S.Paulo e revista Vogue. Compõe o júri do prêmio APCA de teatro. É autora e diretora de Nijinsky - Minha loucura é o amor da humanidade (2014), peça convidada a integrar o Festival de Avignon de 2015. Tem cinco peças encenadas, Ilhada em mim – Sylvia Plath (indicada ao prêmio de melhor direção pela APCA de 2014); Espasmo (2013); Correnteza (2012); Parasita (2009), A história dela (2008), além de um livro publicado com suas obras teatrais: Gabriela Mellão – Coleção primeiras obras. Lecionou Laboratório de Crítica Teatral para o curso de Jornalismo Cultural na pós-graduação da Faap, entre 2009 e 2012. Foi crítica da revista Bravo! entre 2009 e 2013, ano de fechamento da mesma.

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