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Crítica

Sonetos de Shakespeare dissonantes

14.5.2014  |  por Fábio Prikladnicki

Foto de capa: Fábio Alt

Amor amor amor, que está sendo chamado pelo GRUPOJOGO de “exercício cênico”, adapta poemas de Shakespeare, um filão promissor que foi explorado nos últimos anos por nomes como o diretor Robert Wilson e a Royal Shakespeare Company.

O espetáculo dirigido por Alexandre Dill, em cartaz até 11/5 na Sala 309 da Usina do Gasômetro, em Porto Alegre, tem o que se convencionou chamar de estrutura fragmentada. Sem relação explícita entre si, as cenas combinam teatro e dança para discursar sobre as diferentes facetas do tema: o amor erótico e o familiar, o amor hétero e o homossexual, e assim por diante.

A dramaturgia de Jéssica Lusia cita sonetos do autor inglês, um texto do guru do teatro Tadeusz Kantor, uma ária da ópera As bodas de fígaro, de Mozart (em italiano), e, em dado momento, refrões de músicas populares brasileiras que tratam de amor. A trilha sonora, executada ao vivo e por meio de gravações, inclui música erudita, Beatles e Edith Piaf. É nesta miscelânea de referências sem muita coesão interna que o espetáculo fraqueja. Há um conflito entre um registro lírico (os sonetos) e outro mais mundano (os diálogos). Os poemas são dados ora em português, ora em inglês, sem justificativa para esta alternância. E as passagens que gravitam em torno destes acabam por repisar o lugar-comum.

Protagonista nesta produção, a iluminação é parca, uma boa ideia que lembra os trabalhos da Cia. Club Noir (SP). Os atores, em performances expressivas, viram silhuetas, iluminados por um facho que sai do lado direito (ou esquerdo, do ponto de vista da plateia) do fundo da cena em direção ao público. O recurso funciona em alguns trechos; em outros, relega parte do elenco a um breu quase total. Ainda há, em pleno espaço de atuação, a inconveniente luz da tela do laptop que controla o som.

Mesmo assim, os trabalhos do GRUPOJOGO devem ser sempre aguardados como uma lufada de inquietação na cena porto-alegrense.

Ficha técnica:
Direção: Alexandre Dill
Dramaturgia: Jéssica Lusia
Com: João Pedro Madureira, Thainá Gallo, Emanuele de Menezes, Igor Pretto e Gabriel Faccini
Assistente de direção: Filippi Mazutti
Projeto de iluminação: Bruno Salvaterra e Igor Pretto
Cenografia: Bruno Salvaterra
Figurino: o grupo
Trilha sonora: Tiago Braatz, Alexandre Dill e César Pereira

.:. Publicado originalmente no jornal Zero Hora, Segundo Caderno, p. 4, em 9/5/2014.

Jornalista e doutor em Literatura Comparada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É setorista de artes cênicas do jornal Zero Hora, em Porto Alegre (RS). Foi coordenador do curso de extensão em Crítica Cultural da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS). Já participou dos júris do Prêmio Açorianos de Teatro, do Troféu Tibicuera de Teatro Infantil (ambos da prefeitura de Porto Alegre) e do Prêmio Braskem em Cena no festival Porto Alegre Em Cena. Em 2011, foi crítico convidado no Festival Recife de Teatro Nacional.

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