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Reportagem

Galpão canta seu tempo

17.5.2015  |  por Fábio Prikladnicki

Foto de capa: Guto Muniz

Em entrevista a Zero Hora em 2014, quando a Cia. Luna Lunera apresentou quatro espetáculos no Festival Palco Giratório Sesc/POA, o ator e diretor do grupo, Odilon Esteves, louvou a importância dos conterrâneos do Grupo Galpão como uma presença aglutinadora da cena mineira, criando um ambiente de colaboração em que todos os coletivos puderam crescer juntos.

Pois no festival deste ano o Galpão retorna a Porto Alegre comprovando a efervescência mineira ao lado de companhias como Espanca! e Movasse. Mas a representatividade do Galpão vai muito além da região. Um dos mais longevos do país, o grupo revê seus 33 anos no espetáculo De tempo somos, com sessões até ontem em Porto Alegre.

Não se trata de uma peça: é um sarau com 25 canções de alguns de seus principais espetáculos e outras inéditas, combinadas com fragmentos de textos de autores como Baudelaire, Kerouac, Nelson Rodrigues, Tchékhov e Leminski. Em comum entre as diversas referências, está a questão da passagem do tempo, expressa desde o título. O repertório inclui músicas de peças que ficaram marcadas na trajetória do Galpão, como A comédia da esposa muda (1986), Romeu & Julieta (1992) e Um homem é um homem (2005). A direção é de Lydia Del Picchia e Simone Ordones.

Mas, depois de três décadas dedicadas à pesquisa de linguagem, como o Galpão sente a relevância social do teatro? O ator Eduardo Moreira acredita que a sociedade precisará de um contraponto à superficialidade potencializada pelas redes sociais:

“De alguma forma, somos dinossauros nessa questão de resistência. Está difícil ver as pessoas saindo de casa para ter um convívio público, mas acredito que o teatro se tornará cada vez mais necessário. Ninguém aguenta mais essa coisa sem substância. Lutamos contra a vulgaridade no sentido de propor algo que tenha mais conteúdo, linguagem, pesquisa.”

Neste ano, o grupo lançou uma série de registros de seus trabalhos, incluindo livros, DVDs e um CD. Esse esforço do Galpão e de outras companhias brasileiras em deixar um legado se faz necessário em vista da falta de iniciativa do mercado editorial e do poder público, na visão de Moreira:

“Os grupos estão cada vez mais atentos para deixar registros da história do teatro brasileiro, mas o apoio é nulo. Nosso mercado editorial é fraquíssimo, está anos-luz atrás de Argentina e México. O poder público também é fraco nesse sentido.”

Acostumados a trabalhar com encenadores convidados, os atores do Galpão pretendem estrear, no início de 2016, um espetáculo com o diretor Marcio Abreu, da Companhia Brasileira de Teatro (PR). Por enquanto, eles têm pesquisado conjuntamente temas como política e manifestações.

  Está difícil ver as pessoas saindo de casa para ter um convívio público, mas acredito que o teatro se tornará cada vez mais necessário

Livros
Coleção de 10 volumes que podem ser comprados em um pacote (R$ 130) ou individualmente (R$ 20 cada), os Diários de montagem relatam o processo de construção de espetáculos que vão desde Romeu & Julieta (1992) a Os gigantes da montanha (2013). Os textos foram escritos por Cacá Brandão, que atuou como dramaturgo em importantes produções, e pelo ator e diretor Eduardo Moreira. O Galpão também lançou dois livros sobre o espaço cultural que mantém em Belo Horizonte. Em Galpão Cine Horto – Uma experiência de ação cultural (R$ 50), diversos autores tratam dos principais projetos que ocuparam o local, enquanto Do Grupo Galpão ao Galpão Cine Horto – Uma experiência de gestão cultural (R$ 70), escrito por Chico Pelúcio e Romulo Avelar, é voltado para produtores e gestores culturais. Os dois títulos podem ser comprados também juntos em uma caixa (R$ 100).

DVDs
Remontado em 2012 com elenco quase original, Romeu & Julieta ganhou registro em DVD (que inclui o documentário Flor, minha flor, dirigido por Chico Pelúcio e Rodolfo Magalhães), assim como a peça Os gigantes da montanha (inclui documentário sobre os bastidores do processo de montagem), ambos filmados na Praça do Papa, em Belo Horizonte. Os DVDs podem ser adquiridos separadamente (R$ 40 cada) ou em um estojo com ambos (R$ 60).

CD
Um disco contém as trilhas dos espetáculos Till, a saga de um herói torto (2009) e Os gigantes da montanha (R$ 20).

Os produtos do Galpão podem ser adquiridos pelo site, aqui, ou nas sessões do espetáculo De tempo somos.

.:. Publicado originalmente no jornal Zero Hora, Segundo Caderno, p. 5, em 16/5/2015.

.:. Mais informações sobre a programação do 10º Festival Palco Giratório Sesc/POA, aqui.

Ficha técnica:
Com: Antonio Edson, Beto Franco, Eduardo Moreira, Fernanda Vianna, Lydia Del Picchia, Luiz Rocha (ator convidado), Júlio Maciel, Paulo André, Simone Ordones e Inês Peixoto (atriz curinga)
Direção: Lydia Del Picchia e Simone Ordones
Direção musical, arranjos e trilha sonora: Luiz Rocha
Pesquisa de texto: Eduardo Moreira
Figurinos: Paulo André
Preparação vocal: Babaya
Preparação corporal: Fernanda Vianna
Iluminação: Rodrigo Marçal
Design sonoro: Vinícius Alves
Aulas de percussão: Sérgio Silva
Assessoria na cena A carteira: Diego Bagagal
Assessoria de iluminação: Chico Pelúcio
Revisão de textos: Arildo de Barros
Voz em off:: Teuda Bara
Arranjos baseados em originais de Babaya, Ernani Maletta e Fernando Muzzi, do repertório musical do Grupo Galpão.
Fragmentos de textos: Eduardo Galeano, Charles Baudelaire, Olga Knipper, Jack Kerouak, Nelson Rodrigues, Anton Tchékhov, José Saramago, Paulo Leminski e Calderón de La Barca

Jornalista e doutor em Literatura Comparada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É setorista de artes cênicas do jornal Zero Hora, em Porto Alegre (RS). Foi coordenador do curso de extensão em Crítica Cultural da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS). Já participou dos júris do Prêmio Açorianos de Teatro, do Troféu Tibicuera de Teatro Infantil (ambos da prefeitura de Porto Alegre) e do Prêmio Braskem em Cena no festival Porto Alegre Em Cena. Em 2011, foi crítico convidado no Festival Recife de Teatro Nacional.

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