26.1.1997 | por Valmir Santos
O Diário de Mogi – Domingo, 26 de janeiro de 1997. Caderno A – 3
VALMIR SANTOS
São Paulo – Marcelo Melo entrecruza as mãos, como se estivesse rezando diante do microfone. O grandalhão Toinho Alves, por sua vez, toca e canta abraçado ao baixo acústico, um instrumento maior que ele.
São imagens epifânicas dos dois remanescentes da formação original do Quinteto Violado, num “auto de fé” pelas raízes da música nordestina, que levam adiante com seus outros companheiros de palco, celebrando 25 anos de estrada.
E “25 anos Não São 25 Dias” é o nome do show e CD recém-lançado. O espetáculo foi apresentado semana passada, em São Paulo, na Sala Funarte, e agora está em cartaz no Rio.
O 28° disco do grupo foi gravado ao vivo, com participações especiais de Elba Ramalho e Alceu Valença. Mas acompanhá-lo ao vivo é sempre mais emocionante. O Quinteto surgiu em 1971. Desde sua gênese, está filiado aos artistas que têm a cultura popular como principal bandeira.
A mixórdia rítmica dá conta de baiões, cirandas, frevos e outros balangandãs que traduzem uma brasilidade inerente.
O instrumento, a letra e a presença dos músicos do Violado lembram outro Quinteto, o Armorial, que também surgiu em Recife (PE), na década de 70, capitaneado por Ariano Suassuna (“Auto da Compadecida”), e então com um moço baixinho e magrinho na sua formação: o instrumentista, ator e dançarino Antonio Nóbrega, o mesmo que anos depois se tornaria um dos símbolos da resistência cultural com seu Espaço Brincante.
O show de bodas de prata faz um apanhado da carreira. Assim como o CD, abre com “Tô Chegando”, composição de 25 anos atrás, de Duda Alves e Toinho Alves, cujos versos dizem “Do forró ao arrasta-pé/Nunca estou indo embora”. Não mesmo.
E tem “Bodas de Frevo”, poema de Aldir Blanc, musicado especialmente para a data (“Eu vi, olá/Um quinteto violando/Violalirando/Esse Brasil patife”). Tem “Águas de Março”, do maestro Tom Jobim, em versão embolada.
Tem homenagem a Luiz Gonzaga, com “Sabiá”, “Cintura Fina” e “Riacho do Navio”, todas em parceria com Zé Dantas.
Da passagem do grupo pela Ilha de Cabo Verde resultou a contagiante “Mulato”, letra e interpretação de Toinho Alves. E teve ainda leituras para “Tenho Sede”, de Dominguinhos e Anastácia, e “Pingos de Amor”, de Paulo Diniz e Odibar.
Melo, Toinho, Dudu Alves (teclados), Ciano Alves (flauta), Roberto Medeiros (percussão), mais o músico convidado Kiko (bateria) promovem um verdadeiro encontro com o outro Brasil, aquele além e acima do eixo Rio-São Paulo – espontâneo, criativo e vivo no que ele tem de mais belo na arte transformadora que é a música.
O Quinteto Violado, que neste ano ganha uma biografia, cravou com honra, coerência e sobretudo matutice o seu nome na história da MPB.