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“(Re) Descoberta das Américas chega a SP"

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Folha de S.Paulo

São Paulo, sexta-feira, 28 de abril de 2006

TEATRO 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Pode haver boas intenções num colonizador? O ator e dramaturgo italiano Dario Fo responde com algumas pistas em “A Descoberta das Américas”, texto que veio à luz em 1992, justamente no quinto centenário do feito (e dito) do genovês Cristovão Colombo.

A primeira montagem brasileira vem do Rio e estréia hoje no Sesc Pinheiros. É um solo de Júlio Adrião (Prêmio Shell 2005 de melhor ator), com direção de Alessandra Vannucci.

O autor -Nobel de Literatura em 1997- faz com que um certo malandro Johan drible a Inquisição, que já queimara sua mulher, embarque de gaiato numa das caravelas de Colombo, sobreviva a um naufrágio em que toda a tripulação desaparece e, ao cabo, desperte numa ilha.

Lá, ele é preso, escravizado, mas escapa de ser engolido pelos nativos antropófagos graças a “milagres”, como prever o tempo. O “zé ninguém” torna-se então o “filho da lua”. Aprende a língua dos índios, catequiza-os e inverte a liderança a seu favor.
Chega a organizar um exército de libertação indígena para caçar os espanhóis invasores.

Eis apenas a introdução dessa aventura mirabolante. Há muito mais peripécias na história que Júlio Adrião conta aliando o verbo à partitura corporal.

“Johan sofre um processo de humanização ao longo do espetáculo. Ele mesmo um estrangeiro, depara com a imposição de quem chega [os espanhóis], domina pela força, pela covardia, pela falta de respeito, pela ignorância do outro”, diz Adrião, 45.

Passados cerca de 40 anos, o náufrago sobrevivente teve chances de voltar à civilização, mas recuou. “Decide permanecer com aqueles que o respeitavam de fato e com quem aprendeu a amar aquela terra”, diz o ator.

A ação física é fundamental na cena. Adrião pretende que o público assimile os códigos gestuais a ponto de o narrador (ele mesmo) nem precisar falar mais. Basta cruzar os braços numa postura que já se tem um índio.

Sob a luz suave mantida durante boa parte do espetáculo, sem apoio de sonoplastia e metido num figurino esfarrapado, Adrião multiplica-se em vários papéis, tempos e espaços. Na hora da chuva, por exemplo, é o próprio quem “faz” a ventania, os mastros da caravela, os animais.

O desafio é convencer a platéia a embarcar por meio de um vocabulário mímico (imagens, gestos e máscaras) e sonoro (palavras, ruídos, onomatopéias). A commedia dell’arte e o teatro de rua são linguagens cômicas basilares na interpretação.

Ao lado da diretora Alessandra Vannucci, Adrião protagonizou vários experimentos cênicos desde 2000, mas a estréia só ocorreu no ano passado.

“A Alessandra teve humildade em não impor suas idéias e, sim, lapidar o projeto no caminho que tínhamos”, diz o ator. Ambos já cumpriram temporadas de estudos teatrais na Itália, daí a sintonia com o universo de Fo. Ao lado do produtor Sidnei Cruz, eles criaram a cia. Leões de Circo em 2002.

Sobre o processo de colonização, quer no Brasil ou alhures, Dario Fo não deixa pedra sobre pedra. “Seu texto é extremamente irônico, ferino. Ele pega pesado com os colonizadores, leva ao riso e à reflexão”, diz Adrião.



A Descoberta das Américas
Quando: estréia hoje, às 20h; sex., às 20h e sáb., às 19h; até 27/5 
Onde: Sesc Pinheiros – auditório (r. Paes Leme, 195, tel. 3095-9400) 
Quanto: R$ 10