Folha de S.Paulo
1.9.2005 | por Valmir Santos
São Paulo, quinta-feira, 01 de setembro de 2005
TEATRO
Hugo Possolo, dos Parlapatões, atua em texto corrosivo do norte-americano Eri Bogosian encenado por Aimar Labaki
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
Logo no início, o “piloto do vagão”, um dos idiotas que desfilarão pelo palco, manda a platéia apertar os cintos. Não será fácil agüentar o tranco do passeio pelo desencantado mundo da mesquinhez demasiado humana.
“Prego na Testa” vasculha certo inconsciente coletivo, porão também da alma brasileira. O monólogo com o ator e palhaço Hugo Possolo, dos Parlapatões, estréia amanhã no Sesc Belenzinho.
É um texto de meados dos anos 90 do americano Eric Bogosian (o mesmo de “SubUrbia”, encenado em SP por Francisco Medeiros), em tradução do dramaturgo Aimar Labaki (“A Boa”), que também assina a direção.
São nove cenas com personagens que não escondem perturbação, parafuso solto. Martelam suas mentes -e a do espectador- com ilações sobre desejos, alguns escatológicos, e medos do outro e das próprias sombras.
O fundo social é recorrente. Há o sujeito que, quando deprimido, dá um “rolê” com o carrinho do supermercado. Há o que liga muito para a dor alheia, porque “importo, logo existo”. Há o desagradável. Ou aquele que anda incomodado com uma “doença de pobre”, uma pereba que atribui ao mendigo que roçou sua pele.
“O mais importante é a relação de identidade que cada espectador pode estabelecer com esses tipos, ou mesmo com o Brasil atual”, diz Possolo, 43.
“Não terei sempre o tempo do riso da platéia, mas também jogarei com a angústia”, diz o ator, que vê parentesco com “Não Escreve Isto” (1998), do repertório dos Parlapatões, sobre os delírios do mendigo Maneco Vira-Prego.
Para quem está acostumado à interação que os Parlapatões estabelecem com o público, aqui ela se dá de forma indireta, mas munida da violência do texto.
Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.