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Folha de S.Paulo

Teatro repercute polêmica com Gil

7.12.2005  |  por Valmir Santos

São Paulo, quarta-feira, 07 de dezembro de 2005 

TEATRO 

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Durante encontro em BH, profissionais criticam MinC e artistas

VALMIR SANTOS
Enviado especial a Belo Horizonte

Teatro é, por natureza, conflito. E no Brasil deste final de 2005, o embate se dá fora de cena: artistas apontam o descaso do Ministério da Cultura em relação ao setor.

Em sabatina na Folha, o ator Paulo Autran afirmou que “ninguém da classe teatral sabe o que ele [Gilberto Gil] fez”. Também em entrevista à Folha, seu colega, Marco Nanini, disse que Gil “nunca foi ao teatro, não gosta”. Em resposta, o ministro Gilberto Gil afirmou que não prioriza o “teatro dos consagrados”.

Gerald Thomas, que dirige Nanini em “Um Circo de Rins e Fígados”, também critica o ministro: “Gil está matando a cultura teatral no Brasil por ser um total analfabeto no que diz respeito à infra-estrutura dramática: não sabe distinguir um intérprete de um dramaturgo; não sabe distinguir um autor dramático de ator”.

A peleja também respinga em Belo Horizonte (MG), onde termina hoje a 2ª edição do Redemoinho (Rede Brasileira de Espaços de Criação, Compartilhamento e Pesquisa Teatral).

Aqui, a voz é do teatro feito por grupos e companhias. Não por acaso, o evento acontece no Galpão Cine Horto, centro cultural do grupo Galpão, 23 anos.

“Os dois lados foram infelizes. Não é que o MinC não esteja fazendo nada. Não se faz nada no país há décadas, daí a demanda. E Gil também é um músico consagrado, o que também ajuda sua pasta”, diz o diretor Luiz Fernando Lobo, da companhia Ensaio Aberto (RJ).

Para a pesquisadora Iná Camargo Costa, o movimento Arte contra a Barbárie, de São Paulo, “já havia levantado essa lebre”.

“Não fazemos um teatro cuja consagração é a chancela do mercado, mas um teatro que tenha função social.” Nesse sentido, afirma a intelectual, “faltam esclarecimentos” tanto a Gil quanto aos seus críticos.

O Arte contra a Barbárie surgiu em 1999 por iniciativa de grupos paulistanos. Sua principal conquista foi a Lei de Fomento, de 2002 (cerca de R$ 9 milhões por ano repartidos para grupos selecionados por comissão).

Em sua participação anteontem, no Redemoinho, o presidente da Funarte (órgão responsável pelas artes cênicas no MinC), Antônio Grassi, disse que a pasta busca “uma política de Estado que tenha como alvo o cidadão”.

Mas o ministério não abre a torneira. Dois prêmios de fomento à produção, anunciados com pompa por Gil no início de 2005, ainda não vingaram: o Myriam Muniz (para o teatro) e o Klauss Vianna (para a dança). Grassi promete edital para janeiro de 2006: R$ 13 milhões para as duas áreas.

Gil passou o ano reclamando de contingenciamento. O governo cortou 57% do orçamento do MinC, que era de R$ 480 milhões.

Crise da cultura
Durante três dias de Redemoinho, cerca de 70 grupos de 11 Estados debatem assuntos relativos à “permanente crise da cultura e a omissão dos governos federal, estaduais e municipais no apoio e manutenção dos espaços”.

Relator da Lei de Fomento, o diretor Luiz Carlos Moreira (grupo Engenho Teatral, SP) afirma que os artistas, em geral, não têm clareza sobre as políticas públicas. “A classe precisa construir um teatro significativo para a sociedade, agir como sujeito histórico e não ficar na briga medíocre pela sobrevivência”, afirma.



O jornalista 
Valmir Santos viajou a convite do Galpão Cine Horto


Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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