Folha de S.Paulo
17.3.2007 | por Valmir Santos
São Paulo, sábado, 17 de março de 2007
TEATRO
Espetáculo de Celso Frateschi, que estréia hoje no Ágora Teatro, discute temas como exclusão social e preconceito
Para o diretor Roberto Lage, texto faz alusão ao papel das periferias brasileiras, que, antes abandonadas, agora têm grande espaço
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
Quem é sombra de quem? O motorista de caminhão engolido pela cratera ou o dono da construtora? A peça “Estação Paraíso”, de Celso Frateschi -ator que recém-assumiu a presidência da Funarte-, é uma fábula sobre um carpinteiro de obras e um funcionário da administração do metrô que dá o que pensar sobre as relações na superfície e nos subterrâneos da vida contemporânea.
Na montagem de Roberto Lage, a partir de hoje no Teatro Ágora, Dárcio de Oliveira interpreta o personagem Negro, o carpinteiro demitido que participa de um saque na cidade convulsionada por crise social.
O ator Osvaldo Raimo é o Branco, sujeito que perambula com uma Bíblia em punho, recitando o Apocalipse, à espera do anjo do abismo.
Eles se cruzam por acaso num túnel, à noite, numa estação de metrô que o original sugere desativada, mas Lage, que leu a primeira versão do texto em 2001, repropõe como um lugar ainda não inaugurado, tintas frescas que também encerram lá seus fantasmas.
Jogo regrado
No cenário às vezes ofuscado pela luz branca (como a um pórtico paradisíaco de frutos proibidos) e na maior parte do tempo dominado pela luz fria, os personagens estabelecem um jogo regrado por preconceito, conhecimento, vida e morte.
Às desconfianças e ameaças mútuas, segue-se a cumplicidade em suas misérias sociais e afetivas. Abandonados pelo “mundo lá fora”, juntam suas forças e brindam pelo metrô da manhã, o último de suas vidas.
“De um lado, um homem que sempre foi marginalizado pela sociedade. De outro, um homem que sempre esteve a serviço da mesma. A descartabilidade no sistema capitalista é uma das questões-chave”, afirma Lage, 60.
O diretor vê a inversão dos papéis históricos dos personagens, no curso da peça, como indício das periferias brasileiras que foram abandonadas, esquecidas, e agora ocupam espaço significativo.
Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.