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Folha de S.Paulo

“Cata-dores” faz tributo aos clowns de “Godot”

16.3.2007  |  por Valmir Santos

São Paulo, sexta-feira, 16 de março de 2007

TEATRO 
Espetáculo inspirado na obra de Samuel Beckett estréia no teatro Cultura Inglesa

Atores Jairo Mattos e Paulo Gorgulho vivem Um e Dois, palhaços que trabalham nas ruas, mas encontram tempo para reflexões sobre a vida

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

É como se Didi e Estragão vagassem pelas ruas de São Paulo. Mendigos, com seus sacos inseparáveis, criam um mundo à parte para se relacionar com o lugar-comum, duplo sentido e fonte da arte dos palhaços para tocar a vida dia após dia. 

“Cata-dores”, o espetáculo que estréia hoje no teatro Cultura Inglesa de Pinheiros, é a um só tempo inspiração e homenagem a “Esperando Godot”, a obra-prima do século 20 sobre dois clowns vagabundos em contínua crise existencial. 

Samuel Beckett (1906-89) é objeto de doutorado da autora da peça, Cláudia Vasconcelos, que remete aos silêncios e às mudanças de cena a cada vez que a noite cai. “É um texto esperançoso, que fala que a saída para os problemas em geral está no outro”, diz Jairo Mattos, 44, o intérprete do personagem Um. O outro é Dois, vivido por Paulo Gorgulho. 

Vasconcellos frisa que os personagens são palhaços, mas não usam nariz vermelho, nem maquiagem ou roupa estilizada. Surgem como trabalhadores de rua a recolher ou despejar trecos. Em meio à sobrevivência, dão margem à reflexão. Um, o personagem, faz as vezes do “augusto”, figura clássica do palhaço otimista. Seu contraponto (e complemento) é Dois, o “branco”, rabugento, mal-humorado. Ambos têm a mesma idade, mas Dois se acha mais velho, resmunga, tosse. 

O catador Um, de espírito jovem, passa a história toda tentando se aproximar de Dois, como a desarmá-lo da solidão, das dores. Faz de tudo, até lhe dedica “a trova da tripa seca” para encher lingüiça. 

“Há passagens líricas e outras escatológicas, mas sempre no limite, tomando cuidado em não destruir a idéia da dramaturgia, suas pausas, sua contundência”, diz Mattos. Um terceiro artista completa a cena: um “homem-banda”, como diz o diretor, o maestro Marcello Amalfi, encarregado dos efeitos sonoros ao vivo. Ele toca bateria, pistom, guitarra etc., pontuando as ações de Um e Dois, sem estabelecer relação.



Cata- dores
Quando:
estréia hoje, às 21h30; sex., às 21h30; sáb., às 21h; e dom., às 19h. 
Onde: teatro Cultura Inglesa – Pinheiros (r. Deputado Lacerda Franco, 333, tel. 3814- 0100) 

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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