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Folha de S.Paulo

Obra abarca 50 anos do pensamento de Heliodora

3.11.2007  |  por Valmir Santos

São Paulo, sábado, 03 de novembro de 2007

TEATRO 
Coletânea reúne textos publicados em jornais cariocas entre 1944 e 1994, com destaque para ensaios teóricos da crítica de teatro  

VALMIR SANTOS
Da Reportagem local 

Noite dessas, Barbara Heliodora reuniu-se no Rio com artistas como Fernanda Montenegro, Tonia Carrero, Ítalo Rossi e Sérgio Britto. A conversa girou em torno do lançamento da coletânea de textos da crítica de teatro, um painel da segunda metade do século 20. 

“O livro cobre a época em que esses monstros sagrados de hoje estavam começando a carreira”, diz a carioca Heliodora, 84. Um dos destaques de “Barbara Heliodora – Escritos de Teatro”, que sai pela editora Perspectiva, é agrupar em sua primeira parte ensaios teóricos da autora, entre 1944-1971, face menos conhecida pelas novas gerações. Organizadora do volume, a pesquisadora Claudia Braga estabelece como ponto de partida o primeiro artigo que Heliodora publica na imprensa, um estudo sobre o escritor inglês Geoffrey Chaucer em “O Jornal”, 23/4/ 1944. 

Seguem-se como que os anos de formação da crítica, que na análise de autores fundamentais, como na triangulação Sófocles-Eurípides-Eugene O’Neill, para falar da evolução da tragédia, quer na percepção de que o então incipiente moderno teatro brasileiro só alçaria vôos se atores e autores assumissem o lugar de onde falam, ou seja, o Brasil. “A maneira brasileira de interpretar ainda não foi encontrada, mas só será encontrada quando houver meios de treinar atores, e, sem dúvida, será com o trabalho com textos nacionais, em que são retratados brasileiros de todos os tipos, que eventualmente os atores poderão encontrar a melhor maneira de vivê-los”, escreve em 1959, entusiasmada na recepção de textos de Ariano Suassuna e Gianfrancesco Guarnieri. Em 2007, o panorama é outro. “Uma das mudanças mais importantes é que hoje, a grande maioria dos espetáculos é de autor brasileiro. Antigamente, a maioria era importada”, diz à Folha. 

A “pancada da ditadura”, diz, teria diluído uma produção ativa. “Prejudicou por dois lados: quem já estava escrevendo e tinha um certo corpo de obra, abandonou o teatro, porque viram que não podiam fazer nada; e impediu que novos vivessem de palco para dizer coisas mais significativas.” 

Após a abertura política, Heliodora tomou gosto pelo besteirol e muita gente não entendeu o motivo. “Foi uma maneira muito fácil e acessível de chamar o público de volta para o teatro. O besteirol vem de uma grande tradição no teatro brasileiro que é a da comédia de costumes, um esteio um pouco mais caricato.” 

Como não poderia deixar de ser, as críticas representam o maior filão na coletânea, que avança até 1994. Ao atrair desafetos pelo estilo incisivo, Heliodora diz que prefere não entrar em bate-boca. “Se alguém fica furioso, é melhor deixar se acalmar. Enfrento o trabalho com toda a equanimidade.” 

O diretor Enrique Diaz, da carioca Cia. dos Atores, discorda. Identifica na crítica de “O Globo” (desde 1990) “desrespeito, estreiteza de pensamento e leviandade”, como declarou em julho a “O Estado de S. Paulo”. “É problema dele, minha carreira não ilustra essa leviandade. Ele tem liberdade para achar isso, mas a ofensa não leva a nada”, diz Heliodora. 



Barbara Heliodora – Escritos sobre o Teatro
Organizadora: Claudia Braga 
Editora: Perspectiva (952 págs.) 
Quanto: R$ 90 

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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