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Reportagem

Turnê nacional nos 30 anos de ‘Bailei na curva’

5.11.2013  |  por Fábio Prikladnicki

Foto de capa: Marcelo Liotti

Palco vazio. Sete cadeiras pretas. Som no rádio. Assim começavam as orientações de cena do texto da peça Bailei na curva, estreada em 1º de outubro de 1983 no Teatro do IPE, em Porto Alegre. A simplicidade da cenografia refletia a dificuldade de se fazer teatro em Porto Alegre, como sugeria o nome do grupo que realizou o espetáculo: Do Jeito que Dá.

Criado por estudantes do Departamento de Arte Dramática da UFRGS em final de curso, o Do Jeito que Dá vinha de um trabalho bem-sucedido. No ano anterior, havia apresentado Não Pensa Muito que Dói, vencedor do Prêmio Açorianos de Teatro de melhor espetáculo e direção (Júlio Conte). Mas ninguém previu o fenômeno Bailei na curva, provavelmente a peça mais popular do moderno teatro gaúcho, obra que plasmou o imaginário de uma geração e que continua sendo montada, com elenco renovado, pelas mãos do diretor Júlio Conte.

Versão atual da obra de 1983 de Júlio Conte

Prova disso é a versão comemorativa de 30 anos da estreia, que terá sessões de sexta a domingo, no Teatro do Bourbon Country, em Porto Alegre, e depois segue para Novo Hamburgo, São Paulo e Rio. As apresentações, que contam com um elenco de jovens atores, terão participações especiais de veteranos que estiveram nas primeiras encenações. Entre os jovens, está a filha do diretor, Catharina Conte, 20 anos, no elenco desde 2012.

Bailei na curva estreou no mesmo ano em que começava o movimento pelas eleições diretas no Brasil e fez parte de um conjunto de peças que relatavam a experiência dos que cresceram durante a ditadura militar. A história se passa em três décadas: mostra os personagens ainda crianças no dia do golpe, passa pela adolescência nos anos 1970 e termina no início da década de 1980, em meio aos dilemas do futuro. Entre os diferenciais da produção, estava a linguagem repleta de gírias, que emulava a dicção dos jovens. O texto foi costurado por Júlio Conte a partir de improvisações do elenco: Claudia Accurso, Cláudio Cruz, Hermes Mancilha, Lúcia Serpa, Márcia do Canto, Regina Goulart e Flávio Bicca Rocha, este também compositor da música-tema Horizontes. Falando de “um porto não muito alegre”, a canção se descolou da peça, tornando-se uma espécie de hino informal da capital.

Turnê por RS, SP e RJ mescla jovens e veteranos

O espetáculo foi um sucesso imediato de crítica e de público. Levou um prêmio especial no Açorianos de 1983. Filas se formavam do lado de fora do teatro, e os atores eram reconhecidos na rua. A 100ª apresentação, no Teatro do IPE, em junho de 1984, tinha 228 pessoas sentadas e 62 em cadeiras extras. Até então, o trabalho havia sido assistido por mais de 24 mil pessoas. Em depoimento publicado em Zero Hora na ocasião, o produtor Geraldo Lopes, da Opus – que neste ano retoma a parceria com o espetáculo –, lembrava que o público habitual de uma peça em Porto Alegre era de 5 mil a 7 mil pessoas. O livro com o roteiro foi o segundo mais vendido da editora L&PM na Feira do Livro de Porto Alegre de 1984, atrás apenas de A mulher do silva, de Luis Fernando Verissimo. Hoje, Júlio Conte perdeu a conta de quantas pessoas assistiram ao espetáculo. Em 2008, falava-se em mais de 600 mil. Houve incontáveis remontagens pelo país e uma certeza: Bailei na curva não se perdeu por aí.

Bailei na curva

A turnê também terá sessões no Teatro Feevale, em Novo Hamburgo (9 e 10 de novembro), no Teatro Bradesco Rio, no Rio de Janeiro (22 e 23 de janeiro), e no Teatro Bradesco, em São Paulo (24 e 25 de janeiro).

Originalmente publicado no jornal Zero Hora, 15/10/2013.

 

Jornalista e doutor em Literatura Comparada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É setorista de artes cênicas do jornal Zero Hora, em Porto Alegre (RS). Foi coordenador do curso de extensão em Crítica Cultural da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS). Já participou dos júris do Prêmio Açorianos de Teatro, do Troféu Tibicuera de Teatro Infantil (ambos da prefeitura de Porto Alegre) e do Prêmio Braskem em Cena no festival Porto Alegre Em Cena. Em 2011, foi crítico convidado no Festival Recife de Teatro Nacional.

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