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Reportagem

‘A negra felicidade’ e a perpetuação da violência

30.1.2014  |  por Maria Eugênia de Menezes

Foto de capa: Guga Melgar

A história de uma mulher alforriada que volta a ser escrava é o objeto do espetáculo carioca A negra felicidade. Dirigida por Moacir Chaves, a montagem reconstitui um episódio verídico do Rio de Janeiro do século 19: em 1870, uma ex-escrava pede um empréstimo para conseguir comprar a liberdade de sua filha. O agiota, contudo, decide cobrar a dívida assumindo a posse da moça.

À época, o caso foi levado ao tribunal. E é precisamente sobre esse processo judicial que a peça se detém. “Não se trata de uma dramatização dessa situação, mas de uma relação com a notícia bruta, com os documentos”, comenta o diretor, que construiu a dramaturgia a partir dos autos do processo jurídico, de classificados de jornal daquele período e de um sermão do Padre Antônio Vieira. “Além do imenso valor literário, esse é um sermão que trata especificamente da natureza ignóbil do homem, que explora a própria espécie”, pontua Chaves.

A despeito do caráter histórico, o caso recuperado por A negra felicidade pode servir para ampliar o entendimento sobre questões atuais. Ao recorrerem à justiça, mãe e filha acabaram condenadas a prestar serviços por dois anos ao homem que as ameaçava. “Vivemos falando sobre a violência das cidades como se tratasse de um novo fenômeno e não da base sobre a qual nossa sociedade foi calcada. A violência de hoje é desprezível se comparada à da escravidão”, observa o encenador.

‘Labirinto’, também no repertório, abraça Qorpo-Santo

Além de A negra felicidade, a Companhia Alfândega 88, criada por Moacir Chaves em 2011, traz outro título de seu repertório a São Paulo. Labirinto leva à cena três textos do dramaturgo gaúcho Qorpo Santo: Hoje sou um, e amanhã outro; As relações naturais e A separação de dois esposos.

Escrita no século 19 e desconhecida até a década de 1960, sua obra tratava de temas interditos como a sexualidade e a pedofilia. A separação de dois esposos traz, inclusive, aquela que é considerada a primeira cena gay do teatro brasileiro.

:.: Publicado originalmente em O Estado de S.Paulo, Caderno 2, página C5, em 30 de janeiro de 2014.

A negra felicidade

De qui. a dom., às 19h15. Temporada: de 30/1 a 2/2. Grátis.

Labirinto

De qui. a dom., às 19h15. Temporada de 6 a 9/2. Grátis

Oficina de interpretação teatral com Moacir Chaves

Dias 1º e 2/2, sáb. e dom., das 15h às 18h. 40 vagas para atores e estudantes de teatro. Inscrições gratuitas. Currículos para o email alfandega88@hotmail.com e aguardar confirmação.

Caixa Cultural São Paulo

Praça da Sé, 111, tel. : 11 3321-4400. Os ingressos devem ser retirados na bilheteria com uma hora de antecedência. 80 lugares.

http://www.youtube.com/watch?v=zgDutTmQnKg

Ficha técnica de A negra felicidade

(Textos extraídos de Autos de um processo de 1870, movido pela escrava Felicidade por sua liberdade e do Sermão de Santo Antonio aos Peixes, de Padre Antonio Vieira).

Direção e dramaturgia: Moacir Chaves

Com: Andy Gercker, Adriana Seiffert, Danielle Martins de Farias, Edson Cardoso, Elisa Pinheiro, Fernando Lopes Lima, Leonardo Hinckel, Rafael Mannheimer, Rita Fischer e Silvano Monteiro.

Assistência de direção e coordenação de produção: Danielle Martins de Farias

Figurinos: Inês Salgado

Iluminação: Aurélio de Simoni

Direção musical: Tato Taborda

Projeto gráfico: Maurício Grecco

Montagem de luz e cenotécnica SP: Ton Light Iluminação

Produção: Danielle Martins de Farias, Luísa Pitta e Mariana Guimarães Nicholas

Produção local: Monique Carvalho

Assessoria de imprensa: Verbena Comunicação

Realização: Alfândega 88

Ficha técnica de Labirinto

Textos: José Joaquim de Campos Leão, Qorpo-Santo

Direção e dramaturgia: Moacir Chaves

Com: Adriana Seiffert, Andy Gercker, Danielle Martins de Farias, Denise Pimenta, Elisa Pinheiro, Fernando Lopes Lima, Gabriel Gorosito, Leonardo Hinckel, Luísa Pitta, Rafael Mannheimer, Rita Fischer e Silvano Monteiro.

Iluminação: Aurélio de Simoni

Assistência de direção e coord. de produção: Danielle Martins de Farias

Cenário: Fernando Mello da Costa

Figurinos: Inês Salgado

Direção musical: Tato Taborda

Projeto gráfico: Maurício Grecco

Montagem de luz e cenotécnica SP: Ton Light Iluminação

Produção: Danielle Martins de Farias, Luísa Pitta e Mariana Guimarães Nicholas

Produção local: Monique Carvalho

Assessoria de imprensa: Verbena Comunicação

Realização: Alfândega 88

Crítica teatral, formada em jornalismo pela USP, com especialização em crítica literária e literatura comparada pela mesma universidade. É colaboradora de O Estado de S.Paulo, jornal onde trabalhou como repórter e editora, entre 2010 e 2016. Escreveu para Folha de S.Paulo entre 2007 e 2010. Foi curadora de programas, como o Circuito Cultural Paulista, e jurada dos prêmios Bravo! de Cultura, APCA e Governador do Estado. Autora da pesquisa “Breve Mapa do Teatro Brasileiro” e de capítulos de livros, como Jogo de corpo.

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