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Reportagem

A cultura ocupa conjunto arquitetônico Vila Flores

10.11.2014  |  por Michele Rolim

Foto de capa: Claudio Etges

Quem iria imaginar que “os prediozinhos do Lutzenberger” – até então, assim chamados pela vizinhança – viriam a se tornar um centro de arte. Listado como patrimônio histórico de Porto Alegre, o lugar, agora denominado Vila Flores (que também abriga projetos voltados à educação e à economia criativa) vem se tornando um novo espaço para a cultura.

Fruto de herança familiar, João Felipe Wallig, um dos proprietários do complexo, conta que o edifício foi erguido na década de 1920 e tinha seu uso destinado a “casas de aluguel” para pessoas e famílias que vinham habitar o bairro Floresta, em franca expansão industrial naquela época. O projeto original é do arquiteto Joseph Lutzenberger e inclui dois prédios e um galpão em um ambiente de 1,4 mil metros quadrados entre as ruas Hoffmann e São Carlos. Atualmente, o complexo arquitetônico passa por uma revitalização.

A primeira atividade cultural ocorreu no espaço em dezembro de 2012, com diversas oficinas (grafite, gastronomia, fotografia, construção de hortas verticais e uma tocata musical). Segundo a gestora cultural da Associação Vila Flores, Aline Bueno, a ideia de oferecer um caráter cultural ao projeto surgiu tanto pela vocação da família que o herdou quanto pelo potencial arquitetônico e localização favorável do espaço. “Diante disso, muitas pessoas da comunidade e grupos de artistas se interessaram por esta revitalização e começaram a se juntar em prol do projeto”, conta ela.

Assim surgiu a Associação Cultural Vila Flores, que atua na gestão do espaço, promovendo cursos, palestras, eventos, exposições, feiras, participando de editais e criando redes de contatos relacionados aos negócios criativos da cidade. Atualmente, por meio da locação de espaços, 20 coletivos e empresas estão organizadas em 11 apartamentos. Entre eles, estão o Caixa do Elefante Teatro de Bonecos e o Ato Espelhado Companhia Teatral.

Desde 2013, são realizados eventos de forma mais efetiva, como o Projeto Simultaneidade, que uniu cinema, música e gastronomia, algumas oficinas, workshops e apresentações de teatro. Neste caso, destaque para as peças Hygiene (o ator Ronaldo Serruya na foto no alto) e Nada aconteceu, tudo acontece, tudo está acontecendo, do grupo paulistano XIX, dentro do Festival Palco Giratório Sesc-RS deste ano. O evento oficial de abertura do Vila Flores será no dia 29 de novembro.

Exorcizando o espaço

A performance coreográfica Barbie fuck forever, fruto de uma parceria entre a artista Aline Jones e o projeto Exorcismos Urbanos, do grupo Nômade, fez apresentações no Vila Flores até o início do mês. “Apesar de o projeto ter como foco exorcizar um espaço que esteja abandonado ou esquecido, escolhemos o Vila Flores porque ele não está sendo utilizado em todo o seu potencial. Ele precisa ser visto não só pelos governos, mas por todos”, explica a diretora-geral, Aline Jones. O espetáculo questiona a beleza, suas regras e estereótipos utilizando diversas linguagens. “Hoje, não me interessa dizer se é teatro ou dança, ele é o que é, mas predomina a dança porque estou trabalhando com bailarinos”, conta Aline sobre o projeto, que surgiu há dois anos e teve outros formatos. Das nove cenas criadas para a montagem, cada uma traz uma pergunta relacionada à imagem. “A Barbie é sinônimo de beleza, simpatia e educação. Todas as cenas são reflexos dessa era pós-Barbie, a era da imagem. Como nos relacionamos com a nossa beleza e com a do outro? Passa por nossas questões individuais, mas tem muito do senso comum”, destaca Aline, completando: “Tu colocas mulheres bonitas no Google e demora a vir uma mulher negra, por exemplo”.

>> O blog do Vila Flores, Centro de Cultura, Educação e Negócios Criativos, aqui.

.:. Texto escrito originalmente no Jornal do Comércio, caderno Panorama, p. 1, em 24/10/2014.

Jornalista e mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Desenvolve pesquisa em torno do tema curadoria em festivais de artes cênicas. É a repórter responsável pelo setor de artes cênicas do Jornal do Comércio, em Porto Alegre (desde 2010). Participou dos júris do Prêmio Açorianos de Teatro, do Troféu Tibicuera de Teatro Infantil (ambos da Prefeitura de Porto Alegre) e do Prêmio Braskem em Cena no festival internacional Porto Alegre Em Cena. É crítica e coeditora do site nacional Agora Crítica Teatral e membro da Associação Internacional de Críticos de Teatro, AICT-IACT (www.aict-iatc.org), filiada à Unesco). Por seu trabalho profissional e sua atuação jornalística, foi agraciada com o Prêmio Açorianos de Dança (2015), categoria mídia, da Secretaria de Cultura da Prefeitura de Porto Alegre (2014), e Prêmio Ari de Jornalismo, categoria reportagem cultural, da Associação Rio Grandense de Imprensa (2010, 2011, 2014).

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