14.9.2006 | por Valmir Santos
São Paulo, quinta-feira, 14 de setembro de 2006
TEATRO
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
Em “Carreiras”, que fez temporada em julho em São Paulo, a personagem, âncora de telejornal, passava boa parte da peça ao telefone. Na nova incursão de Domingos Oliveira pela cidade, em que co-escreve e dirige “Rita Formiga”, a protagonista também tem no aparelho um aliado.
Estamos nos anos 60. A história que se verá no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) paulistano, onde o espetáculo pré-estréia hoje, é fruto de passagem autobiográfica dos autores, Oliveira e a atriz Maria Gladys, nome presente em produções do cinema novo.
Há cerca de 40 anos, Oliveira morava em um apartamento em Copacabana. Gladys era sua amiga. E vizinha. Na época, ela não tinha telefone e usava o dele. Invariavelmente, no meio da tarde, quando o escritor tinha mais inspiração em escrever.
Eram horas no aparelho conversando com uma amiga, o que afetava a concentração de Oliveira. O jeito foi transformar os “percalços da intimidade” em uma peça.
“A Maria Gladys é dona de uma personalidade fascinante. Veio do subúrbio, foi musa do teatro, do cinema, uma mulher com muita generosidade. Falava coisas interessantes no meu telefone. Um dia, pedi a ela que repetisse, gravei e compus o texto. Ficou completamente documentário, como se fosse [o trabalho de] um repórter”, afirma Oliveira, 69.
Ao texto, acrescentou uma segunda narrativa em que o personagem Escritor acaba criando sua primeira peça teatral a partir das histórias da vizinha. Rita Formiga (Guga Stresser) irrompe no apartamento, às vezes sem cumprimentar ao Escritor (Cláudio Tizo), e vai direto ao telefone falar com Íris, interlocutora com quem compartilha conquistas e desilusões amorosas, mais essas que aquelas.
Rita vê o amor chegar, mas também o vê partir num cotidiano em que freqüenta bares como o Degrau e o Zepelin. “Há um pouco de crônica da boemia ipanemense dos anos 60”, conta o autor.
Em meio à voz da narradora, ora chorosa ora esfuziante, o Escritor apela ao algodão no ouvido, mas sucumbe à condição de espectador privilegiado.
E por que Formiga? “Não tem um motivo. Às vezes, se você der um nome que não é o do personagem, ele reclama”, explica Oliveira.