30.8.2007 | por Valmir Santos
São Paulo, quinta-feira, 30 de agosto de 2007
TEATRO
Após sofrer tentativa de atentado em Madri, bufão Leo Bassi apresenta no Brasil o solo “La Revelación”, que critica religiões monoteístas
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
O ítalo-espanhol Leo Bassi, 55, é um palhaço político que leva o ativismo às últimas conseqüências. No ano passado, em Madri, Bassi sofreu tentativa de atentado a bomba supostamente por criticar religiões monoteístas em “La Revelación”. O bufão apresenta o mesmo espetáculo, a partir de hoje, em São Paulo, e na próxima semana no Cena Contemporânea -Festival Internacional de Teatro de Brasília.
Bassi diz à Folha que, minutos antes de chegar ao teatro Alfil, na noite do atentado, um funcionário notou um artefato explosivo colocado a cerca de três metros do seu camarim.
Chamada, a polícia desativou a bomba e passou a escoltar o artista na temporada.
“Minha primeira reação foi alucinar: como era possível que um espetáculo cômico mobilizasse pessoas fundamentalistas e intransigentes, a ponto de tentarem me matar?”, diz Bassi. Nem na Itália, onde fica o Estado do Vaticano, houve reações extremadas.
O papa Bento 16 é uma das personalidades citadas pelo palhaço em seu texto que defende uma Europa laica como caminho para uma sociedade de tolerância. “O bufão não respeita nada e ninguém, seja o presidente, o imperador, a si mesmo e inclusive Deus.”
Ateu, ele leva fé no iluminismo de três séculos atrás. “A crítica ao monoteísmo é uma maneira de homenagear aquele movimento em favor do pensamento racional, contra a idéia de um deus onipotente”, diz o palhaço-filósofo, que cita Voltaire, Kant e Auguste Comte -de quem, lembra Bassi, a bandeira brasileira toma a referência “ordem e progresso”. Em sua obra, o positivista francês (1798-1857) aborda “o amor por princípio; a ordem por base; e o progresso por fim”.
Palhaçadas no Brasil
Aberto a improvisações, Bassi adapta “La Revelación” a cada país que visita -o espetáculo é do final de 2005. “No Brasil pesquiso sobre a forte presença dos evangélicos, principalmente entre a população mais empobrecida, diferentemente do espaço do catolicismo entre os europeus. Estou curioso para ver a reação do espectador.” Bassi tem afinidades por aqui com grupos como Teatro de Anônimo (RJ) e Parlapatões (SP) -este criou o espetáculo “O Pior de São Paulo”, um city-tour por “símbolos” da cidade, inspirado em “Bassibus”, projeto de Bassi que ironiza o turismo nas cidades espanholas.
O bufão, que aos sete anos já se arriscava em números de malabarismo, tem ascendência da sexta geração de uma família italiana de circenses e anarquistas; ainda que tenha nascido em Nova York “por acaso”. Invariavelmente usando paletó e gravata, figurino que destoa da convenção do picadeiro, sem nariz vermelho, Bassi afirma que recorre à ação física, “como convém ao universo circense”, e à projeção de imagens para contar suas histórias.
Em São Paulo, onde se apresenta a convite do projeto Cena Estrangeira, Bassi resistiu à tradução do texto espanhol. Ele visita o país há cerca de sete anos e crê na capacidade de se comunicar por meio do seu “portunhol”. “Para alcançar a reflexão, a narrativa vai além da palavra”, afirma o palhaço.