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Folha de S.Paulo

Belenzinho exibe “pacote” com 5 espetáculos

9.10.2004  |  por Valmir Santos

São Paulo, sábado, 09 de outubro de 2004

TEATRO 
Entram em cartaz montagens de Ilo Krugli, Márcio Aurélio, Ivan Sugahara e solo de dança de Marta Soares

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Publicações dedicadas ao teatro contemporâneo ganharam novas edições no fim de 2005 e neste começo de ano no Rio, em São Paulo e em Belo Horizonte.
Iniciativa do grupo carioca Teatro do Pequeno Gesto, a revista “Folhetim” nº 22 é dedicada ao projeto “Convite à Politika!”, organizado ao longo do ano passado. Entre os ensaios, está “Teatro e Identidade Coletiva; Teatro e Interculturalidade”, do francês Jean-Jacques Alcandre. Trata da importância dessa arte tanto no processo histórico de formação dos Estados nacionais quanto no interior de grupos sociais que põem à prova sua capacidade de convivência e mestiçagem.
Na seção de entrevista, “Folhetim” destaca o diretor baiano Marcio Meirelles, do Bando de Teatro Olodum e do Teatro Vila Velha, em Salvador.
O grupo paulistano Folias d’Arte circula o sétimo “Caderno do Folias”. Dedica cerca de 75% de suas páginas ao debate “Política Cultural & Cultura Política”, realizado em maio passado no galpão-sede em Santa Cecília.
Participaram do encontro a pesquisadora Iná Camargo Costa (USP), os diretores Luís Carlos Moreira (Engenho Teatral) e Roberto Lage (Ágora) e o ator e palhaço Hugo Possolo (Parlapatões). A mediação do dramaturgo Reinaldo Maia e da atriz Renata Zhaneta, ambos do Folias.
Em meados de dezembro, na seqüência do 2º Redemoinho (Rede Brasileira de Espaços de Criação, Compartilhamento e Pesquisa Teatral), o centro cultural Galpão Cine Horto, braço do grupo Galpão em Belo Horizonte, lançou a segunda edição da sua revista de teatro, “Subtexto”.
A publicação reúne textos sobre o processo de criação de três espetáculos: “Antígona”, que o Centro de Pesquisa Teatral (CPT) estreou em maio no Sesc Anchieta; “Um Homem É um Homem”, encenação de Paulo José para o próprio Galpão, que estreou em outubro na capital mineira; e “BR3”, do grupo Teatro da Vertigem, cuja previsão de estréia é em fevereiro.
Essas publicações, somadas a outras como “Sala Preta” (ECA-USP), “Camarim” (Cooperativa Paulista de Teatro”) e “O Sarrafo” (projeto coletivo de 16 grupos de São Paulo) funcionam como plataformas de reflexão e documentação sobre sua época.
Todas vêm à luz com muito custo, daí a periodicidade bamba. Custo não só material, diga-se, mas de esforço de alguns de seus fazedores em fomentar o exercício crítico, a maturação das idéias e a conseqüente conversão para o papel -uma trajetória de fôlego que chama o público para o antes e o depois do que vê em cena.
Folhetim nº 22
Quanto: R$ 10 a R$ 12 (114 págs)
Mais informações: Teatro do Pequeno Gesto (tel. 0/xx/21/2205-0671; www.pequenogesto.com.br)
Caderno do Folias
Quanto: R$ 10 (66 págs)
Mais informações: Galpão do Folias (tel. 0/xx/11/3361-2223; www.galpaodofolias.com)
Subtexto
Quanto: grátis (94 págs; pedidos por e-mail: cinehorto@grupogalpao.com.br)
Mais informações: Galpão Cine Horto (tel. 0/xx/31/3481-5580; www.grupogalpao.com.br)

A encampação incomum de quatro novas produções neste sábado, entre dança e teatro adulto, além da reestréia de um infantil, reafirmam a vocação do Sesc Belenzinho para as artes cênicas.

Inauguram temporada o solo de dança “O Banho”, de Marta Soares; o drama “Avalanche”, montagem carioca do diretor Ivan Sugahara para o texto do americano David Rabe; o musical “Espírito da Terra”, baseado em canções do alemão Frank Wedekind, encenação de Márcio Aurélio; e o clássico “Bodas de Sangue”, do espanhol Federico García Lorca, pelo diretor Ilo Krugli, cujo grupo Ventoforte faz 30 anos e inclui no pacote o infantil “História de Lenços e Ventos”, de autoria do próprio.

Antes, um retrospecto. Em outubro de 98, a exposição “Fantasia Brasileira – O Balé do 4º Centenário” ocupou uma antiga fábrica do grupo Moinho Santista. Foi uma espécie de batismo cultural do espaço de 31 mil m2, convertido, três meses depois, em unidade do Serviço Social do Comércio.

A visibilidade conquistada pelo Sesc Belenzinho passa também por criações de Antunes Filho, Ivaldo Bertazzo, Cacá Carvalho e grupo Lume. A unidade abriga um palco italiano e espaços alternativos (dois galpões, um subsolo e uma oca estilizada).

Agora, aos espetáculos. “O Banho” é inspirado na vida de dona Yayá, como era conhecida Sebastiana de Mello Freire (1887-1961), nascida em Mogi das Cruzes e moradora do Bexiga, mulher da alta sociedade paulistana. Ao ser diagnosticada doente mental, ela teve sua casa transformada em hospital psiquiátrico privado, onde permaneceu por cerca de 40 anos. No subsolo do Belenzinho, a performer Marta Soares surge imersa numa banheira.

Em “Avalanche”, com tradução de José Almino, David Rabe retrata situações mediadas por avanços tecnológicos e banalização da violência. “É uma reflexão bem-humorada sobre as relações humanas em tempos de internet e celular, em que a comunicação é mais rápida e menos profunda”, diz o ator Bruce Gomlevsky, que contracena com Marcos Azevedo, Ludmila Rosa e outros.

Interpretado por Débora Duboc, acompanhada ao piano por Lincoln Antonio, “Espírito da Terra”, no galpão 2, é baseado no cancioneiro tragicômico de Wedekind (1864-1918), de tintas sociais e eróticas (não por acaso, a cenografia remete a um açougue). No entrecho, sob tradução de Christine Röhrig, há a história de uma mulher que “perdeu seu coração”. O espetáculo fez pré-temporada em 2000, no Sesc Anchieta, quando Duboc estava grávida.

Autor recorrente na história do Ventoforte, Lorca (1898-1936) é revisitado por meio de “Bodas de Sangue”, finalmente incorporado ao repertório, um sonho de Krugli. Extraído de episódio real, o enredo trata de triângulo amoroso com desfecho trágico: no dia do casamento, camponesa foge com um antigo amor.

Primeira montagem do Ventoforte, “História de Lenços e Ventos” (1974) recorre a bonecos, panos, latas, instrumentos musicais e outros objetos inesperados. Narra as aventuras de Azulzinha (um lenço) e seu amigo Papel (um pedaço de jornal). Eles enfrentam o poder opressivo do Rei Metal Mau. Ambientada nos quintais mágicos da infância, a fábula escrita por Krugli fala de liberdade, vontade de voar, crescer e conhecer novos horizontes.

Esta reunião de cinco atrações pode ser encarada como um compasso de espera para os seis anos do Sesc Belenzinho, a serem completados oficialmente em janeiro.

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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