Folha de S.Paulo
4.4.2005 | por Valmir Santos
São Paulo, quinta-feira, 04 de abril de 2005
TEATRO
Com humor e música, ator destrincha crise no palco
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
Quando a vida sai do eixo, desconfie. Poderia ser pior. A conta de gás atrasada, por exemplo, salva o sujeito que leva a cabeça ao forno pensando em partir desta para uma melhor. A tentativa de suicídio e o providencial corte do fornecimento jogam o protagonista de “O Rei dos Escombros” para uma realidade diferente da sua -abandonado pela mulher, sem emprego, cheio de dívidas.
No monólogo, que estréia hoje no Espaço dos Satyros, o ator Ricardo Petraglia vai da queda à ascensão de Mauro Ricardo, seu alter ego. “É da queda à estagnação”, corrige Petraglia, 54. “O personagem não ascende. Começa a entender que não existe mágica. O cara colhe o que planta.”
Com 35 anos de palco, o ator exorciza o gosto amargo de crise que ele mesmo atravessou anos atrás. O sofrimento deu lugar ao humor e à música, na melhor escola da contracultura dos anos 70 (foi vocalista de conjuntos como Joelho de Porco, Sindicato, Mistura Fina e Careca e Penteado, este de “música pornográfica”).
Petraglia convidou o poeta Mauro Santa Cecília e a cineasta Ana Paula Maia para costurar a dramaturgia a seis mãos. Incorporou composições de Frejat, Dé Palmeira, Nani Dias e Ezequiel Neves (com interpretações de Frejat, Seu Jorge e Dé Palmeira). Daí a definição de que se trata de um “monólogo rock”, como disse Neves sobre a montagem carioca que estreou em junho de 2003.
A curta temporada paulistana (quatro segundas) firma parceria com o grupo Cemitério de Automóveis em plena sede dos Satyros, grupos cujos repertórios sintonizam com o universo de marginalizados, inclusive por livre arbítrio. “Considero-me irmão de sangue dessa gente que faz teatro sem frescura”, diz Petraglia, paulistano radicado no Rio.
Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.