Folha de S.Paulo
23.9.2005 | por Valmir Santos
São Paulo, sexta-feira, 23 de setembro de 2005
TEATRO
Fim das oficinas e aumento no preço do ingresso geram queixas em edição com peças do Volksbühne, Peter Brook e grupos latinos
VALMIR SANTOS
Enviado Especial a Porto Alegre
Produtor e diretor teatral Luciano Alabarse quer marcar a coordenação da 12ª edição do Porto Alegre em Cena, festival que vai até domingo, como uma espécie de volta triunfal após três anos de afastamento, ele que encabeçou o evento da 1ª à 8ª edição, sempre sob governo do PT, e saiu em 2001 por desentendimentos com a gestão anterior.
O retorno, sob a gestão do PPS, causa algumas surpresas. A começar pelo bolso dos espectadores. Durante os seis dias em que esteve no festival, até a última segunda-feira, a reportagem ouviu queixas nas filas sobre o preço dos ingressos, a R$ 20. No ano passado, custavam R$ 10 (tel. 0/ xx/51/ 3253-2995 ou pelo site www. poaemcena.com.br).
Ao lado de outros eventos que nasceram de iniciativas públicas, como o Festival Internacional de Teatro Palco & Rua de Belo Horizonte, Porto Alegre tem tradição de incentivo ao acesso. Criou-se inclusive uma “cultura” dos sem-ingressos, que postavam-se à entrada do teatro na esperança de conseguir um lugar. Hoje, tais filas estão proibidas, mesmo quando sobram lugares.
“Eu não quero fazer demagogia, Assim como há a parte da prefeitura e dos patrocinadores, preciso da receita do público”, diz Alabarse (o orçamento é de R$ 2 milhões). Segundo ele, de cada 100 ingressos vendidos, 97 tiveram desconto de 50%.
“Os espetáculos estão com casa cheia”, diz o coordenador. Nem todos. No final de semana, sessões de “Eletronic City” (Chile) e “Verissimilitude” (Brasil/Inglaterra) tinham menos da metade da platéia. Em contrapartida, diz Alabarse, abriu-se sessão extra para o solo de Celso Frateschi, “Sonho de um Homem Ridículo”, que terá dobradinha amanhã. Ocorreram dois cancelamentos, “No Retrovisor” (“por problemas técnicos”) e “Pólvora e Poesia” (porque o ator grava telenovela).
Nos bastidores, a Folha apurou que parte da classe teatral reclama da suspensão do Aquecendo em Cena, duas semanas de oficinas que precediam o festival.
“É uma falsa polêmica”, diz Alabarse. Ele nega que as oficinas foram cortadas. Seis delas estão na programação paralela. No Aquecendo em Cena 2004, eram 16.
América do Sul
Apesar de certo anticlímax, a volta de Alabarse de fato imprime sua vocação para pinçar nomes fundamentais da cena européia (o “Dias Felizes”, de Peter Brook, o “Endstation Amerika”, de Frank Castorf/Volksbühne, e “mPallermu”, de Emma Dante). E, principalmente, a rara determinação em acolher a produção de países vizinhos (seis espetáculos do Uruguai, cinco da Argentina, três do Chile e um da Colômbia).
A vitalidade do teatro sul-americano é demonstrada em montagens como “Caníbales”, exibido na semana passada. O impactante e poético texto do búlgaro George Tabori é encenado pelo uruguaio Alberto Rivero (cia. Comédia Nacional). E “Afuera”, que estréia amanhã, vindo do Festival Internacional de Buenos Aires. O argentino Gustavo Tarrío também assina a dramaturgia cimentada em espaço, corpo e palavra.
Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.