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Folha de S.Paulo

Jô Soares volta ao palco

4.3.2006  |  por Valmir Santos

São Paulo, sábado, 04 de março de 2006

TEATRO 
Apresentador e romancista dirige a peça “Ricardo 3º”, que estréia em maio em SP; tragédia política de Shakespeare também será encenada por Roberto Lage 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Há algo de arquetípico na história do homem que pisa muitos pescoços para escalar o poder e, chegando lá, oferece seu reino em troca de um cavalo, numa vã tentativa de escapar da morte. Acaso ou sinais do tempo, São Paulo assistirá em maio a duas estréias da tragédia “Ricardo 3º”. A peça de William Shakespeare (1564-1616) será dirigida por Jô Soares (com Marco Ricca no papel-título), no teatro Faap, e por Roberto Lage (com Celso Frateschi), no Ágora.

“Se Hamlet fica no “ser ou não ser”, Ricardo 3º é”, diz Jô Soares, 68, referindo-se à convicção com que o duque conspira na sangrenta luta pela coroa de rei na Inglaterra do século 16, quando o tabuleiro feudal era movido por bispos, juízes, chanceleres, lordes e chefes militares, além da realeza.

Shakespeare escreveu a peça entre 1592 e 1593, quando estava na casa dos 28, 29 anos. Antes de criar suas tragédias mais conhecidas, como aquela do príncipe dinamarquês ou “Macbeth”.

No texto que pertence à fase dos dramas históricos, o autor inglês retratou a vida de Ricardo 3º (1452-1485), cuja subida ao trono foi marcada por atos de violência. A peça capta os traços individuais de reis e usurpadores, de guerras e carnificinas que costuram os viciosos ciclos da história da humanidade, vide o século 20.

“Ricardo 3º relaciona-se com os demais usando faces humanas para cada um deles: a política, a social, a solitária. E isso nos assusta ainda hoje porque é assim que somos”, afirma Frateschi, 54.

Depois de cometer ou ordenar assassinatos, inclusive do irmão e de sobrinhos, deixando pelo menos 11 cadáveres no caminho, Ricardo 3º consente reinar “em nome do povo e de Deus”. Mais perverso, impossível. Acaba enredado na própria armadilha.

Dizendo-se à vontade na direção de uma tragédia, o humorista, apresentador e romancista Jô Soares ri quando afirma que existem outros “Ricardos” no Brasil, mas cuida em não fazer qualquer alusão à política contemporânea.

Jô traduziu e adaptou a peça. Na outra montagem, Frateschi assina a adaptação. Em comum, cortes em referências históricas e personagens -são 48 no original. Jô colocará em cena 15 atores, entre eles, além de Ricca, Denise Fraga, Glória Menezes, Ary França, Ilana Kaplan, Marcos Suchara, Maurício Marques e Roney Fachini.

Frateschi vai contracenar com 13 atores, entre eles Jairo Mattos, Renata Zhaneta, Bel Teixeira, Anahi Rubin e Plínio Soares.

“Ricardo 3º” é um dos textos de Shakespeare mais montados lá fora e raramente visto por aqui -Yara de Novaes fez sua versão em 1999, com a mineira Cia. Odeon. E já foi levado ao cinema com sucesso por Laurence Olivier (1955) e Al Pacino (1996). 

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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