Menu

Folha de S.Paulo

Grupos levam ao palco as misérias de Máximo Gorki

10.9.2006  |  por Valmir Santos

São Paulo, domingo, 10 de setembro de 2006

TEATRO 

Autor russo é encenado nas peças “Ralé Ainda Pulsa”, em prédio em ruínas no centro, e “A Mãe”, no Fábrica SP
 

Raramente visto no Brasil, espetáculo “A Mãe” é adaptação feita por Bertolt Brecht para o romance homônimo de Gorki

 
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Um escritor que assina “Minha Triste Infância” dificilmente olhará o mundo com condescendência. Foi com esse título que Máximo Gorki (1868-1936) lembrou seus primeiros anos de vida.

Na literatura e no teatro, sua escrita sempre diz respeito à miséria material e humana. Duas peças em cartaz refletem isso ao mergulhar no modo realista com que o russo Gorki encarava a sobrevivência e a convivência em sociedade.

No Teatro Fábrica São Paulo, o Núcleo 2 monta “A Mãe”, adaptação de Bertolt Brecht para o romance homônimo de Gorki raramente vista no Brasil, num espaço cenográfico conformado em uma arena.

Já o grupo de Teatro Meio transpõe a ação de “Ralé Ainda Pulsa”, peça baseada em “Ralé” (ou “No Fundo”), de Gorki, para São Paulo em uma triste atualidade, segundo os criadores: a do Castelinho, como é chamada a construção de 1912, ora decadente, na rua Apa, região central.

“Nossa opção foi menos pela idéia de encenar em um espaço alternativo simplesmente e mais pela vontade de provocar o espectador -o de classe média, de um modo geral- com as cores, texturas e cheiros desse mundo de miséria, tão próximo de nós e numeroso, e ao mesmo tempo, como diz o texto [de Gorki], tão ignorado: “As pessoas se acostumam com a pobreza e nem olham mais'”, afirma o diretor do espetáculo, Alex Brasil, que também assina a adaptação.

Cortiço
Dentro do Castelinho, conta Brasil, foi montado um cortiço. “Exatamente igual a diversos cortiços visitados na região. O próprio Castelinho já foi um, de fato, quando ainda tinha teto”, diz o diretor. “O público entra nesse cortiço e sente, por uma hora e quinze minutos, a pulsação de vida que ainda resiste dentro dele.”

Ainda de fora do Castelinho, antes do início do espetáculo, o Teatro Meio exibe um vídeo de oito minutos que condensa a pesquisa realizada em áreas miseráveis da cidade.

Considerado uma das obras-primas de Gorki, “A Mãe” promove diálogo sintomático entre o autor russo e o alemão Brecht (1898-1956). “O romance de Gorki vai até 1905, um dos anos mais violentos da história da Rússia, que ele viveu in loco, quando milhares de camponeses morreram em luta por terra, e várias greves foram deflagradas”, afirma Sérgio Audi, diretor de “A Mãe”. “Brecht vai lá, ressuscita a personagem e amplia a trajetória da Mãe até 1917, ano da Revolução Russa.”

Gorki teria tomado como inspiração a trajetória de uma mãe de operário que liderou um movimento de conscientização social naquele início de século 20. 

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

Relacionados