Folha de S.Paulo
29.9.2007 | por Valmir Santos
São Paulo, sábado, 29 de setembro de 2007
TEATRO
Autor co-dirige texto inédito sobre disputa entre “morador” de rua e idosa
Com dois personagens, um banco e uma praça, Arap diz evocar “Dois Perdidos” de Plínio Marcos, e “Zoo Story”, do americano Edward Albee
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
No sábado passado, Fauzi Arap ligou para a Folha para comunicar a morte do dramaturgo José Vicente, a quem atribui influência decisiva na sua escrita para teatro, bem como a Plínio Marcos (1935-99). São autores que dirigiu ou atuou em peças dos anos 60.
Uma semana depois, o paulistano Arap, 69, estréia o texto inédito “Chorinho”, de 2006, e reintroduz uma das máscaras com as quais embaralha os ofícios no teatro há 46 anos, nunca fixando-se numa função. “Chorinho” tem co-direção dele com Marcos Loureiro (o mesmo de “Hotel Lancaster”, de Mário Bortolotto) e cumpre temporada no Espaço Parlapatões, na praça Roosevelt.
Com dois personagens, um banco e uma praça, Arap diz evocar “Dois Perdidos Numa Noite Suja”, de Plínio Marcos, e mais especificamente “Zoo Story”, do norte-americano Edward Albee, 79.
Se nesta última dois homens desconhecidos digladiam-se pelo espaço de um banco, metáfora de suas diferenças sociais, em “Chorinho” o território de disputa é estendido à praça em si. Bom que se diga: o enredo não tem nada a ver com a Roosevelt tão cortejada nos dias atuais.
A aposentada solteirona (Claudia Mello) e o “morador” de rua (Caio Blat) são freqüentadores do local e têm seus estranhos mundos postos em rota de colisão. Ela quer ficar em paz, ele tenta se aproximar. Ele é vegetariano, mas ela só descobre quando lhe traz um bife.
“É uma disputa surda, invisível, que alimenta a peça de forma continuada, como se a praça fosse personagem”, diz Arap.
Seguem-se sete quadros que oscilam tentativas de aproximação e rejeição, dramas e humores. Outros tipos orbitam os protagonistas por meio dos diálogos, sem que apareçam: a terapeuta dela, um delegado, os travestis e ladrões noturnos etc. “Está em debate também certa miserabilidade da vida e das relações contemporâneas.”
Arap se diz entusiasta das atuações de Mello, com quem já trabalhou, dona de “algo de chapliniano na sua forma de atuar”, e Blat, que atuou há pouco em outro texto seu, “O Mundo É um Moinho”, no Rio.
Autor bissexto, guarda outros textos inéditos na gaveta, entre eles “Mata no Peito e Chuta”. Fala de um jogador do Corinthians seqüestrado na véspera de uma decisão por um torcedor fanático do time que o mantém num barraco, indignado com o pragmatismo mercantilista em voga no futebol. Fauzi Arap é são-paulino.
Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.