14.12.2006 | por Valmir Santos
São Paulo, quinta-feira, 14 de dezembro de 2006
TEATRO
As cias. dos Atores e Os Satyros têm publicadas suas trajetórias em torno da experimentação cênica e dramatúrgica
Os Satyros contou com um integrante jornalista para relatar sua história; a cia. carioca organizou visões de atores e pesquisadores
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
O teatro brasileiro contemporâneo ainda está aquém da maioridade editorial. Mas a cultura de teatro, cultura de ler e ver, tenta cada vez mais transcender à cena. Um dos indícios é a convergência de lançamentos de livros sobre dois importantes grupos de teatro do país, um do Rio de Janeiro e outro de São Paulo: “Na Companhia dos Atores – Ensaios Sobre os 18 Anos da Cia. dos Atores” e “Os Satyros – Um Palco Visceral”.
São publicações que reafirmam a importância do movimento de teatro de grupo no Brasil, dos anos 90 para cá. O registro é parte inerente da criação e da reflexão.
Edição conjunta da Aeroplano e da Senac Rio, “Na Companhia dos Atores” foi organizado por Enrique Diaz (ator e diretor), Fabio Cordeiro (co-diretor) e Marcelo Olinto (ator e figurinista). Com projeto gráfico caprichado, cujas imagens dialogam com a inquietação e a irreverência características da história da companhia, o livro procura dimensionar a importância desse agrupamento de artistas na cena carioca dos últimos anos. E o faz não apenas pela voz dos seus integrantes, mas amparado em pontos de vista, às vezes dissonantes, de pesquisadores como Clóvis Dias Massa, Cristina Ribas, Fátima Saadi, Silvana Garcia e Silvia Fernandes.
O olhar retrospectivo não surge de modo linear, mas entrecortado por depoimentos, ensaios e sobretudo fotografias dos espetáculos, imagens que têm igual peso na narrativa.
Na introdução, Diaz inicia sua “fala” com reticências, sinal de que a “obra aberta” é uma das premissas. É divertido o relato da peça de origem, “Marat/Sade” (1988), livre adaptação da obra de Peter Weiss, erguida “com três atores, cinco refletores de 500 W, uma piscina tony com um pano preto para disfarçar o azul do plástico. E um guitarrista convidado. E pijamas. E era bom”.
Ainda que fruto da reunião de amigos interessados em pesquisar algumas coisas sobre pessoas que admiravam sem as conhecer, como os pensadores e criadores de teatro Tadeusz Kantor, Bob Wilson e Meyerhold, a base teórica não era tratada com displicência, nunca foi; fazia parte do jogo que vai dar em concepções bem-sucedidas, como nas visitas à obra de Oswald de Andrade, “nosso parceiro e referência”, “permanente coringa das artes e das letras”, na voz de Diaz: “A Morta” (1992) e “O Rei da Vela” (2000).
Ou a obsessão pela realidade da cena, no “duelo” entre a pesquisa e o como trazê-la a público, embates das inquietantes montagens de “A Bao A Qu -Um Lance de Dados” (1990), “Melodrama” (1995) e “Ensaio.Hamlet” (2004).
Praça Roosevelt
A Companhia de Teatro Os Satyros ruma para os 18 anos, em 2007, com forte presença na cena da cidade de São Paulo.
Radicada há cinco anos na praça Franklin Roosevelt, região central, transformou a geografia humana local sobretudo pelo vetor da arte do teatro. São dois espaços com programações de segunda a segunda, abertos a outros grupos. Predominam as peças de caráter experimental no texto, na direção ou na interpretação.
Em “Os Satyros – Um Palco Visceral”, que sai pela Imprensa Oficial (coleção Aplauso), o jornalista, crítico e ator Alberto Guzik reconta a história do grupo dando voz a seus fundadores, o diretor Rodolfo García Vázquez e o ator Ivam Cabral.
“A palavra fica na boca do Rodolfo e do Ivam, na forma de uma longa conversa em que procurei ficar o mais invisível possível”, diz o autor, há três anos integrado ao elenco. Entre as montagens marcantes de Os Satyros, grupo também de Curitiba, estão “Sades ou Noites com os Professores Imorais” (1990), depois “Filosofia na Alcofa”, cuja remontagem está em cartaz; “Antígona” (2003); e “A Vida na Praça Roosevelt” (2005). A mesma Imprensa Oficial lança “O Teatro de Ivam Cabral – Quatro Textos Para um Teatro Veloz” (R$ 15, 280 págs.), onde o ator mostra sua face de dramaturgo.