12.5.2007 | por Valmir Santos
São Paulo, sábado, 12 de maio de 2007
TEATRO
Diretor, em cartaz em São Paulo, fala em co-criação das peças pelo público e interseção entre as artes e as tecnologias
Após 18 anos na estrada, Cia Teatro Autônomo pretende, até o início de 2008, encenar um espetáculo novo e ainda retomar outro, de 2005
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
São 18 anos feito Sísifo, começando tudo de novo a cada espetáculo. É uma imagem pertinente à Cia Teatro Autônomo, que caminha na contramão do teatro carioca desde que levou à cena, em 1989, uma leitura do mito grego que empurra um rochedo montanha acima, num trabalho interminável.
“Apesar do cansaço, o retorno é genuíno”, afirma o diretor Jefferson Miranda, 45, que usa e se orgulha do termo “contramão”, acima.
As perguntas seminais permanecem: “Para onde vai o teatro hoje? Que lugar ele ocupa no mundo?”.
Sabe-se que alcançar essas respostas equivaleria a pisar no pico da montanha, mas Miranda e o núcleo de artistas da Cia Teatro Autônomo seguem no encalço delas.
A última passagem do grupo por São Paulo ocorreu dois anos atrás, com a elogiada “Deve Haver Algum Sentido em Mim Que Basta” (2004).
Miranda volta à cidade a partir de hoje, mas não com o seu coletivo: ele é o diretor convidado de “O Perfeito Cozinheiro das Almas Deste Mundo”, que estréia na Unidade Provisória Sesc Avenida Paulista.
Para o final deste ano ou início de 2008, é desejo da Cia Teatro Autônomo trazer o seu último espetáculo, “E Agora Nada é Mais Uma Coisa Só” (2005), bem como o inédito “Nu de Mim Mesmo”.
“E Agora Nada é Mais Uma Coisa Só” é definido como “espetáculo-evento”, uma experiência em espaço não-convencional. Lembra vídeoinstalações, com espectadores percorrendo cinco áreas. A idéia é pôr em xeque a noção de realidade.
“Partindo de situações rotineiras, quando o mundo se apresenta em sua superfície corriqueira e banal, o espetáculo foca esse caráter múltiplo por meio das silenciosas revelações que podem nos assaltar inesperadamente no meio do nosso dia mais comum”, afirma o diretor.
Uma das premissas da companhia é encarar o teatro como um fenômeno. “Em contraposição ao “drama” , entendido como representação idealizada, apartada do atributo fundamental da arte cênica: o tempo “presente”.”
Co-criadores da cena
Outra perspectiva é destinar ao espectador o papel de co-criador da cena. Fala-se em “inclusão da escuta”, ou seja, em incorporar a história pessoal do espectador. Isso é radicalizado, segundo explica Miranda, no espetáculo atualmente em criação, “Nu de Mim Mesmo”, décima produção.
“A finitude das ações humanas, heróicas ou não, é o tema central. O que resta delas? O que vem depois? Somente a memória? Ou exclusivamente o silêncio, como Hamlet certa vez afirmou?”, tateia o diretor.
Arte e tecnologia
Com este projeto amplia-se também a interseção entre as artes e as tecnologias. “Pelo cruzamento e sobreposição de linguagens -teatro, performance, artes plásticas, vídeo, espacialização sonora etc-, propomos repensar os cânones do fazer teatral, em busca de uma escritura cênica que inclua os meios pelos quais o homem de hoje se expressa -e que o expressam”, teoriza.
O núcleo da Cia Teatro Autônomo é formado ainda pelo dramaturgo Flavio Graff, pelo desenhista de luz Renato Machado, pelo diretor musical Felipe Storino e pelos atores Adriano Garib, Diogo Salles, Gisele Fróes, Julia Lund, Malu Galli e Otto Jr.
“Quando a gente começou, havia a ditadura da encenação no teatro brasileiro. Hoje, estamos libertos”, conclui Miranda.