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“Iyá ilu"

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Resenha

No início, há apenas a voz ─ e essa voz é. Em seguida, a voz escolhe um corpo para habitar: o corpo de uma mulher negra. E esse corpo também é. Assim, em Vaga carne, tanto a peça (2018) de Grace Passô quanto o média-metragem (2019) codirigido por ela e por Ricardo Alves Jr., voz e corpo ora se fundem, ora se confundem, se conformam e se confrontam. Toda uma história se narra nas modulações, nos tons, nos ritmos da voz ─ e em seus silêncios. O íntimo e o coletivo permeiam cada gesto, cada movimento do corpo, cada pequena coreografia ─ e suas pausas. Em sua performance, Passô mobiliza também o invisível e o indizível. Assistimos ao encontro entre voz e corpo no agora da encenação, mas as experiências que ambos carregam não se limitam ao tempo linear ou cronológico. Por fim, o desconcerto: o que vai ser do corpo, daquele corpo, quando a voz se desgrudar dele?

Vaga carne é um dos espetáculos citados pela poeta, ensaísta, dramaturga e professora Leda Maria Martins em Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela (Cobogó, 2021), como exemplo das criações artísticas brasileiras que têm reconfigurado a representação do negro em cena. Trata-se de um repertório crescente de poéticas, que, por meio de ousados procedimentos e elaborações estéticas, afirmam as corporeidades negras como episteme, exercitando uma memória cultural que atualiza acervos cognitivos e performáticos de matrizes africanas e afro-brasileiras. Um aporte urgente e fundamental para a cena teatral (e política) brasileira, que em muitos momentos ainda se revela resignada diante de narrativas desgastadas, modos de produção excludentes ou exclusivistas, estruturas colonialistas e racistas etc.

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