9.10.2005 | por Valmir Santos
São Paulo, domingo, 09 de outubro de 2005
TEATRO
“Jung, Sonhos de uma Vida”, “Divã” e “Segredo” usam base em legado de Freud para enveredar pelos mistérios da alma
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
Pode soar redundante buscar um extrato psicológico no teatro quando é de sua natureza desmascarar humanidades em comédias, dramas, tragédias e variantes. Mas a temporada atual apresenta pelo menos três peças que se aproximam dos ditos mistérios da alma à moda do legado de Sigmund Freud (1856-1939).
O espectador se depara com a vida de um grande discípulo e dissidente de Freud em “Jung, Sonhos de uma Vida”, em cartaz no Espaço Promon; compartilha revisões pessoais de uma mulher em plena crise dos 40 anos em “Divã”, no teatro Faap; e vê o depoimento pessoal dos 17 atores de “Segredo”, no Tusp (veja ao lado).
Segundo o ator Jayme Periard, 44, no papel-título de Jung, a intenção é “mostrar o homem em suas contradições e buscas, não só científicas, mas espirituais, já que na infância ele teve experiências mediúnicas”. A tônica é de uma pessoa simples, amante das artes e de outras ciências.
O psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961) desenvolveu, com Freud, as primeiras teorias psicológicas fundamentadas no inconsciente. A dramaturgia é assinada pela psicóloga e escritora Eliana Zuckermann, que tomou como base o livro “Memórias, Sonhos e Reflexões”, de Jung.
O ponto de partida é uma entrevista que Jung concedeu aos 86 anos, a idade em que morreu. A conversa com uma jornalista o leva à relação com os pais, pacientes e as mulheres que amou (a mãe, a mulher, a amante e a filha).
Em busca de casar palavra e emoção, o diretor Rogério Fabiano pretende colocar em primeiro plano atitudes ou sentimentos como coragem, inteligência e sensibilidade. Em sua opinião, não é preciso entender de psicanálise para compreender o espetáculo.
Em “Divã”, Lilia Cabral vive Mercedes, a protagonista do romance de mesmo nome da gaúcha Martha Medeiros. Trata-se de uma quarentona casada, com dois filhos, vida estabilizada, que resolve procurar um analista.
A curiosidade transforma-se numa experiência devastadora. Surgem várias faces dela: a discreta, a apaixonada, a ciumenta, a sensual etc. Somam-se as figuras do marido e da melhor amiga, como a sugerirem contrapontos.
Em “Segredo”, o grupo Tusp apresenta a sua terceira incursão pelos quatro elementos: “Horizonte” (2000) elegeu a água; “Interior” (2002), a terra. Agora, o ar serve à metáfora daquilo que está “invisível”. O elemento fogo terá lugar em projeto para 2006.
Histórias vividas pelos atores costuram a dramaturgia, uma sucessão de quadros que tratam de amor, fé, sexualidade, família, violência, solidão e esperança.
“Não se trata de expor a intimidade das pessoas como fenômeno contemporâneo de comunicação”, diz o diretor Abílio Tavares. Ele quer dar conta dos sentimentos mais profundos das pessoas, despertando nelas o desejo de mudança. O grupo contou com assessoria terapêutica e fez um retiro na serra da Mantiqueira.