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Folha de S.Paulo

Peça “Sete contra Tebas” antecipa cenário de disputas pelo poder

2.10.2004  |  por Valmir Santos

São Paulo, sábado, 02 de outubro de 2004

TEATRO 
Inês Aranha encena no Ágora tragédia de Ésquilo 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

A sedução pelo poder está na gênese das tragédias. Isso não era tão elementar há 2.500 anos, quando a democracia venceu a tirania na Grécia.

Tido como “o pai das tragédias”, por introduzir o diálogo e o coro, o poeta Ésquilo cravou em “Sete contra Tebas” mais um tento da desesperança característica de seu teatro. É a história da disputa de governo por dois irmãos. Eles vão à guerra, matam-se e levam de roldão os seguidores. A cidade é empapuçada de sangue pois fora conduzida assim por seres gananciosos.

Sintomático que uma nova montagem de “Sete” vá ao cartaz hoje, véspera de eleições. “Os candidatos se digladiam, mas os contribuintes, os cidadãos, são sempre os últimos contemplados”, diz a atriz e bailarina Inês Aranha, 38, que assina o novo espetáculo em temporada no Ágora. Ela diz que a data da estréia foi escolhida ao acaso. Com formação na Itália, ela já foi dirigida por Roberto Bacci, Antunes Filho, Eduardo Tolentino de Araújo e Roberto Lage.

“Sete” resulta de dois anos de trabalho da diretora com um conjunto de atores-criadores então integrantes da recém-nascida cia. Areópago. No palco, seis atrizes e três atores passam o tempo todo em cena. Aranha elege o coro como eixo do espetáculo. É a partir dele que desponta Etéocles, que governa Tebas e não quer largar o cargo, rompendo acordo com o irmão Polinices. Este arregimenta um exército estrangeiro para tomar as sete portas da cidade, ao lado de outros seis generais.

Na concepção de Aranha, o enredo que culmina em terror é apoiado na “partitura” de ações físicas, ainda que sob a estrutura narrativa. Não há, diz ela, cena da guerra com tratamento cinematográfico. A opção é por uma simbologia “tribal”, a condição animal dos protagonistas, com excertos africanos e indígenas presentes na cenografia e nos figurinos criados por Adriana Vaz.

O espetáculo partiu do texto traduzido pelo pesquisador Donaldo Schüler. A dramaturgia ganhou tratamento de Maucir Campanholi e de Inês Aranha.

Foi agregada a figura do rei Creonte, com ênfase na passagem em que o mensageiro comunica que o corpo de Etéocles será enterrado como herói, enquanto o de Polinices será expatriado.

Também foi pinçado trecho euripidiano de “As Fenícias”, quando Jocasta discorre sobre a amaldiçoada sina familiar. Chave para contextualizar o espectador: Etéocles e Polinices são filhos de Édipo, aquele que matou o pai, Laio, depois que identificou na esposa, Jocasta, a sua mãe. Tudo por contrariedades aos oráculos. Tudo por contradições humanas na pólis de ontem e de hoje.
 



Sete contra Tebas.
De: Ésquilo (525-456 a.C.). Tradução: Donaldo Schüler. Direção: Inês Aranha. Iluminação: Carmine D’Amore. Com: cia. Areópago (Alessandra Esteves, Bia Toledo, Claudia Campos, Gabriela Lois, Manfrini Fabretti, Rene Ramos, Sun Ra, Tieza Tissi e Venâncio Mortez). Quando: estréia hoje, às 21h; sáb., às 21h; dom., às 20h. Onde: teatro Ágora (r. Rui Barbosa, 672, tel. 3284-0290). Quanto: R$ 15. Até 12/12.

 

Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.

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