Folha de S.Paulo
26.10.2005 | por Valmir Santos
São Paulo, quarta-feira, 26 de outubro de 2005
TEATRO
Pesquisadora organiza textos diversos do intelectual italiano que influenciou a modernização dos palcos nacionais
VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local
Dentre os artistas europeus que imigraram para o Brasil nos anos 40 e 50, o italiano Ruggero Jacobbi conciliou, como poucos, reflexão teórica e gesto criador, sobretudo em seu campo dileto, o do teatro.
O veneziano Jacobbi (1920-1981) “fez a cabeça” da geração formada ideológica e esteticamente no processo de modernização do teatro brasileiro, diz a pesquisadora Alessandra Vannucci, que organizou “Crítica da Razão Teatral – O Teatro no Brasil Visto por Ruggero Jacobbi”.
O livro reúne ensaios, críticas, resenhas ou notas que o intelectual publicou durante seus 14 anos de Brasil, entre 1948 e 1962, em periódicos como “Folha da Noite” (1952-56) -que posteriormente se fundiu à “Folha da Manhã” e à “Folha da Tarde” e deu origem à Folha- e “Última Hora” (1951-53).
A obra sai em parceria da seção São Paulo do Istituto Italiano di Cultura com a Perspectiva, a mesma do alentado estudo teórico-biográfico “Ruggero Jacobbi” (2002), de Berenice Raulino.
Na Itália, a obra de Jacobbi é revisitada. Recentemente, foram lançados seis livros de ou sobre ele. No ano que vem, virá à luz sua poesia, face menos conhecida.
“Crítica da Razão Teatral” tem lançamento hoje, no CCBB do Rio, em mesa-redonda com o ator Sérgio Brito, a professora da Uni-Rio Tânia Brandão e Vannucci, 37. Abaixo, trechos da entrevista com Vannucci.
TEATRO DO DIRETOR – Jacobbi veio ao Brasil dentro de uma missão geracional: a instalação do teatro do diretor como paradigma de modernidade. Mas Jacobbi, que se dizia “um literato de passagem pelo teatro, só que esta passagem durou quase uma vida inteira”, escolhia o palco pela sua instância social que poderia compensar a “fundamental irresponsabilidade dos literatos”.
POSTURA MILITANTE – Com espírito pioneiro e atuação antiparadigmática, Jacobbi buscou soluções de subsistência e cânones alternativos para a modernidade no Brasil na fase em que, diversamente da Itália, a indústria do espetáculo se implantava já em moldes vinculados ao consumo de massa. Essa percepção política motiva sua atuação crítica, assim como sua prática de direção sempre ao contextualizar a obra e ao investigar as conexões entre fatos da cultura e territórios reais que ele percorre no dia-a-dia da metrópole: porque em teatro “não se trata de dar vida a coisas mortas, mas de ver se ainda estão vivas”.
Uma postura militante que o levou a professar “heresias” como a de preferir um bom samba a qualquer delírio dodecafônico, um belo vaudeville a uma metafísica peça de vanguarda e, principalmente, a recusar o “cetro” da direção na década que consagra a primazia do teatro do diretor sobre o velho sistema estrelar.
CRÍTICA E CRIAÇÃO – Jacobbi surge não somente como diretor de teatro, cinema e televisão, mas também, simultaneamente, como crítico, professor, jurado, tradutor, dramaturgo, espectador profissional (comandando as palmas) e, ainda, poeta (inédito) pelas “virtudes” de uma implacável insônia. Jacobbi exercia a crítica como a melhor ferramenta de intermediação orgânica entre intelectual e sociedade.
Jornalista e crítico fundador do site Teatrojornal – Leituras de Cena, que edita desde 2010. Escreveu em publicações como Folha de S.Paulo, Valor Econômico, Bravo! e O Diário, de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Autor de livros ou capítulos afeitos ao campo, além de colaborador em curadorias ou consultorias para mostras, festivais ou enciclopédias. Cursa doutorado em artes cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde fez mestrado na mesma área.