Reportagem
10.2.2014 | por Helena Carnieri
Foto de capa: Divulgação
O Festival de Teatro deste ano será um prato cheio para amantes de Shakespeare, no ano em que se comemora 450 anos do nascimento do bardo inglês. E apesar de duas montagens internacionais trazerem encenações bastante peculiares para Otelo e A violação de Lucrécia, o fato de haver duas propostas nacionais e bastante diferentes entre si para Ricardo III é que faz levantar as sobrancelhas dos mais aficionados.
“É uma super oportunidade para o público perceber a peça”, comemora a professora de literatura da UFPR Célia Arns de Miranda.
A primeira encenação, com apresentações nos dias 27 e 28 de março, integra a tradição de transformar uma peça com diversos personagens em um monólogo, proposta que já rendeu momentos históricos como o Hamlet interpretado por Robert Wilson e o passeio pelos vilões do bardo feito pelo ator inglês Steven Berkoff.
Quem chega a Curitiba neste festival é o ator Gustavo Gasparani, que já recriou e interpretou o vilão Iago em Otelo da Mangueira (2006). “Me sinto como uma criança num playground”, definiu Gasparani à Gazeta do Povo. Munido de um quadro escolar e algumas canetas, ele alterna registros para evidenciar os momentos em que o assassino rei Ricardo está em cena – quando fala em versos. Já quando encarna outros 20 personagens ou simula a interação com eles, fala em prosa.
Para o ator, a tradução escolhida, de Anna Amélia Carneiro, é responsável pela grande clareza com que o intrincado drama histórico britânico se desenrola diante do público, mesmo que o espectador desconheça a trama de usurpações e ambição. “Ricardo III é o supremo ator, só é verdadeiro com a plateia. E isso foi enfatizado nessa montagem”, conta a professora da UFPR Liana Leão, que acompanhou o início do projeto no Rio de Janeiro. A direção é de Sergio Módena.
De São Paulo chega a segunda montagem do mesmo texto, fruto do projeto 39 Shakespeare, que pretende encenar em dez anos toda a obra do autor inglês. Nesse caso, o elenco traz 14 pessoas, incluindo a veterana atriz Mayara Magri no papel da rainha Elizabeth.
Aqui também, o diretor de produção Erike Busoni credita à adaptação do dramaturgo português Jorge Louraço a capacidade de esclarecer a trama ao espectador – “isso num enredo em que muitos personagens têm até o mesmo nome”, brinca Busoni. “Começando pelos atores, priorizamos a compreensão do que é a peça”, disse à reportagem. Com direção de Marcelo Lazzaratto, a montagem ficará em cartaz no Sesc da Esquina (assim como a versão carioca) dias 29 e 30 de março.
A primeira semana do festival será mesmo de festa para quem prioriza o teatro de Shakespeare. Ainda nos dias 27 e 28 de março, o grupo chileno Viajeinmóvil apresenta seu Otelo, uma pitoresca e delicada interação entre bonecos manipulados por atores em cena.
A fase final da mostra guarda ainda um megaprograma: uma montagem da prestigiada Royal Shakespeare Company, diretamente da Inglaterra, para The rape of Lucrece (A violação de Lucrécia), um dos dois poemas eróticos do bardo (o outro é Vênus e Adônis).
A professora Liana Leão salienta que o público interessado deve se preparar para um espetáculo misto, em que o texto foi transformado em canto, a cargo de Camille O´Sullivan (irlandesa mais acostumada a cantar Radiohead). Se a princípio a artista acreditou que precisaria rebuscar a linguagem por se tratar de Shakespeare, logo foi tragada pela beleza da escrita.
“A cada vez que estou no palco fico pensando como é incrível ele ter dito isso, e isso, e isso…”, disse a cantora em entrevista durante apresentações em um festival de Sydney, na Austrália.
Programe-se
23º Festival de Teatro de Curitiba: De 26 de março a 13 de abril. Mostra oficial: R$ 60 e R$ 30 (meia-entrada). Mostra paralela/Fringe: de entrada franca até R$ 20. Ingressos à venda nos shoppings Mueller, ParkShopping Barigüi e Palladium e pelo site www.festivaldecuritiba.com.br.
.:. Publicado originalmente na Gazeta do Povo, Caderno G, página 3, em 9 de fevereiro de 2014.
Jornalista formada pela Universidade Federal do Paraná, instituição onde cursa o mestrado em estudos literários, com uma pesquisa sobre A dama do mar de Robert Wilson. Cobre as artes cênicas para a Gazeta do Povo, de Curitiba, há três anos. No mesmo jornal, já atuou nas editorias de economia e internacional.