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Reportagem

Vem pra rua

20.4.2014  |  por Fábio Prikladnicki

Foto de capa: Fraide Raynaud

Inspirado pelos movimentos sociais que têm se avolumado nos últimos tempos, o 6º Festival Internacional de Teatro de Rua de Porto Alegre começa neste domingo (20/4) levantando a bandeira da reapropriação do espaço público. A edição do ano passado terminou no momento em que começaram a aparecer as primeiras manifestações nas ruas do país.

Vinte e oito bairros da capital receberão espetáculos, performances e intervenções urbanas até o dia 29 de abril. Como de costume, estão programadas atividades formativas, seminários e outras ações paralelas. Para Alexandre Vargas, coordenador e diretor artístico do festival, a questão que vem sendo levantada é: que cidade queremos para viver?

“As manifestações por melhores serviços públicos, transporte e saúde tratavam disso. Em Porto Alegre, temos iniciativas de valorização da cidade, como os piqueniques na Cidade Baixa, a Serenata Iluminada na Redenção, o Carnaval de rua. É um movimento que vem acontecendo no mundo todo e que ficou acentuado no Brasil.”

Em 2013, o festival se internacionalizou, com a participação de dois grupos do exterior. Para este ano, estava programada uma expansão, com cinco atrações de fora, mas a organização esbarrou na captação de verba. Serão novamente dois grupos internacionais: o francês Générik Vapeur, com o espetáculo Bivouac, e a companhia catalã de Roger Bernat, em sua segunda participação consecutiva. Desta vez, Bernat acompanhará sua trupe pessoalmente em uma releitura de A sagração da primavera, baseada na composição de Stravinsky e na coreografia de Pina Bausch.

A explicação para a redução no orçamento do festival é a mesma que a de outros eventos culturais nos últimos meses: os patrocinadores estão com olhos voltados apenas para a Copa do Mundo. O custo do festival, projetado em R$ 1,2 milhão, ficou quase pela metade: R$ 700 mil (R$ 200 mil a mais do que em 2013).

Dos cinco grupos nacionais selecionados, três são do centro-oeste: as companhias Andaime, de Brasília, e Nu Escuro e Teatro que Roda, ambas de Goiânia.

“Essa cena nunca se fez muito presente no Rio Grande do Sul. Sempre tentamos buscar um diferencial para compor a programação, desde que esteja conectado a determinados conceitos da edição”, explica Vargas.

Também participam a Troupp Pas D’argent (RJ) e a Eranos – Círculo de Arte (SC). Completam a programação 17 grupos gaúchos, representantes de uma produção cada vez mais presente no festival. Neste ano, o Rio Grande do Sul superou Minas Gerais como o segundo estado mais presente entre os 300 grupos inscritos, posto que os mineiros ostentavam em 2013 – o primeiro lugar continua com São Paulo.

O 6º Festival de Teatro de Rua presta uma homenagem póstuma ao ator, poeta e músico Caio Gomes, que integrou o Ói Nóis Aqui Traveiz, o grupo de poetas Camões Baby e a companhia Povo da Rua.

‘Os 10 mandamentos…’ segundo a Cia. Povo da Rua

Se este ano é de restrição orçamentária, uma expansão está projetada para 2015. Já estão confirmadas três atrações internacionais: a companhia francesa Kumulus, o Workcenter de Thomas Richards (discípulo do mestre do teatro Jerzy Grotowski) e o grupo australiano Snuff Puppets, que criará um espetáculo com artistas locais a ser apresentado em Porto Alegre e na Austrália.

Também ficará para o ano que vem a constituição de uma equipe curatorial composta por Alexandre Vargas, Marcelo Bones, André Carreira e Matteo Bonfitto. Por problemas de agenda, Carreira e Bonfitto ficaram fora da edição 2014, segundo Vargas, que assinou a curadoria ao lado de Bones e da Coordenação de Artes Cênicas da prefeitura de Porto Alegre.

Vargas observa que o desafio é pensar o festival com dois ou três anos de antecedência:

“Esse planejamento de longo prazo não é uma dinâmica muito comum no Brasil de modo geral. Não é uma dificuldade exclusiva do festival. A Caixa, por exemplo, é nossa patrocinadora desde o início, mas é um edital público ao qual temos que concorrer a cada ano.”

Destaques ao ar livre

Com início neste domingo (20/4), o 6º Festival Internacional de Teatro de Rua de Porto Alegre levará espetáculos gratuitos a 28 bairros da Capital até o dia 29 de abril. Seguindo o modelo de edições anteriores, o evento está organizado em quatro eixos: apresentações artísticas, atividades formativas, seminários e ações especiais como a Rodada de Negócios, que viabiliza a circulação de espetáculos locais. Confira destaques da programação.

>> Générik Vapeur
Sediada em Marselha, a francesa Générik Vapeur é uma das principais companhias de teatro de rua do mundo. Criado em 1984 por Cathy Avram e Pierre Berthelot, o grupo tem como princípio a mescla de linguagens artísticas como teatro, dança, música e vídeo. Bivouac, o espetáculo que eles trazem ao festival, evoca uma horda primitiva que agita a cidade, com os rostos pintados de azul. A encenação envolve um trio elétrico, um cachorro metálico incandescente e atores que rodam barris. As apresentações serão no dia 26, às 20h, na Rua da República com Lima e Silva, e 27, às 17h, no Parque Farroupilha, na Av. Osvaldo Aranha com José Bonifácio.

>> Roger Bernat
Presente no ano passado com Domínio público, o grupo catalão Roger Bernat retorna ao festival com uma releitura de A Sagração da Primavera, com música de Stravinsky e inspirada na coreografia de Pina Bausch – desta vez, contando com a presença do artista que dá nome à companhia. Como em outros espetáculos de Bernat, os espectadores se tornam protagonistas de A sagração…. Eles entram no espaço de encenação usando fones por meio dos quais ouvem vozes de comando. As apresentações serão no dia 27, às 19h e às 21h, no Recanto Europeu do Parque Farroupilha.

>> Atrações deste domingo (20/4)

Brasil pequeno itinerante: Com bonecos articulados em miniatura, a peça reúne histórias recolhidas pela palhaça e bonequeira Genifer Gerhardt em andanças pelo Brasil. Domingo, às 11h, na Av. Jaime Vignole s/nº (Bairro Anchieta). Apresentações seguem em diferentes locais até o dia 27.

Os mensageiros: Dois atores saltimbancos montam uma arena ao ar livre e têm a tarefa de dar vida à Poetisa Aurora e ao Poeta Benjamin no espetáculo com direção de Xica Campagna. Domingo, às 16h, na Praça Capitão Coelho, na Ilha da Pintada. Segunda, o espetáculo será apresentado às 11h, na Av. Ipiranga, Acesso 3, Rua A.

‘Cidade proibida’, criação da Cia. Rústica

>> Teatro de rua em debate

– Na terça (22/4), bate-papo de grupos locais de teatro com a companhia Générik Vapeur sobre a função social do teatro de rua e a história do teatro de rua na França, no Sesc (Alberto Bins, 665), às 19h.

– Também na terça, bate-papo “Trocando Peças”, com a Andaime Cia de Teatro e a Cia Rústica, das 15h às 18h, na sala Marcos Barreto da Casa de Cultura Mario Quintana (Andradas, 736). Logo após, às 18h, a Andaime Cia de Teatro também lança um livro-portfólio.

– Na quinta-feira (24/4), às 18h30, palestra aberta “A Filosofia nas Ruas – Anota aí: Eu Não Sou Ninguém”, com Peter Pál Pelbart, no Largo Glênio Peres.

– No dia 29, das 19h às 21h, bate-papo sobre teatro de rua Processos Contemporâneos e a Fisionomia da Cena de Rua em Porto Alegre na Sala Álvaro Moreyra (Av. Erico Verissimo, 307).

Serviço:
6º Festival Internacional de Teatro de Rua de Porto Alegre
Onde: vários espaços abertos de Porto Alegre.
Quando: 20/4 a 29/4.
Quanto: grátis.
Mais informações: http://ftrpa.com.br.

.:. Publicado originalmente no jornal Zero Hora, Segundo Caderno, páginas 1 e 3, em 18/4/2014.

Jornalista e doutor em Literatura Comparada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É setorista de artes cênicas do jornal Zero Hora, em Porto Alegre (RS). Foi coordenador do curso de extensão em Crítica Cultural da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS). Já participou dos júris do Prêmio Açorianos de Teatro, do Troféu Tibicuera de Teatro Infantil (ambos da prefeitura de Porto Alegre) e do Prêmio Braskem em Cena no festival Porto Alegre Em Cena. Em 2011, foi crítico convidado no Festival Recife de Teatro Nacional.

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