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Reportagem

Grupos vivem exposição internacional singular

29.6.2014  |  por Gabriela Mellão

Foto de capa: Pedro Langella

2014 é o ano da Copa do Brasil. E da exposição internacional do teatro brasileiro. “O Brasil e suas artes cênicas se tornaram referência mundial”, diz Octavio Arbelaez, curador do Festival Ibero-americano de Teatro de Bogotá, evento cultural mais importante da Colômbia e um dos maiores festivais de artes cênicas do mundo, cuja 14ª edição, que aconteceu em abril, homenageou o Brasil apresentando um panorama do teatro do país em sua programação.

É inegável que a o fato da Copa e das Olimpíadas acontecerem em território brasileiro contribui para a internacionalização do teatro do país. “O Brasil vive um momento único de exposição mundial e com o teatro brasileiro não é diferente”, diz Sérgio Saboya, produtor que se dedica a inserir o teatro nacional ao redor do globo. Ele é idealizador do Cena Brasil Internacional, festival que há dois anos realizou uma parceria inédita com os dois maiores eventos mundiais do gênero: os Festivais de Avignon, na França e de Edimburgo, na Escócia. Este ano Saboya também auxiliou a idealização da mostra brasileira no Festival de Bogotá. “O mundo quer saber que país é esse que somente conhece por samba, futebol e mulata.” Para ele, a curiosidade se dá sobretudo pela falta de conhecimento. “Ficamos fechados dentro de nosso país e poucos grupos tiveram oportunidade de fazer uma incursão numa carreira internacional, portanto, o mercado está favorável para absorção dos nossos espetáculos”, afirma.

Faith Liddel, diretora-geral do Festival Internacional de Edimburgo, confirma que o atual momento do Brasil é um facilitador para a internacionalização de seu teatro. “Entre 2012 e 2014, época em que o Reino Unido recebe os Jogos Olímpicos e a Escócia é sede dos jogos de Commonwealth em Glasgow, percebemos uma possibilidade real de trabalharmos coletivamente para aprofundarmos nosso relacionamento com artistas e produtores de países como o Brasil”, diz ela, que recebe cinco espetáculos do país no festival este ano. Entre eles, O dia em que Sam morreu, peça do Armazém Cia. de Teatro. No ano passado o grupo apresentou A marca da água no evento, obra que venceu The Scotsman Fringe First Award, o mais importante prêmio do Fringe, mostra paralela do Festival de Edimburgo.

Faith frisa, no entanto, que seu interesse pelo teatro do país se dá sobretudo por sua qualidade. “Há padrão internacional na produção teatral do Brasil. Além disso, ela é vigorosa, ousada e de estilos diversos, com capacidade de provocar uma reflexão universal a partir de temas e ideias bastante particulares”, explica.

O Lume Teatro inicia as comemorações de seus 30 anos com Perch (“poleiro” em inglês). Previsto para estrear em julho, o espetáculo de rua, uma parceria entre o grupo brasileiro e coletivos teatrais Conflux, da Escócia e Legs on the Wall, da Austrália, acontecerá em Campinas e Glasgow simultaneamente, com projeções ao vivo e cenas intercaladas que ligarão as duas cidades.

A Cia. Brasileira de Teatro estreou recentemente na França Nus, ferozes e antropófagos. Ainda sem data de estreia no Brasil, o espetáculo é resultado da parceria entre o grupo dirigido por Marcio Abreu, os coletivos Jakart/Mugiscué e o Centro Dramático Nacional de Limousin.

A obra do Vertigem estreou em Bruxelas em maio

Teatro da Vertigem ocupou no mês passado a bolsa de valores de Bruxelas com Dizer o que você não pensa em línguas que você não fala, seu primeiro projeto internacional, previsto para integrar a programação do festival de Avignon este ano. Trata-se de uma coprodução que usa o templo do dinheiro para falar sobre crise, realizada entre o Teatro Nacional da Bélgica, o próprio Festival de Avignon e a cia. de Antônio Araújo, cuja pesquisa, desde os anos 1990, investiga através de intervenções urbanas a relação entre o homem da grande cidade com o espaço.

Os três grupos alimentam-se da troca artística dos novos trabalhos. Nus, ferozes e antropófagos tem como tema a possibilidade de conhecer e se comunicar com o diferente. “O trabalho nasceu do mergulho na realidade do outro”, diz Marcio Abreu. Como o nome emprestado da obra de Hans Staden indica, é um trabalho que busca a exploração de fronteiras desconhecidas. “É um espetáculo sobre o encontro com o outro, com a diferença, com outra língua e também o encontro consigo mesmo”, explica Thomas Quillardet, diretor da cia. Jakart.

Ricardo Puccetti, integrante do Lume e diretor geral de Perch, também buscou alimentar-se. “Para nós é muito enriquecedor fazer este projeto que reúne culturas e fazeres artísticos tão distintos”, diz. Graças à parceria, pela primeira vez em sua carreira o Lume realiza um espetáculo de caráter multidisciplinar, que trabalha com projeções e também utiliza o espaço de forma vertical. Cerca de 80 artistas realizam cenas ao ar livre, entre eles bailarinos e acrobatas que realizam performances em prédios, sacadas, árvores e telhados.

Outras diversas produções internacionais acabam por ampliar o olhar – e o alcance – das cias. do país.

O grupo pernambucano Magiluth prepara um espetáculo sobre felicidade com a cia. portuguesa Mala Voadora, com previsão de estreia em setembro de 2015 em Portugal e janeiro de 2016 no Brasil.

André Guerreiro Lopes, Patrícia Pichamonte e Nicole Cordery, entre outros atores do Brasil estão na Suécia ensaiando com artistas do país Dissecação de uma nevasca. O espetáculo, que deve estrear por aqui em outubro, faz uma leitura poética da vida de Christina, rainha sueca do século 17. O texto é de Sara Strindsberg, autora de destaque na Suécia atual. A direção é da sueca Bim de Verdier.

Aqui é minha cidade – This is my city aproxima Brasil e Dinamarca, reunindo os grupos Opovoempé e TeaterKunst. O espetáculo que deve estrear até o final do ano busca refletir sobre os modos de vida e as experiências urbanas dos habitantes dos dois países.

Autora, diretora e jornalista teatral. Pós-graduada em Jornalismo Cultural na PUC-SP, estudou Cultura e Civilização Francesa na Sorbonne, em Paris, e Dramaturgia e História do Teatro Moderno em Harvard, Boston. Escreve para Folha de S.Paulo e revista Vogue. Compõe o júri do prêmio APCA de teatro. É autora e diretora de Nijinsky - Minha loucura é o amor da humanidade (2014), peça convidada a integrar o Festival de Avignon de 2015. Tem cinco peças encenadas, Ilhada em mim – Sylvia Plath (indicada ao prêmio de melhor direção pela APCA de 2014); Espasmo (2013); Correnteza (2012); Parasita (2009), A história dela (2008), além de um livro publicado com suas obras teatrais: Gabriela Mellão – Coleção primeiras obras. Lecionou Laboratório de Crítica Teatral para o curso de Jornalismo Cultural na pós-graduação da Faap, entre 2009 e 2012. Foi crítica da revista Bravo! entre 2009 e 2013, ano de fechamento da mesma.

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