Reportagem
19.1.2015 | por Valmir Santos
Foto de capa: Ligia Jardim
A dramaturgia sueca é mais conhecida no Brasil sob a ótica masculina. Basta citar expoentes como August Strindberg (1849-1912), Ingmar Bergman (1918-2007) ou Lars Norén, frequentes nos palcos do país. Agora, uma voz feminina ecoa da paisagem nórdica vista dos trópicos: a de Sara Stridsberg, de 42 anos, cuja peça Dissecar uma nevasca (2012) está em cartaz em São Paulo.
Sara toma como inspiração fatos da vida da rainha Cristina (1626-1689), que herdou o trono aos seis anos de idade, assumiu o reino sueco aos 18 e abdicou após nove anos de guerras e conflitos íntimos. Afinal, fora criada para ser homem, não cogitou casar e ter filhos e terminou migrando para Roma, convertida ao catolicismo.
Em vez da convenção do drama histórico, a também romancista concebe um texto pleno em camadas e símbolos de significados entrelaçados. A rainha é identificada como Menina-Rei. Seus interlocutores são arquetípicos como Filósofo ou Poder. A moça com quem flerta chama-se Belle. O moço que a deseja como mulher, Luve. O pai vira Rei Morto, enquanto a mãe, Maria Eleonora, homônimo na vida real.
Sueca naturalizada brasileira, a diretora Bim de Verdier, de 59 anos, também intérprete de Maria Eleonora, afirma que a montagem discute as formas de poder nos planos do indivíduo e da sociedade. “Investigamos paralelos entre o reino da Menina-Rei e a nossa realidade, sem didatismo. Ela não aceita rótulos que lhe são impostos e nem as dicotomias bom e ruim, masculino e feminino.”
Inadequações existenciais, políticas e filosóficas movem essa história sobre a força da dúvida. “Quando a gente chega ao ponto em que não tem mais volta, a dúvida cresce tanto que nos leva a agir, a buscar a saída. Não se trata de ser heroína. Ela faz porque tem que fazer”, afirma a diretora.
Equipe do espetáculo fez pesquisa de campo na Suécia
A Menina-Rei enfrenta situações-limite com reações humanamente complexas, às vezes se comportando com crueldade. Não por acaso, Strindberg dedicou-lhe uma peça, “Cristina” (1901), e a compatriota Greta Garbo (1905-1990) a representou no cinema em “Rainha Cristina” (1933), do georgiano Rouben Mamoulian (1898-1987).
A encenação inédita decorre da pesquisa de campo realizada pelos criadores na Suécia, monarquia constitucional parlamentarista. A troca cultural resulta no projeto idealizado por Bim de Verdier e pela fluminense Nicole Cordery (intérprete de Menina-Rei), que contracenam com André Guerreiro Lopes, Daniel Costa, Daniel Ortega, Renato Caldas e Rita Grillo. Em mão dupla, profissionais suecos assinam cenografia, figurino, luz, música e videoarte nesta coprodução do Sesc SP.
.:. Publicado originalmente no jornal Valor Econômico, seção Eu & Cultura, em 19/1/2015, página D4.
.:. Acompanhe o blog dedicado ao processo criativo de Dissecar uma nevasca, aqui.
Serviço:
Onde: Sesc Belenzinho (rua Padre Adelino, 1.000, Belenzinho, São Paulo, tel. 11 2076-9700).
Quando: Quinta a sábado, às 19h30; domingo, às 17h. Até 8/2.
Quanto: R$ 9 a R$ 30.
Ficha técnica:
Texto: Sara Stridsberg
Tradução: Bim de Verdier e Nestor Correia
Direção: Bim de Verdier
Atuação: André Guerreiro Lopes, Bim de Verdier, Nicole Cordery, Daniel Costa, Daniel Ortega, Renato Caldas e Rita Grillo
Cenografia: Birgitta Hallerström Wallin
Figurinos: Birgitta Hallerström Wallin e Lena Hellesöy Annell
Iluminação e técnica: Birgitta Hallerström Wallin e Tobias Hallgren
Composição, trilha sonora, música eletrônica e outros instrumentos: Leo Correia de Verdier
Violino: Sara Parkman
Videoarte: Eva Koch e outros artistas
Videoartista making of Brasil-Suécia: Flavio Barollo
Adereços e assistente de cenografia: Eliseu Weide
Maquiagem e cabelo: Dhiego Durso
Assistência de direção: Rita Grillo e Malú Bazán
Preparação corporal: Fuji Hoffmann e Vitor Vieira
Operação de áudio, vídeo e luz: Igor Sane
Fotos do processo e ensaios: Flávio Barollo, Renato Caldas e Lígia Jardim
Produção executiva: Anna Zêpa
Coprodução: Sesc SP
Direção de produção: André Canto
Realização: Sesc, Canto Produções / Cordery e Viana Produções