16.3.2014 | por admin
Até o torturador cria para si histórias que o convençam de que faz o bem. Dita quase com essas palavras em Escola, tal frase é indício da perspectiva complexa com a qual o diretor Guillermo Calderón aborda temas políticos em espetáculos como Villa+Discurso, apresentado no Brasil em 2011 e 2012, e este Escola que ora traz à MITsp. É preciso desconfiar dos discursos. Deles escapam contradições, que revelam a concorrência de forças sob a superfície de uma convicção. Leia mais
16.3.2014 | por Valmir Santos
Os procedimentos dramatúrgicos e cênicos de Guillermo Calderón em Escola combinam elementos épicos e dramáticos que potencializam uma teatralidade feita de sutilezas e impurezas nas angulações crítica e política em que se anuncia. Seu mote é um achado, e explosivo. Ao circunscrever o treinamento dos integrantes de uma guerrilha em tempos de ditadura militar, o espetáculo dá margem para pensar noções de ideologia e de engajamento à luz dos dias que correm, quando o espaço público retoma vocação para a ágora em que manifestantes se fazem escutar. Leia mais
16.3.2014 | por admin
O que é, diante do real, esse trabalho intermediário da imaginação? – diz Robert Bresson. Para um cineasta inquieto com o seu tempo e com o seu fazer, suponho que seja o cotidiano o suporte de seus devaneios e a imaginação a engrenagem para a realidade. Mas encontra-se aí a potência e o revés da criação. Parto dessa suspeita para propor uma reflexão a partir de Cineastas, da Companhia Marea. Sendo a criação esse território da instabilidade e do desassossego, o criador busca ordenar as formas para delas subtrair instantes de arrebatamento. E cada instante desse capturado é enquadrado, o que retira dele uma possibilidade outra de existir, na medida em que se exclui do plano um universo para, quem sabe, libertar o plano dele mesmo; deslocado de sua realidade, do instante não permanece quase nada. Leia mais
16.3.2014 | por admin
A certa altura do espetáculo Cineastas, a declaração de um dos personagens saltou aos ouvidos: “o cinema é o ser humano fazendo o tempo parar”. Enquanto no cinema o instante se deixa capturar e reproduzir pelo aparato tecnológico, no teatro há mais coerência em dizer que ele é experimentado em conjunto. Por isso mesmo, a característica da efemeridade mostra-se, como sabemos, uma das mais intrínsecas à atividade teatral. Atores e espectadores estão em busca de uma vivência compartilhada, da fruição de pulsões e desejos, que não se dão numa via de mão única: acontecem tanto do palco para a plateia quanto vice-versa, mas significam efetivamente tempo, acontecimento e, geralmente, espaço divididos. Leia mais
16.3.2014 | por Maria Eugênia de Menezes
Dramas e tragédias contemporâneos têm atravessado a programação da MITsp. As problemáticas de nosso tempo contaminam as obras. A tal ponto que, mesmo ao lidar com textos que acreditávamos suspensos na história – atemporais -, os criadores são capazes de reposicioná-los, contaminando-os de presente e abrindo a possibilidade de insuspeitas leituras. Nas mãos do lituano Oskaras Koršunovas, Hamlet permanece a repercutir a angústia do príncipe da Dinamarca, dividido entre os deveres de herdeiro real e as vontades do indivíduo. Mas adquire também os contornos de uma crise que ainda não soubemos nomear, um mal-estar difuso que vemos tomar as ruas e acorrer aos consultórios médicos em busca de alívio. Leia mais
16.3.2014 | por admin
Hamlet, da companhia lituana OKT, principia com uma pergunta: “Quem é você?”, variação do encenador Oskaras Koršunovas para a frase da peça de William Shakespeare “Who’s there?”. O questionamento é feito pelos nove atores da trupe que, de costas para a plateia, se miram no espelho. Vão do sussurro ao grito, num crescendo. O público também está refletido. O cenário é um camarim com bancadas móveis que se transfigura no reino da Dinamarca. O sistema de espelhos compõe ângulos reveladores, como o do pai de Hamlet fantasma (Dainius Gavenonis) que se olha e vê Claudius (que ele matou) dentro de si, numa alusão ao fratricídio Caim e Abel. Leia mais
16.3.2014 | por admin
A performer espanhola Angélica Liddell habita o palco carregada de memórias e simbologias em Eu não sou bonita. O espetáculo foi criado sobre material autobiográfico, a partir do qual ela elabora uma poética da agressão. Desde uma perspectiva íntima compartilhada, a artista cria um espaço extracotidiano de expressão verbal e corporal contra a violência de gênero. Assume uma postura de enfrentamento da construção cultural do ser mulher, que limita a experiência do feminino, denunciando violências simbólicas e físicas castradoras do desejo e da liberdade. Leia mais
16.3.2014 | por admin
Muito se fala de uma cena contemporânea cujo teor dramatúrgico se confirma autorreferente. Ora como o contar biográfico, ora no uso simbólico da experiência real, a aproximação entre o vivido e o encenado explicita também a necessidade de tornar espetaculares ocorrido e sentido, produzindo uma espécie de materialidade assertiva, pela qual o artista deixa de ser meramente instrumento para se exibir estrutura de atenção. Ocorre não ser tão simples o uso do próprio, visto o processo exigir consistência em seu argumento. Então são poucos os trabalhos que, verdadeiramente, superam a narrativa ilustrativa. É possível dividir em duas as disposições: a que confirma o uso do particular como meio de resolvê-lo, e a que aceita e reaviva sua condição. A diferença fundamental está na perspectiva da culpa igualmente autorreferente e daquela transferida ao outro. E ambas, até certo ponto, se confundem demasiadamente com mecanismos terapêuticos sobre o próprio dizer. Leia mais
16.3.2014 | por admin
Gólgota Picnic, de Rodrigo García, oferece ao espectador um banquete, uma cornucópia de imagens e ideias, cuja abundância solapa qualquer possibilidade de síntese já nos primeiros vinte minutos de espetáculo. Tentar descrevê-lo ou resumi-lo em poucas palavras é correr um sério risco de chafurdar em platitudes, mas o esforço de tentar falar de algo de que não podemos dar conta é inevitável quando se pretende o exercício crítico. Leia mais
16.3.2014 | por admin
Introdução.
É de tirar o fôlego, embrulhar o estômago, aflorar os nossos instintos de manifestante em tempos de passeatas midiáticas, quando juntamos tudo no mesmo bolo – gritamos contra a corrupção, pedimos por melhorias nos transportes e aproveitamos para falar de saúde, educação, sem nos esquecer de emitir opiniões pelo Facebook e postar a foto com filtro no Instagram. Enquanto um protesto fechava o trânsito na Avenida Paulista e ativistas subiam ao palco por conta do cavalo utilizado na performance Eu não sou bonita, de Angélica Liddell, a companhia La Carnicería Teatro apresentava Gólgota picnic no Sesc Vila Mariana, dentro da programação da MITsp. Leia mais