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Reportagem

Duas ‘obras-primas’ do Latão segundo Carvalho

16.5.2014  |  por Fábio Prikladnicki

Foto de capa: Bob Sousa

Uma das grandes atrações do 9º Festival Palco Giratório Sesc/Poa, a Cia. do Latão (SP) apresenta em Porto Alegre seus dois principais trabalhos em repertório. Será a estreia nacional da nova montagem (a versão anterior era de 2006) de O círculo de giz caucasiano, texto clássico de Brecht, com sessões nesta quinta (15/5) e sexta (16/5).

No sábado (17/5) e no domingo (18/5), o público vai conferir Ópera dos vivos [atriz Helena Albergaria na foto acima], peça que revê a cultura brasileira dos anos 1960 em comparação com a atualidade. Cada espetáculo tem quatro horas de duração, mas se você tiver que assistir a apenas dois trabalhos desta companhia criada há 17 anos talvez deva escolher estes. Sérgio de Carvalho, diretor e dramaturgo do grupo, é taxativo:

“São as duas obras-primas recentes do Latão. O círculo de giz caucasiano é o trabalho de direção mais importante que fiz, e a Ópera dos vivos é a dramaturgia mais importante da nossa história.”

Escrito durante o exílio americano de Brecht no final da 2ª Guerra, O círculo de giz… reúne narrativas concêntricas, como se fossem peças dentro da peça, que tratam da disputa por um terreno fértil. Carvalho afirma que a encenação “vai contra todos os clichês que as pessoas que não conhecem Brecht atribuem a seu teatro, como frieza e racionalidade discursiva”.

“Existe uma fidelidade ao projeto brechtiano, partilhamos da perspectiva anticapitalista dele, somos fascinados por suas descobertas formais, pelo modo como usa a dialética em cena. Mas existe uma reescritura. Brecht obriga você a pensar o assunto de suas peças na atualidade.”

Ópera dos vivos, escrita e dirigida por Carvalho, mostra quatro momentos na história da cultura brasileira – tendo como eixos o teatro, o cinema, a música e a televisão – que revelam o processo de desmonte do potencial crítico desta cultura.

“Nossa hipótese é que a grande fermentação cultural ocorreu antes do golpe militar. O golpe foi a diluição ou o deslocamento daquele projeto, que tinha uma política muito avançada”, afirma o diretor.

Representante do que se convencionou chamar de teatro político, a Cia. do Latão investe na reflexão crítica, como o público gaúcho pôde conferir em O patrão cordial, no ano passado, também no Festival Palco Giratório. Mas Carvalho rebate o tom pejorativo com o qual acredita que o “teatro engajado” é tratado na imprensa:

“Isso tem a ver com uma despolitização muito grande que temos visto, associada à cultura do consumo. A ideia do teatro engajado é vista como um nicho de mercado, o que o deixa desinteressante.”

Segundo o diretor, os rótulos de teatro político ou engajado são atribuídos com a intenção de diminuir trabalhos que veiculam uma posição de esquerda:

“O problema não é ser político, é assumir uma posição anticapitalista. Está cheio de gente que faz peça política conservadora que não é considerada peça política.”

.:. Publicado originalmente no jornal Zero Hora, Segundo Caderno, p. 3, em 15/5/2014.

Serviço:
Círculo de giz caucasiano
Onde: Teatro Renascença (Avenida Erico Verissimo, 307, tel. 51 3221-6622).
Quando: Quinta e sexta (15 e 16/5), às 19h.
Quanto: R$ 5 a R$ 20.

Ópera dos vivos
Onde: Teatro Renascença (Avenida Erico Verissimo, 307, tel. 51 3221-6622).
Quando: Sábado e domingo (17 e 18/5), às 19h.
Quanto: R$ 5 a R$ 20.

.:. A programação completa do 9º Festival Palco Giratório Sesc/Poa, aqui.

Jornalista e doutor em Literatura Comparada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É setorista de artes cênicas do jornal Zero Hora, em Porto Alegre (RS). Foi coordenador do curso de extensão em Crítica Cultural da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS). Já participou dos júris do Prêmio Açorianos de Teatro, do Troféu Tibicuera de Teatro Infantil (ambos da prefeitura de Porto Alegre) e do Prêmio Braskem em Cena no festival Porto Alegre Em Cena. Em 2011, foi crítico convidado no Festival Recife de Teatro Nacional.

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