Menu

Encontro com Espectadores

Os caminhos da Cia. Balagan até ‘Cabras’

9.5.2017  |  por Teatrojornal

Foto de capa: Bob Sousa

Publicamos a seguir a transcrição do 5º Encontro com o Espectador ocorrido em 31 de outubro de 2016, no Ágora Teatro, em São Paulo. Focamos o espetáculo mais recente da Companhia Teatro Balagan, Cabras – cabeças que voam, cabeças que rolam. Os criadores convidados foram a diretora Maria Thaís e o dramaturgo Luís Alberto de Abreu. Outros artistas da companhia fundada em 1999 também contracenaram no diálogo.

Valmir Santos

Boa noite a todos. Hoje recebemos os criadores do espetáculo Cabras – cabeças que voam, cabeças que rolam, da Companhia Teatro Balagan, representada aqui pela Maria Thaís, a diretora, e por Luís Alberto de Abreu, dramaturgo e colaborador recorrente. Vou fazer um breve resumo da trajetória dos três: grupo, diretora e o dramaturgo. Acho importante essa noção de trajetórias.

A Companhia Teatro Balagan foi formada em 1999. Cabras é seu sétimo trabalho, mas também é um grupo que se desdobra em ações e em projetos de pesquisa continuados e entrelaçados, com trabalhos paralelos. Tem sua sede na Barra Funda desde 2006 e lá é o local dessas ações enquanto os espetáculos vêm pra outros espaços da cidade. Dos espetáculos, destaco: Sacromaquia (2000); Tauromaquia (2004); Prometheus – A tragédia do fogo (2011) e Recusa (2012).

O exercício crítico que essa ação quer inaugurar e fomentar é algo extremamente bem-vindo para quem se interessa por teatro da forma mais complexa e não quer simplificar essa atividade (Thaís)

Como eu falei, uma das características dessa companhia são as ações paralelas e, entre elas, é curioso notar como essa ideia de triangulação com o espectador é parte constituinte do que pensa e do que pratica a Balagan. E eu cito uma ação chamada Formação do Olhar para o Teatro, de 2008, que parte de um coletivo artístico pensando na questão da relação cena-espectador. Destaco porque também é um dos aspectos que nos inquieta, a relação com o espectador, uma das razões de ser desse nosso encontro.

Maria Thaís é professora, pesquisadora e diretora teatral. Nascida em Piritiba, no sertão baiano, fez graduação e mestrado no Rio de Janeiro e doutorado em São Paulo, com tema da poética e pedagogia do encenador russo V.E. Meierhold, pesquisa publicada em livro em 2009, pela Editora Perspectiva [Na cena do Dr. Dapertutto: poética e pedagogia em V.E. Meierhold, 1911 a 1916]. É diretora e fundadora da Teatro Balagan, professora de atuação e direção do Departamento de Artes Cênicas da USP e do programa de pós-graduação da mesma instituição.

Wanderley Costa Lima

A partir da esquerda, Santos, Abreu, Maria Thaís e Beth Néspoli

Entre os seus trabalhos paralelos, colaborou como diretora-pedagoga com a Escola de Arte Dramática de Moscou, na Rússia (onde viveu entre 1999 e 2006), instituição dirigida pelo encenador Anatoli Vassiliev, na qual foi coreógrafa do espetáculo Ilíada, transposição da obra de Homero. Outra experiência fora do Brasil foi ter dirigido Olhos d’água, em 2004, para a companhia do dançarino e coreógrafo brasileiro Ismael Ivo, numa coprodução alemã.

Thaís já foi diretora do Tusp, o Teatro da Universidade de São Paulo, na década passada. E entre as inúmeras atividades artísticas e pedagógicas, podemos citar a coordenação do Núcleo Experimental de Teatro do Sesi; a consultoria para a SP Escola de Teatro; e a concepção, implantação e coordenação da Escola Livre de Teatro (ELT), em Santo André, que é uma referência no campo da formação e pioneira no país, que vive numa corda bamba a cada gestão, e cujo projeto pedagógico inicial passa pela presença da Thaís e também por Celso Frateschi.

O Luís Alberto de Abreu é nascido em São Bernardo do Campo, décimo filho de uma família mineira, que migrou para região do ABC na década de 1940. Ele já foi seminarista, chegou a estudar jornalismo, mas enveredou pelo teatro. Atuou como amador na década de 1970 e suas primeiras peças foram encenadas pelo grupo de teatro Mambembe, no começo dos anos 1980, aquele encabeçado pelo diretor e dramaturgo Carlos Alberto Soffredini, que me parece ter sido uma figura importante na trajetória do Abreu.

A projeção veio em 1982 com o texto Bella Ciao, em espetáculo dirigido por Roberto Vignati, já em outra companhia. O Abreu sempre foi um parceiro criativo de grupos e manteve, apesar disso, autonomia de escrita no seu projeto como dramaturgo. Não por acaso, é um dos responsáveis pela difusão do processo colaborativo no Brasil: um procedimento de criação teatral em que as funções dos artistas permanecem reconhecidas, suas assinaturas, e se distingue da chamada criação coletiva, no qual as funções não são nomeadas. Uma das colaborações mais profícuas, a meu ver, ocorreu de 1994 a 2006 com a Fraternal Companhia de Arte e Malas-Artes, dirigida pelo Ednaldo Freire.

No Centro de Pesquisa Teatral (CPT), ele foi convidado pelo Antunes Filho a organizar o Núcleo de Dramaturgia, em meados da década de 1980. Na década seguinte, o Abreu é autor do texto de O livro de Jó, segundo espetáculo do Teatro da Vertigem, dirigido pelo Antônio Araújo. Mais recentemente, escreveu peças para a Companhia de Teatro da Cidade de São José dos Campos; para o Grupo Galpão, de Belo Horizonte; para a Companhia Estável, de São Paulo; e para a própria Balagan, com quem colabora há mais de dez anos.

Assim como a Maria Thaís, o Abreu também desempenha um papel importante na formação de dramaturgia, como ficou claro até aqui. Trabalhou em núcleos de dramaturgia na Escola Livre de Teatro de Santo André, onde também foi idealizador das Escola Livres de Cinema e Vídeo. Nos últimos tempos, tem sido bastante requisitado para assinar roteiros em produções para a televisão e cinema.

Feita essa apresentação, a gente passa a palavra para a Beth lançar um olhar sobre o espetáculo e depois eu faço o mesmo movimento em relação a Cabras. Em seguida, passamos a palavra aos convidados, Maria e Abreu e, na sequência, abrimos para a nossa roda tradicional de escutas, falas e visões.

Graciela Rodriguiez

Chão de ‘Cabras – cabeças que voam, cabeças que rolam’

Beth Néspoli

Vi Cabras três vezes. Fiz várias tentativas de escrever uma crítica e fracassei solenemente em todas elas. No texto (finalmente) publicado ontem, escrevi (entre outros aspectos) sobre a abordagem arquetípica presente na dramaturgia, mas não desenvolvi muito.

Nesta noite, gostaria que o Abreu e Maria Thaís pudessem comentar sobre o que sinto falta no meu texto crítico. Mais do que falar sobre o que está na escrita, seria interessante falar sobre o que está no espetáculo, mas não consegui dar conta, e são tantas possibilidades abertas pela cena.

Acompanhei, se não me engano em 2010, parte de um processo de criação da Companhia Livre, e naquela ocasião o Abreu foi lá falar sobre arquétipos. Foi muito interessante como ele comentou sobre uma certa hierarquia: o arquétipo do enamorado na base, depois o do guerreiro e, no topo, o do guardião. Lembro de ele ter exemplificado com Otelo, o mouro da peça de Shakespeare, que em vez de passar de guerreiro a guardião, regride para o enamorado, e isso é parte de sua tragédia.

Em Cabras o arquétipo dominante é o do guerreiro. Não há espaço para o enamorado ou para o guardião no ambiente da guerra sertaneja. A cena da festa logo termina porque alguém matou alguém. Ali, na festa, poderia acontecer um enamoramento, porém não há tempo. E também não há a figura do guardião. Mesmo a mãe, em Cabras, não chora pelo filho morto, pede guerra. A terra também, a terra do sertão, é uma terra que mais mata que protege, uma terra árida, onde se morre de picada de cobra, de fome, onde a vida míngua. Ou talvez seja uma terra guerreira, que ataca. Está tudo nesse arquétipo. Eu queria ter explorado esse aspecto nas minhas muitas tentativas, mas hesitei, não sei se tem sentido, e talvez o Abreu possa falar sobre isso.

Esse guerreiro aqui [em ‘Cabras’] é outro guerreiro, um outro arquétipo. E a gente só pode entendê-lo quando entra em contato com a cultura ameríndia (Abreu)

Cabras parece ser o amadurecimento de uma linguagem que está nos espetáculos anteriores. Em Sacromaquia, o próprio site do grupo define como um trabalho imagético, icônico. Às vezes é difícil falar sobre as criações da Balagan por conta do peso das imagens, porque nessa trupe de teatro não é literatura, mesmo, todos os elementos cênicos contam e afetam. Claro, essa equivalência é da natureza da arte do teatro desde sempre, desde a Grécia, mas nem sempre isso se dá na prática, no acontecimento cênico. Às vezes é a palavra que instaura a cena e o resto apenas complementa.

Em Cabras a recepção é afetada pelos corpos, pela matéria, e isso acrescido de uma palavra potente, o que é muito interessante. Voltando ao termo, quando se fala em teatro “imagético”, bem, a mim parece que imagem é pouco para dar conta de uma força que está na matéria da cena. A valorização da materialidade é um discurso já desgastado na cena contemporânea. Porém é mesmo muito mais do que imagem, ainda que Cabras, sim, seja de uma beleza formal incrível, que enche os olhos. Cabras aborda uma guerra intensa, mas a encenação não é feita para agredir, para sangrar a pele. Seria bom, Thaís, se você falasse sobre esse aspecto da materialidade e como você trabalha com isso.

Na primeira vez que eu vi Cabras, senti um incômodo depois de algum tempo, porque parecia que o espetáculo estava me dizendo que a guerra é uma coisa natural, parte da vida, do homem. A guerra está dentro da gente? Então vai ter sempre guerra? Mesmo que não tenha uma guerra estabelecida? A divisão da terra, a cerca, nada disso está no início do espetáculo, isso vai chegar muito depois. Não existe (no espetáculo) uma relação (articulação) em que você culpa o poder pela guerra; a guerra está no homem. Isso começou a me incomodar no meio do espetáculo. E, na minha crítica, eu tentei trabalhar um pouco a partir dessa primeira sensação que tive: onde a guerra começa, onde termina, quem consegue terminar com ela. Mas também não é questão de resolver, o espetáculo não tenta propor uma solução. No entanto, ele mexe com isso.

Valmir Santos

Eu queria lançar dois pontos sobre o espetáculo. Um dos pontos que pode parecer mais elementar pelo nome da obra, é o trabalho da animalidade que o espetáculo sugere. Porque me parece que essa figura da cabra e todas as evocações do não-humano na cena acontecem escapando de um domínio da alegoria ou do anedótico ou da construção colada na figura do animal.

É muito recorrente, quando se visita na literatura e nas artes, esse ato de dar forma humana ao bicho. E na dramaturgia e na escrita do Abreu, os diálogos e as ruminações parecem deixar muito evidente a questão do humano nessa dimensão de que também somos bicho-homem e que temos as licenças de uma visão mais racional da vida, civilizada.

Eu tendo a pensar que, como linguagem, o teatro não pode ser tão domesticado; e a polifonia talvez seja um lugar menos domesticado (Thaís)

No texto, não há diálogo direto, é tudo citação, vozes que aparecem na cena, que se dispõem a esse diálogo interior ou com o outro. Não há diálogos reconhecidos num primeiro momento; mesmo na leitura do texto. E aí, cotejando com a cena, fiquei pensando como é difícil para a encenação caracterizar ou, não caracterizar, fazer jus a que essas vozes tenham uma dimensão exatamente humana e ao mesmo tempo visitem esse universo do estranhado, do não reconhecível em relação a uma humanidade. Por exemplo, quando uma das vozes comenta sobre o olhar desse animal, como esse olhar diz e transcende o encontro com esse bicho.

Entre humanos, quando a gente olha para o olho do outro, há um território de possível identificação. É bem prosaico isso, mas eu fiquei pensando porque, quando a gente mira o olho de um animal, há certa desconfiança do lado de lá em relação ao lado de cá. Há uma sensação de ameaça nessa relação homem e animal, mesmo com aqueles domesticados.

Ainda pensando nessa ideia do olhar, salvo engano, Rosa Luxemburgo, quando foi presa, faz uma descrição muito veemente da figura do búfalo que está chegando com uma carroça muito pesada e ela descreve esse animal com uma dimensão humana daquilo que ela mesma está sofrendo, cerceada em seus direitos políticos, na sua condição humana, propriamente dita. Ela faz uma relação horizontal com esse animal descrevendo muito detalhadamente, apesar de ser muito sofrida essa descrição.

A ideia da guerra e dessa condição de demarcação de território, da condição animalesca dos conflitos, ao mesmo tempo o espetáculo vai deixando com que a gente veja as convenções humanas nesses traços animais. Naquela passagem da peça que se constrói a ideia da cerca como um espaço de delimitação entre a roça e as cabras, como se fosse uma necessidade de instaurar ali o início de uma ordenação do humano. Porque o humano sempre tem talvez um ímpeto de tentar ordenar e organizar, codificar e tornar as posições mais reconhecíveis para além daquela experiência animal que está muito associada a uma ideia selvagem, irracional, e que, portanto, deve ser reprimida, vamos dizer assim.

E nesse conflito, que começa a germinar ali a partir dessa cerca, é que a gente percebe como as nossas vicissitudes aparecem a partir dessa necessidade de estabelecer a ordem em meio a esse caos, quando tudo de alguma forma na vida, desde que a humanidade veio ao mundo, o caos opera e também constrói a sua lógica, mesmo nas comunidades mais bucólicas e rurais.

E outro ponto é uma ideia de como o espetáculo, a partir da trajetória de pesquisa do Abreu em relação à cultura popular ou comédia popular, torna evidente uma ideia de regionalismo ou de contextos da literatura brasileira, de um Brasil profundo, dessa condição do campo e da realidade social. O espetáculo e a companhia se propõem a visitar esses lugares e surpreende por não os tornar reconhecíveis, como uma ideia de regionalismo e cultura popular às vezes estereotipadas quando se refere ao norte e nordeste do país, por exemplo.

Murilo De Paula

Atriz integrante da Companhia Teatro Balagan: olhares do humano e do animal

As questões culturais e sociopolíticas aparecem no espetáculo sem que essas dimensões sejam exatamente explicitadas. Por exemplo, a cena do bumba meu boi é de um lirismo reconhecível em relação a esse imaginário da cultura nordestina. E, dentro da cena, o rapaz brincante dentro do boi, o “miolo”, irrompe e dá cinco tiros no meio da multidão. É uma cena dramática, uma descrição que nos lembra conflitos urbanos até e está contida dentro desse universo cultural narrado pela dramaturgia e me faz descolar daquela imagem primeira e convencional do boi.

De muitas maneiras, como a Beth falou do conflito, de uma cultura da peleja, o espetáculo deixa que a gente perceba essas possíveis associações, livres. Aí é que a gente entende porque a obra está sendo feita agora, pela coerência do projeto artístico para além das intenções originais. Porque quando a Balagan criou o Tauromaquia, em 2004, essa ideia do animal, que é recorrente de alguma forma na pesquisa da companhia, tinha uma visita ao universo do boi num aspecto mais masculino em relação a esses vaqueiros que saem a campo e passam dias descampado e aparentemente fora de uma clausura, apesar da espacialidade inerente a essa ideia do vaqueiro e do boi.

Essas referências da animalidade naquele espetáculo eram mais evidentes no couro do figurino e, emblematicamente, na carcaça de boi nas costas dos atores, que virou um adereço (não sei se posso chamar assim), e gerou a identificação com um universo mais reconhecível ao espectador contemporâneo. Enquanto que aqui, a experiência dessa animalidade ou dessa coisa arcaica, primitiva, escapa mais aos nossos controles. Em Cabras não é nada elementar o modo como a escritura da cena visita a escritura dramatúrgica do Abreu.

Em muitos momentos eu tive uma sensação de descontrole, em que parecia com um transe, porque tem uma camada de espiritualidade, de ritualidade na cena que me fez pensar nesses outros lugares onde essa questão não diz respeito exatamente à carne, mas ao espírito. Talvez pelo subtítulo Cabeças que voam, cabeças que rolam, que carrega uma ideia de céu e terra. E há momentos na cena que não necessariamente estão contidos na dramaturgia, mas que exploram essa noção de ascensão e queda.

Há essa ideia do sangue jorrando, do sertão encharcado, de cabeças decapitadas, de lampião do nosso imaginário, dessa coisa bruta da nossa formação histórica e humana, que continuam aí até hoje nas nossas prisões, rebeliões, e assim sucessivamente. Mas apesar disso, do tema árido, duro em relação a essa condição humana, por outro lado, em muitos momentos, pela música, pela coreografia, pelo gesto dos atores, a gente é transportado para um nível de suspensão que me tocou bastante.

É difícil de descrever e também de escrever sobre. Mas fazendo um paralelo com Tauromaquia, as possibilidades e a riqueza de que Cabras nos coloca talvez diga muito sobre a acumulação de um projeto artístico em que a maioria das pessoas estão juntas e estavam naquela pesquisa e estão agora. Acúmulo em relação à estratégia de narrativa em que o espectador é sempre convocado a ser um partícipe. Em Cabras, não é nada diretamente identificável, os diálogos, a ideia de continuidade, de sequência, de definição territorial, espacialidade e mesmo o desenho dos personagens. Você pode ouvir a voz de um vento como uma figura ou a voz de um cachorro, até da ordem de um certo realismo fantástico.

Basicamente são essas duas vertentes: essa questão da animalidade e da base cultural e sociopolítica, que aparentemente não está posta, mas que me senti visitado por elas. Acho que é um trabalho muito difícil de ler, no bom sentido. Eu assisti duas vezes e ele não tem facilitadores, as convenções e o modo de se relacionar e talvez seja o trabalho mais solar da Balagan, no sentido até de ser espirituoso. Tem uma atmosfera solar em que se vê os temas anteriores da companhia, uma densidade, uma questão existencial forte de pensamento bastante elaborado, mas que me parece também jogar com o acúmulo de bagagem ou sabedorias de montagens outras.

Graciela Rodriguez

Um dos artistas da obra que pensa o lugar do espectador

Maria Thaís

Boa noite. Queria agradecer o convite. Principalmente porque o exercício crítico que essa ação quer inaugurar e fomentar é algo extremamente bem-vindo para quem se interessa por teatro da forma mais complexa e não quer simplificar essa atividade. Queria fazer uma observação: tem aqui vários atores da Companhia Balagan, o corpo de artistas parceiros.

Acho que a grande coisa do exercício crítico, talvez porque eu tenha estudado teoria na minha formação, é esse aprendizado através da crítica, e eu acho que é extremamente legítimo, esse olhar sobre uma obra. Não importa o que ele diz, mas a oportunidade de poder ouvir esse outro olhar, que não é só o olhar do espectador. É um olhar de alguém que se dispõe a tentar elaborar e partilhar essa leitura. E por isso eu saúdo vocês por essa ação.

A imagem contemporânea é aquela que não abre janelas. Quando você vê, por exemplo, uma imagem da Coca-Cola, ela não abre a sua imaginação (Thaís)

É muito interessante como algumas leituras vêm desvendar aquilo que só você sabe ou aquilo que você não sabia. Tem coisas que vocês dizem e eu intuo que eu sei. Outras que talvez eles [atores] não saibam e eu sei. Outras ainda que eu e Abreu sabemos. Tem coisas que eles [atores] sabem e que a gente não sabe. Mas tem principalmente aqui também a possibilidade de jogar uma luz, fazer relações, pelo fato de vocês acompanharem a trajetória da companhia.

A Yara de Novaes [Grupo 3 de Teatro], no dia em que foi assistir ao espetáculo, ela que é diretora, me disse que eu era insistente, que ficava falando sempre a mesma coisa. Eu na hora gelei. Mas o que ela me disse eu acato com muita boniteza. Tem um poeta que disse que você, para ser ouvido, precisa falar a mesma coisa oito vezes. E, de um certo lugar, eu acho que tem esse reconhecimento. Cabras é Cabras. É o que é hoje, com essas pessoas. Mas Cabras também é, de fato, um amadurecimento: de companhia, de parcerias, dos parceiros que estão hoje e não estavam antes, de uma intenção que antes a gente não sabia nomear e hoje a gente vai aprendendo.

Nesses 16 anos de companhia, o Abreu sempre esteve, mesmo que não diretamente. A questão da narratividade ou de pensar a narrativa como sendo um foco do trabalho, isso está na origem do trabalho da companhia, antecede o trabalho e se manteve; não por obrigação, mas porque essa investigação nos impulsionou para frente. Hoje eu poderia dizer que tem aqui um lugar que não era fácil de entendimento entre direção, encenação e dramaturgo, que é sair, fugir de um certo paradigma dramático, de um certo pensamento de uma escola ou de um modo de pensar teatro que é muito marcado pelo pensamento moderno.

Adentrar certo universo que passa pelo que Valmir chamou de “Brasil profundo” não é uma questão identitária. Acho que nunca foi nem para mim nem para o Abreu e nem para muitos parceiros que estão dentro do trabalho durante esses anos todos. Não é uma questão de identidade deste Brasil, mas é porque é deste lugar que nós vivemos e deste lugar que nós vemos o mundo. E não dá para negar, eu nasci em Piritiba, ele em São Bernardo, Maurício [Schneider] vem do interior, Val [Ribeiro] vem da Bahia, enfim, nós todos viemos do Brasil profundo.

Nós não somos daqui e este não ser daqui, de uma certa maneira, eu carrego comigo. Não tem forma de negar isso. E isso passa a ser um interesse porque a gente sabe que esse discurso hegemônico sobre o Brasil não nos inclui. E por que não nos inclui? Essa é uma questão nordestina, amazonenses, do Mato Grosso do Sul, da ponta do Rio Grande Sul. Essa é uma questão. Que discurso hegemônico da cultura e do teatro não nos inclui? Isso me marca não só como artista, mas também como uma questão política.

Bob Sousa

O impacto das imagens na obra recente da Balagan, fundada em 1999

Pensar o teatro é, de alguma maneira, ir provocando essas cisões, essas tensões. Eu estudei aquilo que a gente consideraria um dos ápices da cultura teatral. Eu morei na Rússia e vi que a Rússia não é Ocidente, que quando voltei, pensei que talvez eu pudesse ser mais responsável com o lugar onde eu estou e do lugar de onde eu vim. Então acho que tem um olhar para o projeto [global] que expressa uma certa inquietação de furar esse discurso hegemônico e poder expressar um outro lugar para isso.

Mas, obviamente, acho que tem uma marca desse discurso e do amadurecimento desse discurso que acho que, do ponto de vista da organização da cena, é a marca desses últimos anos da Balagan. Mais especificamente de um estudo que influencia o próprio espetáculo que sai disso, que é Recusa [2012], mas também a própria contraposição em relação a Prometheus [2011], espetáculo com a matéria grega e outro com a Ameríndia.

É ali talvez que eu encontre, eu Thaís como pessoa que gosta de ler, um material da antropologia brasileira que de alguma maneira sustenta e nos dá vocabulário para falar sobre esse outro modo de operar o mundo, de pensar a realidade, de construir o real. Isso eu acho que foi determinante para a gente: para mim e paro o Abreu. E eu sei disso porque nossa relação de 12 anos de trabalho mudou porque, de alguma maneira, encontramos um material externo ao próprio teatro sobre o qual a gente olha e diz: tem alguma coisa que nos inclui. Um discurso que passa uma fala, um modo de pensar que é da diversidade.

Eu vou pegar a questão da animalidade que você (Valmir) coloca porque aqui nesse mundo ameríndio aquilo que o difere do que chamaríamos de “nosso mundo’’ é exatamente essa perspectiva de que o animal é humano. Então, aqui está a chave para uma maneira de operar todo o material. Porque para o ameríndio, nós não fomos animais, foram os animais que foram humanos. Eles só mudaram de corpo. Eles continuam com a capacidade que qualquer ser humano tem que é ser sujeito, de ter perspectiva, de ter um olhar sobre o mundo. E é por isso que o Cabras vai tocar nisso de uma forma tão diversa, como no Tauromaquia.

Em Tauromaquia o Abreu escreveu o roteiro. E a primeira cena era um diálogo do boi com o homem. E o boi só enxergava um pedaço do homem porque o boi não via o homem vertical. E o homem que enxergava o boi e via essa diferença. Mas a diferença é o dado básico da cultura ameríndia. Toda cultura é construída pela alteridade nessa construção da diferença.

Eu estou tocando nesse aspecto porque acho que aqui está o centro de uma mudança de pensamento nosso, de vontade de estudar outras coisas, de pensar o mundo e mover um pouco essas questões fugindo [e não negando] dos parâmetros que a gente normalmente tentava construir, por meio de uma dramaturgia que era ter essa diversidade e essa multiplicidade de vozes, mas ao mesmo tempo tentar uma história baseada na empatia, no reconhecimento. Com Recusa, a gente viu que podia construir um espetáculo em que o espectador não se reconheça, que ele veja o outro que ele não é. Por que que no teatro precisa ser só o reconhecimento? É uma tentativa, é um exercício artístico, de pensamento.

Nós começamos a estudar para fazer esse projeto a partir do cangaço. Esse era um desejo inicial. O cangaço pra mim é uma memória infantil e afetiva. Eu conhecia livros e coisas, meu pai contava histórias. Qual o sertanejo que não tem o cangaço, o herói, o bandido? Mas como vinha imbuído das questões indígenas com o Recusa, nós começamos a estudar e a levantar os temas. É importante dizer que eu e Abreu começamos a trabalhar antes dos atores e todo o trabalho de dramaturgia, escrita de texto, foi um modelo muito diferente do que a gente vinha fazendo.

Ale Catan

Cangaço e cultura ameríndia estão entre as referências

A escrita do Abreu era meio autônoma, então a estrutura nós fomos pensando muito separadamente; a gente tinha dois campos de conversa. Eu começo a observar e tive uma intuição de que a questão que os traços que o cangaço traz são muito fortes da cultura cabocla, da cultura indígena. A questão da cabeça, a noção do inimigo que muda. O Lampião, talvez o cangaceiro mais famoso, ele podia ser amigo do cara, mas que vinte dias depois, por uma questão ou outra, vira inimigo.

O inimigo como um mote, a questão do corte das cabeças é uma questão que o Estado brasileiro assumiu: todos os nossos heróis foram decapitados, isso é uma coisa que a gente não lembra. Antônio Conselheiro foi desenterrado para ser decapitado. A questão do corte da cabeça é muito importante porque para a cultura ameríndia, cabocla, o homem só está morto quando a cabeça é descolada do corpo. Então é um mito, é um símbolo importante.

Quando comecei a observar esses traços, fui propondo aos atores temas de trabalho que tinham mais a ver com o ameríndio. Então a gente foi ler o perspectivismo, foi olhar o inimigo na questão indígena, foi olhar o nomadismo. O Lampião consegue andar por cinco estados, o trânsito dele em relação a um poder nômade, não a um poder territorial como a gente está acostumado. E isso, a me meu ver, tem muito a ver com as questões da cultura ameríndia e nós fomos desenvolvendo isso juntos, com os atores, em sala de trabalho, de uma forma muito intensa a partir de estudos com grandes temas.

Aí essa figura do ethos guerreiro aparece [ethos é o conjunto dos costumes e hábitos fundamentais em comportamento e cultura de determinada coletividade, época ou região] e com ele aparece uma guerra que é o que a gente chama de guerra de relação, não de extermínio. A guerra de extermínio é aquela que você desconsidera o inimigo, quer extirpá-lo, é a alteridade que você quer acabar. A guerra de relação é a guerra que as culturas indígenas se apoiam, você respeita e admira o inimigo, você não o desqualifica, mas você sabe que um dia ele vai lhe matar e um dia você vai matar o outro.

Nesse trânsito surgem as guerras parentais – que vêm da cultura indígena – se espalham e estão nesse Brasil profundo até hoje, ainda vivas. E estão nessa cidade de São Paulo, tanto nas famílias dos Jardins quanto das periferias. Então, de fato, o que saltou foi a gente fazer um espetáculo sobre a guerra e não sobre o cangaço. E o centro desse espetáculo passou a ser esse ethos guerreiro. É esse o eixo.

Queria abordar outro aspecto, que a Beth levantou, que é a questão do imagético. O professor de semiótica Norval Baitello, que acompanha o nosso trabalho, nos disse há muitos anos atrás, quando a gente fazia Sacromaquia [2000]: “A gente está acostumado a pensar que a imagem é contemporânea. Não é verdade. A imagem contemporânea é aquela que não abre janelas. Já a imagem desde sempre foi a janela que liga o céu e a terra, que liga o que é oposto”. Quando você vê, por exemplo, uma imagem da Coca-Cola, ela não abre a sua imaginação no sentido de abrir janelas. Tem uma frase do Vassiliev, diretor russo com quem eu trabalhei: “A imagem é abrir uma porta para que um anjo passe”. Eu gosto disso, dessas imagens. Então, a noção do imagético está aí. E o imagético traz alguns problemas com ele: a questão do belo; e quando digo belo é no sentido do que ele provoca no ser humano; a ideia de polifonia, de que a imagem também é a possibilidade de abrir muitas vozes.

A dramaturgia é importante como estrutura. O texto é importante, o movimento, a música, a vontade de que o espetáculo possa ser essa polifonia, essa coexistência de muitas vozes; às vezes opostas. Às vezes a coreografia está indo por um caminho e o texto está dizendo outra coisa. Eu tendo a pensar que, como linguagem, o teatro não pode ser tão domesticado; e a polifonia talvez seja um lugar menos domesticado.

A monofonia para mim é doméstica demais. A gente fala de amor, ouve uma música de amor e está tudo ali dizendo a mesma coisa. A polifonia sempre foi uma palavra cara para mim como regente desses espetáculos, mas que realmente eu posso assumir que pela primeira vez isso se traduz em cena de uma forma que também consideramos justa. E a gente sabe disso, tem essa percepção.

Aí eu entro na questão do espectador. Já não é mais uma linguagem que só nós acionamos. E mesmo que o espectador saia de lá dizendo que não entendeu o texto, mas ele entende um outro lugar. E se você perguntar o que ele não entendeu, ele vai te contar uma ou outra história. Então ele entendeu o texto. O espectador tem acesso para entrar no espetáculo de algum lugar e essa possibilidade dele escolher por onde vai entrar é o que eu realmente celebro. Que o espetáculo não se imponha com uma única via de acesso ao espectador.

A gente viu que nossa plateia era composta só de pessoas de teatro. Quando e por que o teatro deixou de ser público? Um lugar que a polis deixa de se ver representada? (Thaís)

No Západ [2007] era um código que só nós entendíamos e eu consigo reconhecer isso. Era um espetáculo que a gente não teve tempo de amadurecer, mas ele ficou num lugar que tinha uma distância enorme entre o que nós estávamos fazendo e o que o espectador está com capacidade e/ou disponibilidade para ler. O Západ era uma trilogia difícil, tentamos fazer um trabalho de pesquisa em sete meses, com três textos falando sobre a Rainha Elizabeth e o Ivan, o terrível.

Por que essas duas figuras? A ideia eram três textos em diferentes idades: Západ, a tragédia do poder – eles dois jovens prometendo tudo, serem os grandes reis; eles na vida adulta, matando tudo para se manter no poder; e eles velhos, loucos e abandonados. A tragédia do poder era porque esses dois reis tinham uma correspondência entre eles, de muitos anos, de que eles iam se casar. E eu pensava que se eles tivessem mesmo se casado, a Europa não existiria. Como seria o mundo sem a Europa? Estamos falando de século 16. Talvez não tivéssemos a Alemanha, por exemplo. Essa brincadeira, que era uma fantasia.

E foi nesse contexto que surgiu projeto do Olhar para o Teatro, porque a gente viu que nossa plateia era composta só de pessoas de teatro. Quando e por que o teatro deixou de ser público? Um lugar que a polis deixa de se ver representada? Então tem uma lacuna aqui. Nós fizemos esse projeto de formação do olhar para o teatro e desde lá até hoje eu continuo tentando fazer este projeto de diversas maneiras. E todos os espetáculos da Balagan, desde então, foram sendo formulados a partir de tentativas de chegar ao espectador de outra maneira.

Na formação do olhar, intrigava-me enquanto encenadora, porque nós fazemos teatro de pesquisa e não de mercado, por que quando o espetáculo fica pronto a nossa relação  muda inteiramente; a gente deixa de pesquisar e faz só o produto. E a minha pergunta era, no Západ: por que é que quando fica pronto a gente não enxerga mais como parte (de um processo)? O espectador também não é parte importante de nos provocar para que a pesquisa ande? A gente sabe que um espetáculo no primeiro dia pode virar outro depois da trigésima apresentação. Por que a gente muda a nossa relação com o trabalho? A tentativa de fugir dessa noção da estreia tem nos levado cada vez mais a criar protótipos que a gente pode dividir com os espectadores e a partir daí ir elaborando o nosso formato mais fixado.

Luís Alberto de Abreu

Boa noite. É muito legal esse posicionamento crítico. Eu sempre entendi o crítico como parceiro de criação, do crítico presencial, não como juiz, aferidor, nada disso.

Só uma correção: a dramaturgia de Cabras não é minha somente. É minha e da Thaís, e eu assinei o texto. Cada vez mais, no processo que a gente tem na Balagan as coisas vão se confundindo de uma forma muito bacana. Para mim, no trabalho na Balagan eu nunca sei pra onde eu vou, e isso é uma coisa muito legal. E acho que os atores sentem isso também. E a Thaís pensa assim: se o caminho é esse, então esse não é o caminho. E a nossa relação foi assim.

Esse humano patriarcal, que a gente aprendeu a ser e que nos é tão caro com todos os seus valores, esse humano fracassou (Abreu)

A dramaturgia no processo de criação é um peso muito grande do qual nem os dramaturgos conseguem se livrar e evitar. O dramaturgo é respeitado demais. E no nosso processo, a Thaís começou a não respeitar mais isso. E para mim tirar esse peso tradicional foi uma coisa muito boa. Tinha horas que eu não entendia nada do que ela estava falando e era ótimo porque eu ia procurar entender. Porque aí se dá um processo de mão dupla de reconhecimento. Então, esse lugar é muito confortável porque é muito brincante, eu chego lá completamente sem peso de responsabilidade nenhuma. Já trabalhei com grupos em que há o peso da dramaturgia.

Há um respeito excessivo com a dramaturgia; vamos parar de brincar de que o discurso que você está emitindo tem sentido. Tem sentido por conveniência, porque você está numa posição e todo mundo aceita o seu discurso, mas pode ser que ele não seja verdadeiro. Muitos grupos com quem eu trabalhei aceitavam por conveniência. Porque na hora eu ia estruturar ali muito bem a dramaturgia e pronto, eles iam achar legal. E isso é péssimo porque dá uma responsabilidade muito grande para a gente. Não nos permite brincar, errar, não saber.

Sobre o arquétipo foi interessante porque eu só percebi depois, justamente pela experiência com a Balagan; só agora que eu me toquei que é uma peça de guerreiros. Do ponto de vista arquetípico eu não tinha parado para pensar. O arquétipo que a gente estuda e lê é o do ponto de vista do extermínio; o guerreiro que a gente tem na tradição do teatro, da literatura, é o instrumento do extermínio. Como eu trabalhava o guerreiro dentro desse espectro da sociedade patriarcal, aquilo não passou pela minha cabeça [no processo de criação de Cabras] porque era um outro tipo de guerra. E aí o arquétipo modifica.

Esse guerreiro aqui é outro guerreiro, um outro arquétipo. E a gente só pode entendê-lo quando entra em contato com a cultura ameríndia. Nesse sentido, tem muito pouco dessa corrente literária e mais com os ameríndios que pensam de uma forma fantástica mesmo e de uma forma que nos dá embasamento para nos entendermos e nos incluirmos. Porque não é folclore. É toda uma visão do mundo, toda uma filosofia que é completamente contraditória à filosofia ocidental, onde a mentalidade da gente foi formada e o arquétipo do guerreiro foi formado.

Aqui [na ótica ameríndia] é a guerra dos tupinambás, que precisam do inimigo para existir, que não conhecem os antepassados deles a não ser a partir da guerra que eles fizeram com os outros. E isso é muito magnífico. E é difícil a gente mudar isso porque a guerra é um valor negativo. E não, necessariamente não. A guerra é parte do homem sim, mas não essa guerra de extermínio, desumana. Então no processo foi permeado, o mítico e o arquetípico estavam ali.

Cabras é um espetáculo que eu gosto muito. Principalmente porque não tem o peso da dramaturgia, do texto. A coisa que mais me intrigava quando eu vi o espetáculo era o público saindo e dizendo que gostou do texto. Eu pensava que estava errado, que eu tinha falhado. O espetáculo tem uns elementos de totalidade que eu sempre invejei no Teatro Nô, como no momento mais fundamental ali não ser textual, ser uma dança. E todo dramaturgo coloca ali um “bife” enorme. E eu ficava maravilhado. E Cabras tem isso, não só a voz dos atores, mas a voz das linguagens. A música, o canto, o movimento é uma voz importante, a figura do ator é uma coisa que me encanta no espetáculo.

A Thaís tem razão quando fala que essa pesquisa a partir de Recusa foi um divisor de águas, porque obviamente a gente tropeça por vários desses elementos, mas só que não consegue reconhecer. Mas de repente a clareza vem, com a antropologia. É muito legal a gente perceber que essas culturas tradicionais, ameríndias, desenvolveram uma civilização completa em todos os sentidos e que do ponto de vista material responderam às necessidades da grandeza e da questão do pensamento, porque não deixa em nada a dever para cultura nenhuma, nem da russa, nem da oriental. Não importa se queimaram a biblioteca de Alexandria porque é característico do homem refazer passo a passo toda a civilização. E isso para os índios também.

A forma do indígena ver o mundo talvez possa ser uma janelinha, uma porta para a gente confrontar nossos valores (Abreu)

Nesse sentido, o que é muito importante e que aprendemos e tentamos passar em Cabras é essa crítica do humano. Esse humano patriarcal, que a gente aprendeu a ser e que nos é tão caro com todos os seus valores, esse humano fracassou. Essa forma de olhar o humano, esse humano exclusivo que pertence só a esses animais que estão aqui, que não existe mais humano além disso. E o que tiver além disso tem de expressar os valores desse humano que está aqui, de preferência o europeu, que lá é o centro irradiador do humano. Aí chegaram os índios e disseram: “Não, é tudo humano”.

Valmir falou do olhar da Rosa Luxemburgo e é exatamente isso. O reconhecimento no teatro é narcísico. O estranho é objeto de conhecimento. Eu não me reconheço nessa pilastra. Ótimo, vamos conhecer. Eu não me reconheço num cavalo, num cachorro. Então vamos nos reconhecer. E essa é a proposta do perspectivismo. E é um pensamento bastante profundo.

Dentro da Balagan, especialmente com a Thaís, desde o Tauromaquia ela vem com isso de quebra do protagonista. A forma do indígena ver o mundo talvez possa ser uma janelinha, uma porta para a gente confrontar nossos valores. E eu acho que a gente tem muito a aprender com isso. Aí a gente vai para Recusa e Cabras. E em Cabras não tem protagonista e ela veio com uma proposta mais vertical ainda que é a quebra do tempo e do espaço, a timeline de um dramaturgo. Mas isso é um tempo ocidental, o tempo é uma convenção à qual a gente está presa. E Cabras só foi possível com essa quebra, em mim, enquanto dramaturgo. É impossível para uma cabeça só gerar tudo aquilo.

Cris Maranhão

Formação do Olhar para o Teatro foi uma das ações da Balagan

Abre para perguntas

Maria Eugênia – Crítica de teatro
Uma questão: lendo o seu texto (para Beth), vindo para cá hoje, você coloca um pouco essa relação com a obra do Guimarães Rosa, tem um eco de alguma coisa reconhecível, ainda que sejam coisas diferentes. Queria ouvir do Abreu o quanto isso foi uma influência pra você ou não?

Luís Alberto de Abreu
Guimarães Rosa para mim é matriz. E tem outros que gosto muito também: Lima Barreto, Machado de Assis. Para mim, qualquer coisa que eu escreva, o Guimarães está presente. E o Graciliano Ramos também, que são basilares no meu trabalho. Guimarães pela capacidade que ele tem de universalizar e de traduzir a linguagem. Ele não escreve palavra, ele constrói linguagem e constrói para o futuro.

Maria Thaís

Só pra complementar, acho que nesse texto de Cabras, para nós, tem muito do João Cabral de Melo Neto. Acho que menos o Guimarães. Mas eu queria falar do Cabral porque isso foi desde o processo com os atores e o Abreu trouxe isso, combinava essa secura nas palavras. É uma referência importante para o trabalho.

Valéria

Eu queria que a Maria Thaís continuasse falando sobre a relação com o espectador, desde o que não se reconhece mais, essa empatia, e como isso foi se desenvolvendo em Cabras.

Maria Thaís

Quando fui formular a ação para o projeto, minha justificativa passava muito pela minha profunda relação com pedagogia teatral, mas talvez de reconhecer que nós investimos muito esses anos todos em formar artistas, mas não investimos, não problematizamos a relação com o espectador.

Então, quando a Balagan faz esse projeto, “Do inumano ao mais humano”, que tinha a proposição de formação do olhar para o teatro, foi também movido por uma percepção minha dentro da universidade onde eu dou aula. Que é: mesmo os nossos alunos artistas não tinham interesse de ver teatro; viam muito pouco e só aquilo que gostava.

Eu me considero, como encenadora, o primeiro espectador. Essa é minha tarefa fundamental (Thaís)

Tem uma história que eu sempre conto. Saindo da USP encontrei um aluno e ele fez um comentário execrando o trabalho de uma pessoa que tem de ser reconhecido como um profissional. Eu acho que teatro não pode ser diletante. Eu posso não gostar, mas não posso tratar dessa forma. Porque o discurso crítico para mim não é esse.

Nossos jovens artistas não se colocam nesse lugar do espectador e isso para mim é uma briga, inclusive como ele assiste aos colegas na sala de trabalho, porque reflete. Acho que a formação de um artista passa também pelo lugar do espectador. Eu aprendo lendo. Não aprendo escrevendo só. A gente estimulou demais as pessoas a escrever, produzir teatro e pouco a ler. Então a gente tem um analfabeto funcional, que é o cara que sabe escrever o teatro, mas que não sabe ler o teatro. E isso não dá autonomia a um criador, um artista.

No [projeto] Formação do Olhar nós tínhamos essa ideia de trabalhar com o espectador nesse sentido, desde àquele que faz a pergunta básica e que nos provocaria, mas também de trabalhar com grupos de artistas. Queríamos abrir quatro turmas: espectadores, artistas, crianças e adolescentes. A gente não conseguiu formar a turma de crianças, rodamos 38 escolas e não conseguimos levar uma criança para aquela atividade. Os adolescentes também fugiram da gente. Formamos na verdade dois grupos híbridos de artistas, estudantes e não artistas. Todo o trabalho era de repensar os elementos.

Vou falar de uma coisa que a Beth disse que é a questão da materialidade do espetáculo Cabras. Essa questão da materialidade para nós é cara, mas não no sentido contemporâneo, porque tem também a ver com a formação da companhia, que há 16 anos tem o mesmo cenógrafo e figurinista. Essa participação do dramaturgo, do cenógrafo, não é só no sentido colaborativo, mas é também a intervenção dentro de outro plano de diálogo com os atores. Do ator ser convidado quando pensa o seu estudo, seja um texto pronto, um do Abreu, seja de um outro recurso textual ele pensar sempre onde estará esse espectador.

Onde é que vamos estar, nós que vamos assistir? Porque essa relação é também uma relação criativa para o ator e também provocativa. E para ele pensar também naquele estudo não só a partir da dramaturgia do texto que ele vai dizer, mas se vai ter uma luz e de onde ela vem, se vai usar uma roupinha. O ator passa por essa múltipla perspectiva da dramaturgia, dos figurinos. Eu acho que quando a gente problematiza a nossa prática dessa forma é sempre no sentido de sermos o primeiro espectador.

Eu me considero, como encenadora, o primeiro espectador. Essa é minha tarefa fundamental. Portanto eu tenho que estar atenta a todas essas vozes que estão aí porque depois sou eu quem vou ter que, de alguma maneira, fazer algumas escolhas e cortes que são muito radicais. Dizer não para o Abreu não é fácil. Mas eu não digo não antes dos atores experimentarem. Vai primeiro para o ator. Aí o Abreu passava direto para os atores, para que essa espectadora aqui não entrasse de cara. Eles faziam, eu olhava e dizia que não ia entrar, mas não dizia na hora. Deixa experimentar.

Eu realmente aprendi teatro como espectadora. Eu saí do sertão da Bahia e eu não tinha cultura teatral quando eu cheguei no Rio de Janeiro. Eu, com 20 anos, já dava aula para atores. Mas minha grande escola foi ver teatro todo dia e ver de tudo. Então, isso marca a minha formação e minha prática artística. E no nosso coletivo temos o privilégio de trabalhar com gente experiente, o Abreu é o sujeito que já nos impulsiona a olhar o material de outra maneira, o Marcio [Medina], e todos os outros parceiros que vão entrando. Eu falo dos dois porque são as histórias mais longevas que a gente tem.

Depois desse projeto de Formação do Olhar para o Teatro, passou a ser então uma condição pra gente pensar os próximos projetos. Aí veio Prometheus, talvez o nosso espetáculo que mais apresentações fez. Depois veio Recusa e espero que Cabras também se desdobre. Quando resolvemos fazer o espetáculo como um protótipo, aí a gente olha e vê que essa versão não dá, a gente joga cenário e figurino fora e começa tudo de novo, e começa a rodar pelas sedes de companhias parceiras na cidade de São Paulo mostrando coisas inacabadas.

Fizemos Prometheus numa escola em ruínas do [Grupo] XIX, nos Fofos (na sede da Companhia Os Fofos Encenam), e descobrimos as cortinas que depois ficaram no espetáculo. E para cada lugar desses o público era completamente diferente. Em Cidade Tiradentes [bairro do extremo leste da cidade] não era o espectador de teatro, era a comunidade; pessoas que também tinham acesso à arte ali pelo [Grupo] Pombas Urbanas, mas que não eram de teatro, ficavam filmando e a gente teve que lidar com isso.

Veio uma menina de uns 12 anos, no final, e perguntou: “Quem foi que inventou esse negócio?”. Alguém falou que tinha sido eu, pois falei que eu era a diretora. E ela disse que gostou porque ia para casa pensar e resolver o problema. E eu pensei que ela era a minha espectadora ideal porque o entendimento, para mim, é um atributo que vem depois da experiência.

E eu sou bem obsessiva como artista, quando eu vejo uma obra, penso na questão da eficácia. Onde está a eficácia da linguagem? É como ela consegue mover quem vê. Afinal, falamos de uma arte que tem essa complexidade: é texto, é som, é visão, é audição, é sentidos, é espaço. Então, eu como artista quero produzir algo no sentido de provocar a experiência para que a partir daí ele possa construir o seu entendimento.

A outra experiência importante com o Prometheus foi quando nós saímos de São Paulo e começamos a ouvir o que o espectador ouvia. Tinha lugares no Nordeste em que que o público saía do espetáculo falando o texto. Eles guardavam o texto, decoravam o texto ali na hora, ouvindo, complexo. A minha pergunta era: “Será que os nordestinos estão acostumados com a oralidade, escuta, que consegue adentrar a palavra nesse outro lugar?”.

E depois, aqui em São Paulo, o espetáculo cresceu muito, já não tinha essa reclamação do não entendimento tão generalizada porque acho que o nosso espectador também está mudando, está em processo. Acho que hoje a nossa relação com o espectador vai além da linguagem e vai ter que entrar – a gente sabe disso – no âmbito econômico, que é voltar a pensar que esse sujeito é quem vai bancar a nossa profissão.

A questão do espectador está sim ligada a isso, também a uma lógica que foi se tornando cada vez mais extensiva de lidar com o espectador como algo quase dispensável no nosso fazer. Nós, como companhia, estamos também no meio desse problema. Nós também sobrevivemos e a companhia ainda existe por conta dessas mudanças que tiveram, mas acho que esse problema aponta para todo mundo.

Do ponto de vista pedagógico, porque minha trajetória é sempre ligada à formação de atores, esse projeto de formação do olhar para o teatro tenho tentado fazer, inclusive no Itaú Cultural, voltado para os funcionários dos CEUs. Por quê? As pessoas que trabalham nos CEUs não têm nenhuma formação como espectador, tem gente que nunca foi ao teatro. E a gente descobriu isso durante esses três meses no Itaú. E a gente reclama muito que a gente vai a esses espaços e eles [público] não compreendem as nossas necessidades, mas a gente também não compreende a realidade deles.

Existe uma tensão que é de vocabulário, de formação, e por conta disso a nossa circulação, pelo Prêmio Zé Renato, previu uma maneira de adentrar o espaço e que não fosse só de apresentar o espetáculo e ir embora. Então, pensamos três ações: montar, chamar e desmontar. Muitas ações estão sendo pensadas para que a gente possa convidar, por exemplo, andar com as rabecas tocando pelo bairro.

Nos CEUs, para segurar público, eles tentam buscar escolas. E em um desses centros a gente conseguiu fazer de outra forma, um dia com escola e no outro arriscar fazer com comunidade. E acho que são esses riscos que, de alguma forma, a gente vai ter que começar a experimentar. E a questão do espectador passa por aí: um pensamento mais pedagógico e um pensamento pedagógico-artístico dentro e com material da própria companhia.

Emílio – ator

Como encenadora, como é que você lida hoje quando não está na companhia?

Maria Thaís

Hoje eu sou a Balagan, mas a Balagan não sou eu. Eu sou a Balagan porque ela se tornou o centro das minhas atividades, inclusive da minha pesquisa acadêmica. Então, nos últimos anos eu não fiz mais trabalhos fora.

Eu passei quatro anos preparando um espetáculo e tive 20 dias para levantar dois espetáculos, um de rua e outro de cena. Essa prática da encenação como profissão, eu na verdade nunca tive e nem sei se tenho interesse nela não.

Eu estou dirigindo a Mariana Muniz e está sendo uma experiência incrível porque me desloca, não estou na segurança de onde estou, o próprio tema me lança [Fados e outros fins estreou em março de 2017]. E tem um lugar geracional porque por muitos anos a minha troca mais direta na cena foi com atores de uma determinada geração e, de repente, eu estou dialogando como diretora de atores com outra história que muda inteiramente a tua fala, a tua linguagem, as tensões e com uma linguagem híbrida. É um espetáculo de dança com uma dançarina que falou que não queria dançar, mas que é atriz também.

Mas eu não tenho nada contra a fazer essa experiência não, até porque antes da Balagan centralizar um pouco mais a minha ação eu gostava muito de trabalhar com outros diretores.  Eu diria que gosto menos de pensar em dirigir por aí, porque para mim direção está muito ligada a esse processo criativo; à pedagogia, não como escola, mas como a investigação; a essa troca com pessoas que têm essa grandeza, mas eu gosto muito de fazer o trabalho de preparação de atores para outros diretores, que foi uma coisa que eu trabalhei por muitos anos. Isso eu espero voltar a fazer, que é essa preparação mais corporal, a preparação da linguagem do ator numa relação que está mais ampla e que não está sendo regida por mim.

Anderson Maurício – diretor da Trupe Sinhá Zózima

Me veio uma imagem no sentido do ator, esse que vai dizer o texto e promover o encontro com o espectador. A metáfora de que a palavra é um fruto, que eu vou doar para esse público. E em algum momento [em Cabras] eu via essa raiz, essa palavra que fazia morada nesse corpo e que seria presenteada para esse público. E às vezes não. E isso foi uma questão que eu levei para casa.

Tem muita coisa que eu não sei, que estou descobrindo. Para mim, há uma deficiência muito grande nas escolas para lidar com a palavra, a narrativa e o canto (Maurício Schneider, ator da Balagan)

Maria Thaís

A sustentação de uma obra é muito difícil pela sutileza. E existem diferenças de atores ao lidar com a palavra, alguns com facilidade maior com o corpo, com o instrumento, outros menos, e a minha tarefa é tentar equalizar isso. Tem uma questão para mim como encenadora que é reconhecer esse problema, reconheço vários problemas na música, na execução, na elaboração, no tempo do acabamento, mas eu gosto muito dessa variedade.

Assumo essa variedade como um desafio para mim, desafio de trabalhar com pessoas e com atores e com matérias, com textos, com cores das luzes e que muda o espetáculo inteiro. Eu gosto disso. Gosto da contingência porque ela faz você transformar e acredito no amadurecimento porque tem coisas que estão muito justas hoje e que daqui a pouco estarão fixadas e mortas. Tem mangas que apodrecem no pé. E tem outras verdinhas que se ficarem lá, no seu lugar ao sol, tomando água, vão amadurecer.

As potências e as deficiências do espetáculo como um todo são parte do espetáculo e elas são o que dá a ver o espetáculo. E se isso acontece eu acredito que o espetáculo pode ficar vivo, ele não se resolve, não está resolvido. Eu hoje não vejo o espetáculo, eu gosto mais de ouvir. E tem tanta coisa que eu não sei o que dizer, o que fazer, então eu deixo lá para que o ator talvez um dia rompa. Ou não. Acho que é tempo.

Luís Alberto de Abreu

E isso é característico do teatro, essa linguagem viva. No cinema você colhe as melhores coisas e fixa pra eternidade; televisão a mesma coisa; literatura também. Mas no teatro não. O ator tem dias diferentes. A gente vai assistir duas vezes o mesmo espetáculo e não é o mesmo. E para o espectador isso é muito legal, é vivo. E as pessoas olham e dizem que isso é defeito. E não.

Maurício Schneider – ator da Balagan

Acho que o que a Thaís e o Abreu propõem é de uma complexidade tão grande. A Thaís é a primeira espectadora, mas eu também percebo a necessidade da gente ser espectador porque é tanta matéria, tanta coisa e eu não tenho consciência do que está acontecendo no geral ainda. Tem muita coisa que eu não sei, que estou descobrindo. Para mim, há uma deficiência muito grande nas escolas para lidar com a palavra, narrativa, canto. É uma complexidade organizar essa polifonia e é assustador em muitos momentos saber que você vai correr, levantar do chão e acertar uma nota ainda. Eu toco rabeca e eu nunca toquei nada na vida. Então acho que a beleza no teatro está nisso. E é muito bom que a gente não supere coisas. Chegar nesse grande círculo do Cabras é um desafio imenso, não só para quem vê, para mim também que estou lá todo dia. Acho que fazer teatro é inverter perspectiva, é ter paradigma e o ator está na linha de frente disso. Nenhum conceito se sustenta se não for ali, na hora.

Eduardo Frin – pesquisador

Abreu, você vê um novo momento no processo da dramaturgia, de ser ainda mais polifônico e de não se restringir a propor as imagens para o espectador?

Luís Alberto de Abreu

Com certeza. Nessa pesquisa toda, a gente vai avançando. E a gente não avança a narrativa se não avançar o narrador. A palavra não é nada, é um instrumento, é um signo de muitas coisas e essas coisas todas que estão atrás da palavra tem que ter um narrador. Então está avançando nesse sentido, e é ótimo. Eu não sou um escritor, eu sou um dramaturgo. Então a minha narrativa precisa de narradores e que para mim é um lugar muito grato, participativo, coletivo.

Se daqui 50 anos alguém pegar esse texto, vai ter que fazer um trabalho além da palavra, além de cuspir imagens no público. Não é essa a questão. Porque se for assim eu gravo tudo em casa e entrego para cada um as imagens. Mas precisa essa consistência do narrador, precisa da imaginação. As palavras para mim valeram enquanto eu as imaginei, vibrei, imaginei e transformei essa imaginação em palavra. E ator tem que fazer a mesma coisa, porque senão não chega até o público.

O espírito também é matéria e sutil como a própria imaginação, chega até o público. E aí o público transforma aquilo em matéria palpável para a experiência dele. É nesse sentido que temos avançado. É uma experiência para quem faz e para quem partilha daquilo também. E isso fica cada vez mais claro.

.:. Leia a crítica de Beth Néspoli a Cabras – Cabeças que voam, cabeças que rolam

.:. Leia a íntegra de outras edições do Encontro com o Espectador, desde junho de 2016

https://www.facebook.com/ciateatrobalagan/videos/900567036719010/

Equipe de criação:

Direção: Maria Thaís
Autoria: Luís Alberto de Abreu
Dramaturgia: Luís Alberto de Abreu e Maria Thaís
Com: André Moreira, Deborah Penafiel, Flávia Teixeira, Gisele Petty, Gustavo Xella, Jhonny Muñoz, Maurício Schneider, Natacha Dias, Val Ribeiro e Wellington Campos
Cenografia e figurino: Márcio Medina
Direção musical: Dr Morris
Preparação musical (Rabecas): Alício Amaral
Iluminação: Aline Santini
Assistente de direção: Murilo De Paula
Operação e montagem de luz: Michelle Bezerra
Direção de palco: Rogério Santos
Divulgação: Patrícia Boudakian
Design gráfico: Regina Cassimiro
Produção executiva: Leonardo Devitto
Direção de produção: Géssica Arjona

Pela equipe do site Teatrojornal - Leituras de Cena.

Relacionados