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Folha de S.Paulo

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São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2006

TEATRO 

Tradicional reduto do cinema, a avenida se consolida também como espaço para as artes cênicas, em locais como o Sesc e o Itaú Cultural
 

Unidade Provisória herdou vocação para encontro ao vivo com a arte, também possível no Centro Cultural Fiesp e na Casa das Rosas
 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local

O drama é cada vez mais forte entre o Paraíso e a Consolação. Com seis endereços para cinema, a avenida Paulista também consolidou, nos últimos tempos, espaços e públi- cos cativos para a dança e o teatro.

Invariavelmente nervosa, dado o vaivém de pessoas e veículos -ou por causa do congestionamento mesmo-, a centenária Paulista, com seus 115 anos recém-completados, tem lá sua reserva de arte que pede o encontro ao vivo.

São quatro locais em que o espectador se depara com espetáculos inclinados ao experimento nos campos da encenação e da dramaturgia. Ou seja, não têm o apelo de comédias “fáceis” com rostos conhecidos da televisão.

A exceção deste perfil é um quinto teatro, o da Gazeta, que está em recesso e volta em janeiro. Até dois anos atrás, havia ainda a sala do Centro Cultural Santa Catarina, mas a programação teatral está suspensa.

Inaugurada em abril, a Unidade Provisória Sesc Avenida Paulista, no edifício de 15 andares onde funcionava a sede administrativa do Serviço Social do Comércio em São Paulo, aos poucos tornou-se referência. Herdou a vocação do Sesc Belenzinho para uma intensa e elogiada programação em artes cênicas. A unidade da zona leste passa por reformas e deve reabrir apenas em 2009.

No “condomínio”, os andares do 9º ao 12º são adaptados ao sabor de cada criação. Com freqüência, as cenografias incorporam o “skyline” da paisagem de concreto avistada pelos janelões. Não existem palcos, e sim espaços não-convencionais em que a disposição da platéia e da cena são variáveis (de 40 a cem lugares).

Neste domingo, o cartaz do Sesc Paulista, em pleno final de temporada, elenca três peças e uma coreografia (veja a programação ao lado).

“Na Paulista, convive-se com passantes de todas as naturezas, o trabalhador, o mendigo, o curioso, enfim, é uma avenida cuja exuberância é ligada à capacidade constante de transformação”, diz a gerente da unidade, Elisa Maria Americano Saintive, 51, que anuncia um café no piso, em janeiro, e comedoria no 15º, em maio.

Territórios cênicos
Os vizinhos Itaú Cultural e Casa das Rosas também são territórios cênicos. Aquele, mais pontualmente. Esta abre as portas inclusive para a escrita teatral, com seu Centro de Dramaturgia Contemporânea e com a residência recente da Cia. dos Dramaturgos.

Uma das suas integrantes, a diretora Paula Chagas, faz hoje a última apresentação da peça “Pé na Estrada”.

Inaugurado em 1963, o Teatro Popular do Sesi (TPS) tem a sala batizada com o nome de seu ex-diretor e fundador, Osmar Rodrigues Cruz, 82. Trata-se de endereço cultural dos mais antigos da avenida, hoje incorporado ao Centro Cultural Fiesp.

“Timão de Atenas” encerrou na sexta-feira sua temporada no TPS, Shakespeare protagonizado por Renato Borghi. No mezanino do Centro Cultural Fiesp, o Núcleo Experimental do Sesi apresenta até hoje “Quem Nunca”, com direção de Renata Melo.

Já não se vêem as costumeiras e espichadas filas para o TPS no número 1.313 da av. Paulista. Agora, é preciso pagar para assistir às sessões de sexta-feira e de sábado; a retirada de ingressos gratuitos para quinta-feira e domingo se dá a partir das 12h.
Atento à agenda do corredor cênico, o público encontra seu modo de contracenar.
 

 

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São Paulo, quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

TEATRO 
As cias. dos Atores e Os Satyros têm publicadas suas trajetórias em torno da experimentação cênica e dramatúrgica 

Os Satyros contou com um integrante jornalista para relatar sua história; a cia. carioca organizou visões de atores e pesquisadores

VALMIR SANTOS 
Da Reportagem Local 

O teatro brasileiro contemporâneo ainda está aquém da maioridade editorial. Mas a cultura de teatro, cultura de ler e ver, tenta cada vez mais transcender à cena. Um dos indícios é a convergência de lançamentos de livros sobre dois importantes grupos de teatro do país, um do Rio de Janeiro e outro de São Paulo: “Na Companhia dos Atores – Ensaios Sobre os 18 Anos da Cia. dos Atores” e “Os Satyros – Um Palco Visceral”. 

São publicações que reafirmam a importância do movimento de teatro de grupo no Brasil, dos anos 90 para cá. O registro é parte inerente da criação e da reflexão. 

Edição conjunta da Aeroplano e da Senac Rio, “Na Companhia dos Atores” foi organizado por Enrique Diaz (ator e diretor), Fabio Cordeiro (co-diretor) e Marcelo Olinto (ator e figurinista). Com projeto gráfico caprichado, cujas imagens dialogam com a inquietação e a irreverência características da história da companhia, o livro procura dimensionar a importância desse agrupamento de artistas na cena carioca dos últimos anos. E o faz não apenas pela voz dos seus integrantes, mas amparado em pontos de vista, às vezes dissonantes, de pesquisadores como Clóvis Dias Massa, Cristina Ribas, Fátima Saadi, Silvana Garcia e Silvia Fernandes. 

O olhar retrospectivo não surge de modo linear, mas entrecortado por depoimentos, ensaios e sobretudo fotografias dos espetáculos, imagens que têm igual peso na narrativa. 

Na introdução, Diaz inicia sua “fala” com reticências, sinal de que a “obra aberta” é uma das premissas. É divertido o relato da peça de origem, “Marat/Sade” (1988), livre adaptação da obra de Peter Weiss, erguida “com três atores, cinco refletores de 500 W, uma piscina tony com um pano preto para disfarçar o azul do plástico. E um guitarrista convidado. E pijamas. E era bom”. 

Ainda que fruto da reunião de amigos interessados em pesquisar algumas coisas sobre pessoas que admiravam sem as conhecer, como os pensadores e criadores de teatro Tadeusz Kantor, Bob Wilson e Meyerhold, a base teórica não era tratada com displicência, nunca foi; fazia parte do jogo que vai dar em concepções bem-sucedidas, como nas visitas à obra de Oswald de Andrade, “nosso parceiro e referência”, “permanente coringa das artes e das letras”, na voz de Diaz: “A Morta” (1992) e “O Rei da Vela” (2000). 

Ou a obsessão pela realidade da cena, no “duelo” entre a pesquisa e o como trazê-la a público, embates das inquietantes montagens de “A Bao A Qu -Um Lance de Dados” (1990), “Melodrama” (1995) e “Ensaio.Hamlet” (2004). 

Praça Roosevelt
A Companhia de Teatro Os Satyros ruma para os 18 anos, em 2007, com forte presença na cena da cidade de São Paulo. 

Radicada há cinco anos na praça Franklin Roosevelt, região central, transformou a geografia humana local sobretudo pelo vetor da arte do teatro. São dois espaços com programações de segunda a segunda, abertos a outros grupos. Predominam as peças de caráter experimental no texto, na direção ou na interpretação. 

Em “Os Satyros – Um Palco Visceral”, que sai pela Imprensa Oficial (coleção Aplauso), o jornalista, crítico e ator Alberto Guzik reconta a história do grupo dando voz a seus fundadores, o diretor Rodolfo García Vázquez e o ator Ivam Cabral. 

“A palavra fica na boca do Rodolfo e do Ivam, na forma de uma longa conversa em que procurei ficar o mais invisível possível”, diz o autor, há três anos integrado ao elenco. Entre as montagens marcantes de Os Satyros, grupo também de Curitiba, estão “Sades ou Noites com os Professores Imorais” (1990), depois “Filosofia na Alcofa”, cuja remontagem está em cartaz; “Antígona” (2003); e “A Vida na Praça Roosevelt” (2005). A mesma Imprensa Oficial lança “O Teatro de Ivam Cabral – Quatro Textos Para um Teatro Veloz” (R$ 15, 280 págs.), onde o ator mostra sua face de dramaturgo.



Na companhia dos Atores – Ensaio sobre os 18 anos da Cia. dos Atores
Organizadores:
Enrique Diaz, Fabio Cordeiro e Marcelo Olinto 
Editora: Aeroplano/Senac Rio 
Quanto: R$ 65 (387 págs.) 

Os Satyros – Um palco visceral
Autor:
Alberto Guzik 
Editora: Imprensa Oficial 
Quanto: R$ 15 (344 págs.) 
Lançamento: amanhã, às 19h 
Onde: Espaço dos Satyros 1 (pça. Franklin Roosevelt, 214, tel. 0/xx/11/ 3258-6345) 

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São Paulo, sexta-feira, 08 de dezembro de 2006

TEATRO 

VALMIR SANTOS
Enviado especial a Campinas 

Nascida há três anos, a Redemoinho (Rede Brasileira de Espaços de Criação, Compartilhamento e Pesquisa Teatral) passa a atuar como movimento de representação política. Foi o que decidiram 55 grupos reunidos durante três dias em Campinas, entre segunda e anteontem. O documento do terceiro encontro nacional bate na principal lei de incentivo fiscal do país, a Rouanet, de 1991, que permite às empresas patrocinar por meio de dinheiro público (dedução no IR).

Segundo o texto, “por atender a interesses privados, norteados pelos departamentos de marketing das empresas, a lei se mostra concentradora de renda e submete a esfera da produção simbólica aos interesses mercantis”.

Entre as reivindicações, a mais imediata é pela aprovação do projeto de lei federal Prêmio de Fomento ao Teatro Brasileiro. Também foram sugeridos programas de circulação de grupos e de cessão de espaços. A Redemoinho (www.redemoinho.org) elegeu conselho nacional com integrantes do Galpão (MG), Ói Nóis Aqui Traveiz (RS), Teatro Vila Velha (BA), Ensaio Aberto (RJ), Folias d’Arte (SP), Engenho Teatral (SP) e Barracão Teatro (Campinas) 

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São Paulo, quarta-feira, 06 de dezembro de 2006

TEATRO 
Além de ensaios de “Západ”, projeto realiza encontros públicos com artistas 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

No teatro paulistano de agora, a etapa de ensaio já não constitui território indevassável. Com freqüência, o espectador compartilha o processo de criação de grupos que fazem da atividade profissional um campo recíproco de conhecimento. 

O novo trabalho da Companhia de Teatro Balagan, “Západ – A Tragédia do Poder”, é exemplo disso. Com encenação de Maria Thaís, o grupo faz oito ensaios abertos gratuitos a partir de amanhã, no Tusp -onde estréia em 11 de janeiro. 

Desde a semana passada, quando a Balagan (dez anos em 2007) abriu residência no local, o público acompanha uma série de encontros com pensadores e artistas, como o encenador e pedagogo russo Jurij Alschitz. “É um projeto que divide com o espectador comum e com artistas que participam de workshop aquilo que nos formou”, diz Thaís, 46. 

Palavra de origem russa, “západ” significa “ocidente”. Thaís viveu por cerca de cinco anos em Moscou, onde integrou a equipe do encenador e pedagogo Anatoli Vassiliev. “Západ” diz respeito à clausura humana gerada pelo poder, daí o vínculo com as montagens de “Sacromaquia” (2000) e “Tauromaquia” (2004), que tratavam da condição de isolamento nos universos feminino e masculino. A esses espelhos invertidos, soma-se uma terceira via que independe de gênero. 

O mote são as correspondências trocadas no século 16 entre o czar russo Ivan, o Terrível, e a rainha inglesa Elizabeth 1ª. Recorrendo não às cartas em si, mas ao imaginário arquetípico e alegórico, os dramaturgos Alessandro Toller (inspirado na imagem da juventude sem potência), Newton Moreno (a vida adulta como representação) e Luís Alberto Abreu (a maturidade como reflexão) escreveram três histórias ou movimentos distintos. Os sete atores e demais criadores da Balagan constroem uma reflexão atemporal dos interstícios do poder público, num espaço público e com verba pública (Lei de Fomento). 

Um espetáculo que se quer meio, não fim em si mesmo. 

Programação paralela
O grupo também organiza encontros temáticos, sempre às 18h, na sala 100 do Centro Cultural Maria Antonia, mesmo endereço do Tusp. Participam os professores da USP Gilberto Safra (“A Memória do Humano: A Contribuição de Alguns Pensadores Russos”, hoje); Wanderley Messias da Costa (“Território e Poder”, amanhã); Sérgio Cardoso (“Sobre a Servidão Voluntária”, sexta) e o escritor e tradutor Paulo Bezerra (“A Experiência Russa”, dia 15). 

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São Paulo, sábado, 02 de dezembro de 2006

TEATRO 
Companhia questiona, em “O Círculo de Giz Caucasiano”, de Bertolt Brecht, a quem cabe o direito à propriedade de terra 

Peça dirigida por Sérgio de Carvalho alude à questão agrária com exibição de curta-metragem feito em acampamento de sem-terra 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Quando assistiu a uma montagem de “O Círculo de Giz Caucasiano” pela lendária companhia alemã Berliner Ensemble, em 1955, o pensador francês Roland Barthes (1915-1980) escreveu que a peça “realiza uma dupla intenção do teatro de Brecht: despertar e alimentar a consciência política do espectador e, ao mesmo tempo, garantir seu prazer mais franco, pois o teatro é feito para divertir”. 

Francamente mais à esquerda daquela definição de Barthes, a Companhia do Latão repõe o texto na roda meio século depois da morte do poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956). Bússola do teatro épico-dialético cultuado em seus primeiros dez anos de história, completados em 2007, o grupo só havia encenado uma peça do autor, “Santa Joana dos Matadouros” (1998), ainda que se deixe contaminar por ele em todas as criações. 

Estréia hoje no Sesc Avenida Paulista a montagem de “O Círculo de Giz Caucasiano”, assinada por Sérgio de Carvalho e vinda de temporada no Rio. 

Já no prólogo, a questão política está dada: a quem cabe o direito à propriedade da terra? A encenação opta por atualizar o texto, escrito nos EUA durante o exílio do autor, entre 1944 e 1945 (final da 2ª Guerra). É projetado um curta-metragem feito por camponeses do grupo Filhos da Mãe Terra, do assentamento Carlos Lamarca do MST em Sarapuí (SP). 

Num mundo rural arcaico, agricultores e criadores de cabras disputam a posse de um vale fértil; uma discussão entre aqueles que nele trabalham e os que o abandonaram. “O prólogo e a peça como um todo questionam o sistema jurídico apoiado na propriedade, uma noção burguesa”, afirma Carvalho, 39, à vontade com uma dramaturgia assentada em ideais marxistas e comunistas. 

Fábula e reviravolta
“O Círculo de Giz Caucasiano” é dividido em duas partes. A primeira, em tom de fábula, narra a fuga de Grusha (Helena Albergaria) por várias regiões. 

Ela é a empregada que toma conta de uma criança abandonada pela mãe, mulher do governador, durante uma revolução palaciana. Na segunda parte, reviravolta: a mãe biológica reivindica a posse da criança, aqui como metáfora da terra do prólogo, e cabe ao juiz Azdak (Ney Piacentini), agora na chave da farsa, decidir se Grusha fica com ela ou não. Um beberrão que ascendeu da classe baixa, ele espelha a desconformidade patética da própria justiça. 

Azdak risca um círculo de giz no chão, coloca o menino no centro e pede às duas mulheres que o puxem cada uma por um braço. Aquela que o tirasse do círculo ficaria com a guarda. 

Grusha evita a força para não machucá-lo, o que põe o desfecho em suspense. A música é fundamental na narrativa. Martin Eikmeier compôs 21 canções e as executa ao lado de Mafá Nogueira, com instrumentos como piano, violoncelo e rabeca. Entre os dez atores, há convidados de outros grupos (Companhia São Jorge de Variedades, Núcleo Argonautas e Teatro do Pequeno Gesto). 



O círculo de giz caucasiano 
Onde:
Unidade Provisória do Sesc Avenida Paulista (av. Paulista, 119, tel. 3179-3700) 
Quando: estréia hoje, às 20h; sex., sáb. e dom., às 20h. Até 21/1 (não haverá apresentações entre 23 e 31/12) 
Quanto: R$ 7,50 a R$ 15 

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São Paulo, quinta-feira, 30 de novembro de 2006

TEATRO 

Montagem inédita com atores brasileiros estréia hoje no Sesc Vila Mariana
 

Peça conjuga “Anjo Negro”, de Nelson Rodrigues, e Missão – Lembranças de Uma Revolução”, do autor alemão Heiner Müller

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

 
“É como colocar dois pit bulls frente a frente”, diz Frank Castorf, 55. O diretor alemão do Teatro Volksbühne, dado a experimentos cênicos que desconcertam público e crítica, volta ao Brasil para conjugar a “antropofagia” de Nelson Rodrigues (1912-80) com “a sombra política e social da história” em Heiner Müller (1929-95). 

“Anjo Negro de Nelson Rodrigues com a Lembrança de uma Revolução: A Missão de Heiner Muller” é o título-mix que suprime vírgulas para friccionar ainda mais os dois autores. A curta temporada abre hoje no Sesc Vila Mariana. 

Os pontos de convergência entre as peças, conforme Castorf, se dão pelas questões de racismo. Em “Anjo Negro” (1946), o casal Ismael (ele preto, mas interpretado pelo branco Roberto Audio) e Virgínia (branca, mas vivida pela atriz e cantora negra Denise Assunção) nutrem ódio que é ancestral e vaza para seus filhos -os três primeiros meninos são assassinados pela mãe, enquanto a única menina, fruto da traição de Virgínia com o cunhado, viverá uma relação incestuosa com Ismael, o padrasto. 

Em se tratando de Nelson, as poucas linhas anteriores não dão conta do emaranhado de fatalidades sem fim, inclusive com direito a um coro à moda do teatro grego antigo. 

Consciência
A esse texto, Castorf aplica excertos de “A Missão – Lembrança de uma Revolução” (1979), como a dar “consciência crítica e política” aos personagens do brasileiro. Müller projeta contextos de uma revolta dos escravos na Jamaica, pós-Revolução Francesa (1789). 

Três emissários são incumbidos de incitar a rebelião dos negros contra a coroa britânica. O trio, ele mesmo com suas diferenças de classe e de raça, é formado por um escravo liberto do Haiti, um camponês da Bretanha e o filho de escravocratas jamaicanos. A ascensão de Napoleão, porém, mina tudo. 

“Não estou aqui como um bicho exótico. É bom a gente imiscuir-se em coisas que não nos cabem. Pode ser interessante contrapor Nelson a Müller”, diz Castorf, que trouxe recentemente “Estação Terminal América” (versão de “Um Bonde Chamado Desejo”, de Tennessee Williams) e “Na Selva da Cidade”, de Brecht. 

Amanhã, ele, o diretor Antônio Araújo (conselheiro de elenco com artistas de vários grupos) e o jornalista Mario Vitor Santos conversam sobre a montagem em encontro gratuito. Sincronicidade: em Porto Alegre, o grupo Ói Nóis Aqui Traveiz recentemente estreou sua “A Missão” e encerra hoje seminário dedicado a Müller. 



Anjo negro
Quando:
estréia hoje, às 21h; sex. e sáb., às 21h, e dom., às 18h. Até 10/12 
Onde: Sesc Vila Mariana – teatro (r. Pelotas 141, tel. 0/xx/11/5080-3000) 
Quanto: R$ 7,50 a R$ 20,00

Encontro com Frank Castorf 
Onde:
Sesc Vila Mariana – auditório 
Quando: amanhã, às 18h30 
Quanto: entrada franca

 

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São Paulo, sábado, 25 de novembro de 2006

TEATRO 
Espetáculo de performance dirigido por Christiane Jatahy mistura ficção e realidade durante o preparo de um jantar 

Ao redor de uma mesa, cinco personagens compartilham pequenos segredos que podem ser fictícios, vindos dos atores ou até da platéia 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Peça-performance. É assim que a diretora Christiane Jatahy e sua cia. Vértice de Teatro, formada no Rio de Janeiro em 2000, definem sua mais recente montagem em que os atores são personagens, mas também eles mesmos, borrando ficção e realidade. 

Esse é o ponto de partida de “A Falta Que Nos Move ou Todas as Histórias São Ficção”, que iniciou temporada ontem no Sesc Avenida Paulista. Em “A Falta Que nos Move…”, nunca se sabe se os cinco atores estão representando ou improvisando em cena. Durante o preparo de um jantar, em tempo real, eles contam histórias para o público, relacionam-se e ainda operam luz e som. Segundo Jatahy (a mesma de “Leitor por Hora”, 2006), que também assina dramaturgia, o espetáculo toca em temas como a geração submetida à ditadura militar (1964-85) e a família com seus padrões de relação. 

O título é baseado em uma frase do filósofo polonês Arthur Schopenhauer (1788-1860), sobre a falta (no sentido de ausência) como propulsora do desejo que move os indivíduos em direção ao outro e em direção à vida. 

Co-autoria
Na peça-performance, também cabe ao espectador o papel literal de co-autor. Quando entra no teatro, no 10º andar do prédio do Sesc, recebe um guardanapo no qual pode deixar registradas as suas histórias. 

“Vamos trocando algumas histórias contadas na peça por novas histórias deixadas pelo público”, diz Jatahy. O elenco é formado pelos atores-criadores Cristina Amadeo, Mariana Vianna, Pedro Brício, Kiko Mascarenhas e Roberta Gualda. A cenografia é Marcelo Lipiani. 



A falta que nos move ou todas as histórias são ficção
Onde:
Unidade Provisória Sesc Avenida Paulista (av. Paulista, 119, tel. 0/xx/11/ 3179-3700) 
Quando: sex., sáb. e dom., às 21h. Até 17/12 
Quanto: R$ 7,50 a R$ 15 

Folha de S.Paulo

São Paulo, sexta-feira, 24 de novembro de 2006

TEATRO

VALMIR SANTOS

Da Reportagem Local 

Do epicentro Nova York, nos anos 70, passando pela chegada à França, na década seguinte, e com forte recepção no Brasil, também nos anos 80 e 90, a cultura hip hop não só expande seu território como cada vez mais interage com outras artes. 

“Hoje, o que está em jogo na dança hip hop é continuar a explorar diferentes correntes artísticas inspiradoras da história da dança contemporânea”, afirma o bailarino e coreógrafo francês Hamid Ben Mahi, filho de imigrantes argelinos, que faz esta noite a última apresentação do solo “Chronics(s)” no Sesc Ipiranga, em São Paulo. 

A palavra em cena
O projeto marca o encontro de Ben Mahi, de formação básica autodidata, com o diretor de teatro Michel Schweizer, também francês. O espetáculo intercala decomposição, misturas e combinações nos movimentos do corpo (inclusive releitura da dança clássica) ao mesmo tempo que faz uma reflexão sobre o sentido da palavra em cena. 

Projeções em vídeo apóiam as narrativas gestuais e verbais na chave do depoimento pessoal e de assuntos polêmicos, como o racismo e a xenofobia. 

“A cultura hip hop nasce da urgência. A urgência de experimentar e de reivindicar sua existência”, afirma Ben Mahi, fundador da cia. Hors Série. 

“Ela é universal e onipresente em todas as artes: o teatro, a música, as artes de rua, o circo, o cinema”. 

Para o adido cultural da França em São Paulo, Philippe Ariagno, o trabalho de Ben Mahi soma-se às passagens recentes pela cidade do bailarino e ator francês Pierre Rigal (“Erection”) e do cenógrafo Philippe Quesne (“La Démangeaison des Ailes”), artistas adeptos do hibridismo na arte. 

Para Ariagno, “Cronic(s)” é uma “resposta perfeita aos acontecimentos que inflamaram as periferias das cidades francesas meses atrás”.



Chonic (s) 
Onde: Sesc Ipiranga (r. Bom Pastor, 822, tel. 0/xx/113340-2000) 
Quando: hoje, às 21h 
Quanto: R$ 3 a R$ 12 

Folha de S.Paulo

São Paulo, quinta-feira, 23 de novembro de 2006

TEATRO

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

Na França, existem hoje cerca de 1.600 companhias teatrais em atividade. Contam-se nos dedos aquelas que se aproximam do que, no Brasil, dos anos 90 para cá, se afirma como uma cultura de teatro de grupo.

Quem dá notícias da cena contemporânea daquele país de tradição secular nos palcos é o filósofo e ensaísta belgo-francês Bruno Tackels, 40.

Tackels participou em São Paulo do Próximo Ato, encontro ocorrido no último final de semana (realização do Itaú Cultural em parceria com representações da Alemanha, Espanha, França e Reino Unido).

“Nos anos 80, floresceram vários grupos, mas a maioria não é exatamente independente, pois depende de dinheiro para criar co-produções nos espaços públicos que ocupam. Isso não torna possível o trabalho coletivo e contínuo”, disse Tackels durante sua estada.

Durante quatro dias de encontro, mergulhou-se em questões relativas às especificidades do teatro de grupo. Por exemplo, quanto ao modo de produção, o processo de criação compartilhada do espetáculo ou do texto e a mobilização por políticas públicas.

“O coletivo constrói sempre o seu próprio texto, busca novas linguagens e estruturas para contar sua história (…) Ele [coletivo] é a essência do teatro, seja ele épico ou trágico. Mesmo um monólogo é coletivo, se dirige a alguém, ao outro. O coletivo é entendido como o desdobramento do ator para o público e deste para a cidade. Na Grécia Antiga, o coro nasceu como representação da cidade”, completou o filósofo. 

Folha de S.Paulo

São Paulo, quinta-feira, 16 de novembro de 2006

TETRO

Às vésperas dos 26 anos de sua morte, Nelson Rodrigues ganha seminário, tem romance montado e peça adaptada ao cinema
 

Obra do autor é discutida no Recife, enquanto “A Mentira” ganha adaptação para o teatro; filme “Vestido de Noiva” estréia amanhã
 

VALMIR SANTOS
Da Reportagem Local 

“Sempre, sempre, sempre teve esses surtos na vida ou depois da morte do velho”, diz Nelson Rodrigues Filho, 61. E “surto”, vindo do caçula, soa bastante rodriguiano para falar dos projetos que pipocam às vésperas dos 26 anos de morte de Nelson Rodrigues (1912-80), no próximo 21 de dezembro. 

Nelsinho conversou por telefone com a Folha minutos antes de sair de casa na noite de terça-feira, no Rio, para assistir à estréia de “A Mentira” em Laranjeiras. Estava acompanhado de sua mãe, Elza, 88. 

Aquele romance, escrito em 1953, publicado durante 18 semanas no “Flan” -suplemento dominical do jornal “A Última Hora”- e recuperado somente em 1996, ganha sua primeira adaptação para o teatro, pelo pesquisador de sua obra e encenador Caco Coelho, em pleno salão nobre do Fluminense, fazendo jus ao tricolor fanático. 

Na história, Lúcia, 14, descobre que está grávida. Sua mãe, dona Ana, revela que seu marido, dr. Maciel, na verdade não é o pai da moça. Com medo do escândalo, ele tenta escondê-la numa fazenda, mas a mãe discorda. Instaura-se o impasse. A Cia.

Circo de Estudos Dramáticos, dirigida por Coelho, leva 13 atores à cena, entre eles os convidados Nuno Leal Maia, Denise Del Vecchio, Monique Alfradique e Edi Botelho. 

“Aqui, ele já assinava Nelson Rodrigues, não usava o pseudônimo Suzana Flag e deflagrava a fase das tragédias cariocas, que iniciaria com “A Falecida”, também de 1953″, diz Coelho. 

Homenagem
Em Recife, o Festival de Teatro Nacional homenageia o dramaturgo, que deixou a cidade aos quatro anos, quando a família se mudou para o Rio. Dentro do festival, o seminário “Nelson Rodrigues e a Cultura Brasileira” começou ontem e segue até domingo com personalidades convidadas a refletir sobre as peças do autor. 

“A obra dele tem um paradoxo: Nelson é o pai do teatro moderno brasileiro e trabalha com elementos arcaizantes como poucos no mundo. Há uma tensão entre o homem de teatro [da palavra] e a potência plástica e formal enorme, ao mesmo tempo tão grudada ao arcaico”, diz o artista plástico Nuno Ramos, 46, que falou ontem sobre “Vestido de Noiva” (1943). 
Também foram escalados para o seminário -com curadoria do dramaturgo Aimar Labaki e do diretor Antonio Cadengue- o psicanalista Mauro Meiches, o jornalista Eugênio Bucci, o colunista da Folha Marcelo Coelho e os diretores Eduardo Tolentino de Araújo e Luiz Arthur Nunes. 
Na programação, consta a montagem carioca de “Toda Nudez Será Castigada” (2005), por Paulo de Moraes, da Armazém Cia. de Teatro, e um ciclo com filmes adaptados de peças de Nelson, inclusive o longa que entra em circuito nacional amanhã, “Vestido de Noiva”, na versão do primogênito Joffre Rodrigues. 

Fusão de obras
Em São Paulo, o diretor Frank Castorf, do teatro Volksbühne, na Alemanha, ensaia com atores brasileiros uma fusão de “Anjo Negro” (1946), uma das peças míticas de Nelson, com “A Missão, Lembrança de uma Revolução”, do alemão Heiner Müller (1929-95). 

No elenco, Denise Assunção, Roberto Audio, Georgette Fadel e um coro de atores negros. A estréia está prevista para o dia 30/11, no Sesc Vila Mariana. Antes, no dia 22/11, a Cia. A4, de Salvador, estréia curta temporada de “InSônia” no Sesc Avenida Paulista, adaptação e direção de Hebe Alves para o monólogo “Valsa nº 6” (1951). 

Sônia, uma garota de 15 anos, surge em seus últimos instantes de consciência, transitando os planos da alucinação, memória e realidade. A personagem ganha quatro faces distintas na montagem baiana.



9º Festiva de Recife de Teatro Nacional
Quando: até 20/11; programação e endereços no www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/festivalteatro 
Quanto: de R$ 1 a R$ 5


A Mentira
Quando: ter. a qui., às 21h30. Até 20/12 
Onde: Fluminense Futebol Clube (r. Álvaro Chaves, 41, Laranjeiras, Rio, tel. 0/xx/21/ 2553-7240, r. 251) 
Quanto: R$ 20