9.10.2025 | por Teatrojornal
Os tempos não são para iniciantes. No momento em que, por um lado, um sobrinho do general João Baptista Figueiredo, último comandante-em-chefe das Forças Armadas na ditadura civil-militar (1964-1985), conspira desde os Estados Unidos para “anistiar” o ex-presidente da República Jair Bolsonaro, cuja condenação por tentativa de golpe de Estado ainda não transitou em julgado, por outro lado o escritor e compositor carioca Aldir Blanc (1946-2020), morto em consequência da pandemia do novo coronavírus, tem seu nome alçado à Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB), repasse de recursos federais a estados e municípios em prol da democratização e universalização do acesso à cultura. Blanc fez a letra e João Bosco, a música da canção O bêbado e a equilibrista, imortalizada na voz de Elis Regina e marco da luta por direitos humanos na esteira da controversa Lei da Anistia (1979). Pois é nesta hora do Brasil que o LABTD – Laboratório de Técnica Dramática propõe o seguinte exercício de imaginação a bordo do novo e quarto espetáculo, Mural da memória: a Lei da Anistia foi revogada e os crimes cometidos por agentes do Estado começam a ser julgados…
Leia mais10.6.2025 | por Teatrojornal
No prefácio à mais recente tradução de As veias abertas da América Latina no Brasil, de 2010, o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015) admitiu: “Sei que pode parecer sacrílego que este manual de divulgação fale de economia política no estilo de um romance de amor ou de piratas”. Por manual de divulgação entenda-se “um inventário da dependência e da vassalagem de que a América Latina tem sido vítima, desde que aqui aportaram os europeus no final do século XV”, como informa a L&PM Editores na contracapa.
O livro mais conhecido do ensaísta e ficconista inspira a pesquisa e criação do 14º espetáculo da Aquela Cia, Veias abertas 60 30 15 seg, no marco dos 20 anos de trabalho continuado na cidade do Rio de Janeiro, manejando memória coletiva, fabulação e imaginário social no campo das artes da cena, como se viu em Caranguejo overdrive (2015) Guanabara canibal (2017). A temporada de estreia nacional acontece no Sesc Pompeia, em São Paulo, entre 11 de junho e 4 de julho.
Leia mais8.4.2025 | por Teatrojornal
Nelson Rodrigues tinha 43 anos quando Bertolt Brecht morreu, em 14 de agosto de 1956, aos 58 anos. O brasileiro escreveu 17 peças em 37 anos, de 1941 a 1978. Viveu 68 anos. Consta que o alemão concebeu pelo menos 48 textos para teatro ao longo de 41 anos, de 1913 a 1954, inclusive quando passou 15 anos no exílio. As obras de Rodrigues (1912-1980) e Brecht (1898-1956), portanto, são filhas do século XX e seguem permeando a cena brasileira, a despeito das temáticas e linguagens diametralmente opostas.
Ambos os dramaturgos estão presentes na temporada de abril na cidade de São Paulo com as estreias de Gente é gente, no Sesc Vila Mariana, espetáculo livremente inspirado na peça Um homem é um homem, de Brecht, escrita entre 1926 e 1956, com direção de Marco Antonio Rodrigues, atuações de Aílton Graça, Dagoberto Feliz, Nábia Villela e demais artistas, sob direção musical de Zeca Baleiro, e de Senhora dos afogados, no Sesc Pompeia, a partir de 25/4, segundo abraço da atual Companhia Teatro Oficina Uzyna Uzona a Nelson Rodrigues em 66 anos de trajetória, desta vez sem a presença de José Celso Martinez Corrêa (1937-2023), que encenou Boca de ouro em 1999. A responsabilidade agora cabe à diretora convidada Monique Gardenberg. O elenco soma Marcelo Drummond, Sylvia Prado, Leona Cavalli, Giulia Gam, Regina Braga, Cristina Mutarelli, Michele Matalon, Muriel Matalon e Roderick Himeros, dentre 23 atuantes e três músicos.
Leia mais8.3.2025 | por Teatrojornal
Uma maneira de saber como a ação humana molda o tempo histórico é ir ao encontro da produção artística. Quando o espetáculo ou a performance revisitam o passado como território de embate, por exemplo, as contradições em torno dos acontecimentos e períodos-chave tornam-se mais evidentes, no sentido das discrepâncias entre noções de progresso e de civilização.
Essa percepção pode ser notada em três peças na cidade de São Paulo que pisam os lugares da história, da memória e da imaginação movidas pelo direito à justiça e à vida. São elas TYBYRA: Uma tragédia indígena brasileira, com dramaturgia e atuação de Juão Nyn, em temporada de 7/3 a 4/4 no Sesc Avenida Paulista. Restinga de Canudos, criação da Cia do Tijolo, de 14/3 a 27/4 no Sesc Belenzinho. E Pai contra mãe ou Você está me ouvindo?, do Coletivo Negro, sob direção de Jé Oliveira, de 22/3 a 26/4 no Teatro Anchieta do Sesc Consolação.
Leia mais9.6.2023 | por Valmir Santos
Assim como a companhia Oficina Uzyna Uzona cumpriu um autodeclarado “desmassacre” em Os sertões, entre 2000 e 2007, quando montou cinco peças a partir da obra literária de Euclides da Cunha, pode-se dizer que o Grupo Clariô de Teatro levanta das bordas de Taboão da Serra com a zona sul de São Paulo, a seu modo, o “desmassacre” da Irmandade Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, no sul do Ceará, referente a ataques ocorridos entre 1936 e 1937, há 86 anos, quatro décadas depois da Guerra de Canudos, e revisitado no espetáculo Boi Mansinho e a Santa Cruz do Deserto, uma bem urdida síntese de sua cosmovisão comunitária e artística esculpida em 18 anos de trabalho.
Leia mais27.5.2023 | por Luiz Fernando Ramos
Um circo com muitos picadeiros. Essa definição, ouvida de um espectador de Agropeça, criação do Teatro da Vertigem, sintetiza bem as potências e as limitações do espetáculo. A intenção é ambiciosa. Traduzir um país conflagrado partindo de uma das faces da moeda corrente, o poderoso agronegócio e todas as suas circunstâncias: desde as obviamente nefastas – produção extensiva de monoculturas, uso intensivo de produtos tóxicos, desmatamento predatório – até aquelas de que seus representantes muito se orgulham – rodeios espetaculares, música sertaneja hegemônica, apego às tradições.
Leia mais10.3.2023 | por Valmir Santos
Quando a arte olha no fundo dos próprios olhos enquanto procedimento criativo ela pode incorrer em risco de abraçar a autoimagem, afogando-se, como no mito de Narciso. Não é incomum o recurso de metalinguagem virar presa dele mesmo nas teias dos aspectos formais. Sentimento diverso do constatado em Banco dos sonhos, espetáculo-lago da Velha Companhia. Seu grau de experimentação carrega lírios e desassossegos por leitos e margens do teatro e da sociedade. Com a proeza de dar centralidade ao público instado a navegar por uma narrativa e reconstituir, consigo, a consciência de uma personagem, uma grande atriz, em aparente desagregação.
Leia mais18.9.2022 | por Mariana Queen Nwabasili
Parece ter chegado o tempo em que, finalmente, negras e negros brasileiros engajados em diferentes campos e artes passam a considerar a importância das pautas dos povos originários – ou dos “negros da terra”, como indígenas foram sintomaticamente “apelidados” pelos colonizadores – nas lutas por igualdades raciais e sociais no país. A peça Améfrica: Em três atos, encenação do Coletivo Legítima Defesa sob a direção de Eugênio Lima, é exemplo dessa tendência salutar e dos desafios para o equilíbrio das cosmovisões, simbolismos e narrativas ameríndias e afro-brasileiras na empreitada.
Leia mais29.4.2022 | por Elenize Dezgeniski
O texto a seguir foi apresentado durante a mesa ‘Viva! 30 anos por Lenise Pinheiro’, que aconteceu em 29 de março de 2022, na Alfaiataria Espaço de Artes, extensiva à exposição de mesmo nome dentro da programação do circuito Interlocuções do Festival de Curitiba.
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Quero começar dizendo que é uma honra fazer parte desta mesa em celebração ao trabalho da fotógrafa de palco Lenise Pinheiro, que por sua vez celebra os 30 anos do Festival de Curitiba. Cumprimento os meus colegas Daniel Sorrentino e Maringas Maciel, companheiros do mesmo ofício nesta terra das Araucárias. E também o produtor cultural Celso Curi, mediador do encontro. Bem como agradeço à atriz Giovana Soar e à equipe do Interlocuções pelo convite.
Leia mais25.3.2022 | por Valmir Santos
Feito pássaros que manobram durante o voo, controlando suas asas, Donizeti Mazonas e Edgar Castro equilibram-se numa área de pouco mais de metro de diâmetro, a metro e meio do tablado. O palquinho suspenso, um monolito circular metálico concebido pelo cenógrafo Eliseu Weide e como que expandido pela iluminação de Wagner Antonio, vira epicentro espaçotemporal do espetáculo Com os bolsos cheios de pão.
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